Leonel Brizola
BRIZOLA: “EL CAUDILLO” SABIA QUE NÃO VENCERIA EM 1989
O jornalista Leite Filho, que trabalha na liderança do PDT no Congresso Nacional, lança hoje o livro “El Caudillo”, pela Editor Aquariana, em Porto Alegre, na Livraria Cultura. “El Caudillo” é uma biografia de Leonel Brizola.
Leite Filho disse em entrevista a Paulo Henrique Amorim nesta quarta-feira, dia 18, que uma das novidades do livro é que Brizola já sabia que não poderia vencer as eleições de 1989. Brizola chamada o aparato midiático formado pela imprensa de “cogumelo” (*).
“Foi por isso que ele passou nove dias sem ir ao programa eleitoral, que é uma coisa suicida, praticamente... Ele achava que aquele, que ele chamava de “cogumelo”, que essa grande campanha de mídia e pesquisas, já tinha rifado ele e que não tinha mais jeito”, disse Leite Filho.
Segundo Leite Filho, o “cogumelo” ao qual se referia Brizola se formava pela “estrutura e o aparato midiático, a televisão com os jornais reproduzindo as pesquisas nacionalmente, nem sempre muito científicas”.
Outro assunto abordado pelo livro “El Caudillo” é o que Leite Filho chama de “xeretagem” dos Estados Unidos no Brasil durante o Governo Jango. Segundo Leite Filho, Brizola era o centro das atenções dos Estados Unidos no Brasil.
“O Brizola era o centro das atenções, como dava para ouvir na maioria das conversas e dos relatórios que o Lincoln Gordon e todos os xeretas se referem, os arapongas, a turma da CIA, para os Estados Unidos o Brizola era o centro das conversas. Nessa reunião eles decidem designar um tenente-coronel que estava lotado como adido militar na Itália chamado Dick Walters, que era ninguém menos do que o general Vernon Walters, o nome dele completo é Richard Vernon Walters”, disse Leite Filho.
Leite Filho disse que escolheu o título do livro “El Caudillo” em espanhol porque em português a palavra “caudilho” remete a ditador e é sempre usada com ironia. “Em espanhol “caudillo” significa, na sua versão acepção vernacular, ‘chefe guerreiro e Estadista’”, explica Leite Filho.
Leia a íntegra da entrevista com Leite Filho:
Paulo Henrique Amorim – Eu vou conversar agora com o jornalista Leite Filho, que trabalha na liderança do PDT no Congresso Nacional. Leite Filho, você vai lançar em Porto Alegre uma biografia do Leonel Brizola, não é isso?
Leite Filho – Exatamente. Amanhã (hoje), às 19h, na Livraria Cultura. Chama-se “El Caudillo”.
Paulo Henrique Amorim – Como?
Leite Filho – O nome do livro é “El Caudillo”.
Paulo Henrique Amorim – “El Caudillo”?
Leite Filho – Seria “O Caudilho”.
Paulo Henrique Amorim – E por que você quis usar essa expressão espanhola?
Leite Filho – É exatamente isso. É porque em espanhol “caudillo” significa, na sua versão acepção vernacular, “chefe guerreiro e Estadista”. E o meu personagem, por acaso, gostava muito dessa expressão quando usavam a expressão em português, que é meio uma expressão muito irônica e às vezes até cruel contra ele. Porque caudilho, na nossa intimidade brasileira, é mais para ditador.
Paulo Henrique Amorim – Isso. É uma expressão pejorativa.
Leite Filho – É. E foi mais também uma tentativa de resgatar esse termo, sabe Paulo Henrique. Porque nós como brasileiros, não nos achamos latinos, a gente acha que é americano. Na realidade, o caudilho, o “caudillo”, ele é, por exemplo, o Brizola quando morreu, todas as agências, inclusive as espanholas, diziam assim: “morrió el caudillo brasileño Leonel Brizola”, “el caudillo laborista”, que é o caudilho trabalhista. Então a gente também trabalha para isso, para resgatar a nossa latinidade.
Paulo Henrique Amorim – Agora, deixa eu perguntar: o que a sua biografia trará de material novo sobre o já se escreveu sobre “El Caudillo”?
Leite Filho – Pois é. Eu procurei fazer uma coisa ampla. Tanto é que eu tive em Washington e fiz o roteiro do Brizola pelo Uruguai, desci em Porto Alegre de ônibus, passei pelo Uruguai, fui até a Argentina, depois fui até Nova York, onde ele esteve também, lá no hotel Roosevelt. Fiz questão de passar lá uma tarde, também fui a Portugal, visitei a sede do Partido Socialista Português, onde o Mario Soares relançou com o Brizola o antigo PTB. O que tem, assim que a gente pode dizer de novo, são algumas preciosidades da xeretagem americana no Brasil. Aqueles documentos que estão bem chafurdados lá National Arcades de Washington, onde passei dez dias, eu achei muito coisa interessante. Uma delas, por exemplo, é quando os Estados Unidos decidem intervir militarmente no Brasil, ou seja, apelar para os nossos militares brasileiros. E é interessante que foi durante uma conversa do embaixador Lincoln Gordon com o presidente Kennedy e seus altos assessores militares e políticos. Nessa reunião, que está gravada inclusive, o Brizola era o centro das atenções, como dava para ouvir na maioria das conversas e dos relatórios que o Lincoln Gordon e todos os xeretas se referem, os arapongas, a turma da CIA, para os Estados Unidos o Brizola era o centro das conversas. Nessa reunião eles decidem designar um tenente-coronel que estava lotado como adido militar na Itália chamado Dick Walters, que era ninguém menos do que o general Vernon Walters, o nome dele completo é Richard Vernon Walters. Então está lá também. Agora também tem outras coisas boas, por exemplo...
Paulo Henrique Amorim – Quer dizer que designaram o Vernon Walters para vir para o Brasil cuidar do Brizola?
Leite Filho – Cuidar do Brizola. Agora o passado do Vernon Walters: primeiro, ele era lingüista, falava cinco línguas, inclusive o português e tinha uma ligação muito pessoal com o general Humberto Castelo Branco, que era o chefe do Estado Maior do Exército na época. A outra coisa também que eu achei interessante foi que em um dos relatórios do Lincoln Gordon e o Lincoln Gordon ia ao Jango e pedia cabeça dos brizolistas. Engraçado que o Brizola não tinha nem ministros na época lá. Eram só assessores especiais, inclusive um deles era o Cibilis Viana, que foi o depoente, um dos principais depoentes, do meu livro. O que ocorre? Ele ia lá e pedia a cabeça desses caras e três dias depois o Jornal do Brasil estampava: “Demitido Cibilis e tal, tal, tal...” Só que eu confronto a notícia do Jornal do Brasil com o relatório do Lincoln Gordon, claro que traduzido, mas está lá com número e tudo, e tem cópia para quem quiser ver.
Paulo Henrique Amorim – E o Cibilis foi demitido a pedido do Lincoln Gordon?
Leite Filho – Exato. E prova ali, porque tem...
Paulo Henrique Amorim – E o Cibilis estava trabalhando onde naquela época?
Leite Filho – O Cibilis era assessor do João Goulart naquela reforma de base, naquela época que tinha um primeiro-ministro, aquele gaúcho, o Brochado da Rocha, e eles fizeram uma tal de Lei Delegada, pela qual o Presidente podia decretar sem depender do Congresso. Então ele estava chefiando esse grupo. Eu sei que quando o Ministro Brochado da Rocha caiu, por pressão também, o Cibilis já estava mais ou menos na mesma posição, mas mesmo assim foi demitido. Ele e o chefe da Supra, na época, que era a Superintendência da Reforma Agrária. Eram os dois maiores brizolistas do governo e então dançaram. Dançaram por causa do pedido super-especial do embaixador.
Paulo Henrique Amorim – Leite, me conta uma coisa, você trata, por exemplo, da questão da relação do Brizola com o Jango no exílio, ou não?
Leite Filho – Trato.
Paulo Henrique Amorim – E o que você conta de novo para nós sobre isso?
Leite Filho – Na verdade, de novo não tem nada. Mas é o seguinte, o Brizola, antes de morrer, ele chama a Denise, porque o Brizola tinha uma certa culpa, ele se culpava muito, pelo fato de ter passado 12 anos sem falar com o João Goulart. Por que? Porque o João Goulart, por exemplo, o Brizola fez aquela campanha da legalidade para instalar-se no poder e depois o João Goulart, parece que vira as costas para ele. E também não aceita a vitória da campanha da legalidade e acaba compondo para propiciar o parlamentarismo, naquela lambança. Bom, depois teve, quando foi deposto o João Goulart, o Brizola teve condição de resistir e também não resistiu. E a partir daí teve também aqueles problemas no exílio, aquelas coisas, quem era realmente o chefe do Governo no exílio, se era o Brizola ou se era o Jango, o Brizola acabou se colocando como o personagem principal. Daí eles nunca mais se falaram. Porque eram cunhados. Aí ele chama a Denise e diz assim: “olha Denise, o João Goulart é um homem bom e tudo, mas só que eu sou um homem do confronto e João Goulart é um homem da conciliação, então a gente nunca iria se entender”. O bom disso tudo é que os filhos, quer dizer, os sobrinhos, não ficaram brigados.
Paulo Henrique Amorim – A Denise a quem você se refere é a Denise fila do João Goulart?
Leite Filho – Denise Goulart, isso.
Paulo Henrique Amorim – Em 1964, quando o Jango caiu, o Brizola queria resistir em Porto Alegre e o Jango não topou. O seu livro trata disso?
Leite Filho – Claro, inclusive na reunião que teve lá muito tensa, do Jango, do Brizola, inclusive o Brizola se propondo a ser Ministro da Justiça, e lá tinha um coronel, que era o Ernane Fittipaldi, ele dizia assim: “o coronel Fittipaldi aqui será o meu Ministro da Aviação, Ministro da Aeronáltica”. E aí o Jango disse assim: “olha, sinto muito, mas não há condições de resistir”. E o comandante do 3º Exército, quer dizer, o comandante legal do 3º Exército, dizia que havia condições.
Paulo Henrique Amorim – Quem era o comandante nessa época, Leite?
Leite Filho – Estou sem o nome, mas está no livro. Sabe como é a memória...
Paulo Henrique Amorim – Tudo bem. Mas que interessante, essa descrição dessa reunião eu não conhecia, não li isso em nenhum lugar.
Leite Filho – Essa é uma parte que é uma coisa nova. Uma coisa interessante. Se bem que é difícil você dizer que é uma coisa inédita, não é. Eu prefiro dizer que é pouco explorada. Agora, uma coisa também mais humana aí é a questão da eleição presidencial. Eu penetro a fundo na eleição de 1989. Você sabe o que eu descubro, Paulo?
Paulo Henrique Amorim – O que?
Leite Filho – Que o Brizola estava convencido que iria perder aquela eleição.
Paulo Henrique Amorim – É mesmo?
Leite Filho – É. Foi por isso que ele passou nove dias sem ir ao programa eleitoral, que é uma coisa suicida, praticamente. Isso você pode confirmar com o Roberto D’Avila, e quem me falou isso também foi o Cibilis Viana, e eu vivi na época também, estranhei a ausência dele, passou nove dias sem ir ao programa eleitoral. Ele achava que aquele, que ele chamava de “cogumelo”, que essa grande campanha de mídia e pesquisas, já tinha rifado ele e que não tinha mais jeito.
Paulo Henrique Amorim – E ele chamava de “cogumelo”?
Leite Filho – Ele chamava de “cogumelo”. Aquele cogumelo que se formava, toda a estrutura e o aparato midiático, a televisão com os jornais reproduzindo as pesquisas nacionalmente, nem sempre muito científicas.
Paulo Henrique Amorim – Mas a diferença do Lula para ele foi inferior a um ponto percentual...
Leite Filho – Foi 0,4%, exatamente.
Paulo Henrique Amorim – Então, ele poderia ter ido para o segundo turno com o Collor.
Leite Filho – Não, mas é justamente por isso. Porque houve também, naquela época já havia manobra. Você naquele livro, você falou naquele caso da Proconsult.
Paulo Henrique Amorim – Isso.
Leite Filho – Então ele achava que a Proconsult era o Plim-Plim. Você se lembra desse livro, não?
Paulo Henrique Amorim – Claro, eu escrevi. Evidente.
Leite Filho – Estou brincando. Então, como você se lembra muito bem, ele achava que aquilo ali foi uma Proconsult super-sofisticada porque colocou o Lula ali em segundo lugar. E é difícil você pedir ao Lula para renunciar. Então complicou a vida e praticamente selou o destino dele ali. Mas ele atribuía muito à conjuntura internacional e à paranóia de Washington contra ele. O Brizola, apesar de toda mansidão com que ele retornou do exílio e tudo, como um grande Fidel, na verdade. Na época não tinha Chávez, mas o Fidel...
Paulo Henrique Amorim – Ele achava que jamais teria chance ?
Leite Filho – Ele jamais teria chance. No entanto ele continuou, inclusive foi candidato a presidente em 1994...
Paulo Henrique Amorim – De novo. Ele foi de novo candidato.
Leite Filho – Em 1994 e depois em 1998 vice do Lula, mas sempre achava que era mais para figuração e também para dar sua mensagem. Ele achava que o importante era a mensagem e não a pessoa física.
Paulo Henrique Amorim – Que ótimo. Então você lança esse livro amanhã (hoje) em Porto Alegre?
Leite Filho – Amanhã (hoje) em Porto Alegre, às 19h, na Livraria Cultura. E dia 1º em Brasília, na Câmara dos Deputados. E dia 09, também em Brasília, no restaurante Carpe Diem, da 104 Sul.
Paulo Henrique Amorim – E quando você lança em São Paulo.
Leite Filho – Olha, em São Paulo estamos ainda nas tratativas, mas deve ser em agosto, mais ou menos.
Paulo Henrique Amorim – Está ótimo. Faça em 24 de agosto.
Leite Filho – Uma grande data, é muito emblemática.
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