Gilson Caroni Filho
Se tratar da língua é tratar de um tema político, a fala sem rodeios do presidente Lula, durante cerimônia de assinatura dos contratos do programa Minha Casa, Minha Vida, no Maranhão, não poderia ter outro resultado: encheu a seção de cartas de jornais e revistas, além de ter dado o tom do moralismo seletivo que marca os grandes articulistas. Fingiram não saber que palavras tidas como chulas são formas lingüísticas ímpares para expressar emoções que permeiam o corpo e os amplos campos das relações sociais. Não estava em questão se o emprego se deu em contexto adequado, mas o que moveu o coro dos “indignados”, no improviso de quinta-feira passada.
Ao afirmar que "eu não quero saber se o João Castelo é do PSDB. Se o outro é do PFL. Eu não quero saber se é do PT. Eu quero é saber se o povo está na merda e eu quero tirar o povo da merda em que ele se encontra. Esse é o dado concreto", Lula tem consciência de que os opositores dirão que desrespeitou a postura pública que deveria manter em face de majestade do cargo que ocupa. Tanto que se antecipa à crítica anunciada: “Amanhã os comentaristas dos grandes jornais vão dizer que o Lula falou um palavrão, mas eu tenho consciência que eles falam mais palavrão do que eu todo dia e tenho consciência de como vive o povo pobre desse país".
Como tem sido colonizada para ter vergonha de ser o que é, uma boa parcela da classe média urbana se apresenta como defensora intransigente da propriedade, da família e do Estado patrimonial. Confunde governo e salvação, ignora a representação, desconhece direitos sociais e políticos, menosprezando a exploração econômica, embora seja “mobilizável” por campanhas de caridade que reforcem a sua imagem de privilegiadas. Em busca de ilusões perdidas, está disponível para aventuras que realçam a ferocidade dos seus recalques. E qualquer enunciado que apresente um padrão variante é o suficiente para açular o seu ódio de classe.
Pouco lhe importa se campeia a violência, a truculência e a miséria. Em seu ilusório casulo, o que merece relevo é o destempero verbal de um presidente que não segue os padrões dos antigos donos do poder. É de pouca importância se o governo anterior reduziu a zero os empréstimos da Caixa Econômica Federal às autarquias e estatais da área de saneamento básico. Também não lhe tira o sono se a decisão política do tucanato provocou, além da dengue, surtos de cólera, leishmaniose visceral, tifo e disenterias. Ora, doenças resultantes da falta de saneamento não lhe incomodam. A merda que lhe aflige é aquela que aparece no improviso presidencial como dado concreto.
Para Lula, o descalabro no saneamento é uma tragédia, e, de fato, o é. Por sua história, o presidente faz parte de uma legião de sobreviventes. De um exército que resistiu a séculos de dificuldades imensas, naturais e humanas. Tem orgulho saudável de sua força. Da força desse povo que come mandacaru e capucho verde de algodão e ainda tem a esperança desesperada de querer viver. Isso é coragem, é grandeza. Essa é a merda que causa engulhos na grande imprensa e nos seus leitores indignados. Mas indignados com o quê, afinal?
Indignados pela existência de erros que se repetem há tempos? Indignados pela impotência de um saber divorciado da dimensão histórica e da responsabilidade social que deveria caber aos centros de ensino que freqüentaram? Indignados pela ameaça, concreta e imediata, da morte, pela fome endêmica e, até bem pouco tempo epidêmica, dos mais miseráveis? Não. O que os ruborizados pelo emprego da palavra "merda" não suportam é a ausência do promotor da " paz social", do garantidor de uma ordem política que lhes oferecia, através do conservadorismo autoritário, uma institucionalidade que muito apreciavam ética e esteticamente. Um simulacro de República feito sob medida.
O problema é que a vestimenta institucional brasileira parece calça curta, fazendo o país caminhar desajeitado, com medo do ridículo. A reforma mais urgente requer produção crescente de cidadania, a criação incessante de sujeitos portadores de direitos e deveres. Em uma sociedade fracionada, essa é a merda que ameaça e choca os estamentos mais reacionários: a realidade que não deveria ter emergido com modelagem tão nítida.
Gilson Caroni Filho não entendeu a indignação do povo em relação ao palavrão usado por Lula. A indiganção não está na palavra merda.
ResponderExcluirA indignação está no fato de ao reconhecer que o povo está na merda, e que após sete anos de governo lulo petista o povo continua na merda.
Este pronunciamento de Lula é um reconhecimento contundente do fracasso das políticas sociais do governo neste últimos sete anos.
Quer queira ou não a oposição e os anti-Lula-PT são obrigados a reconhecer que apesar de todos os defeitos que a administração petista mudou a vida do povo para melhor. Faça uma pesquisa em qualquer lugar do país e a resposta da maioria será positiva.
ResponderExcluirLuiz Carlos
ResponderExcluirPesquisas recentes provam que a opinião pública diz que o Brasil piorou em educação pública, em saúde pública, em segurança pública e em seguridade social. É só perguntar a qualquer aposentado se ele acha justa a aposentadoria que recee que não acompanha o crescimento do Salário Mínimo.
Agora o Brasil tem melhorado sim na esfera economica, e isto não é feito de Lula. É só ver as estatisticas do IBGE para constatar que estas melhora vêm desde 1994 com a implantação do Plano Real.
A grande vantagem é que Lula não fez nada no plano econômico. Deixou a tão combatida política econômica de Itmar e FHC continuar e até nomeou um deputado tucano, Henrique Meireles para presidente do Banco Central.
A política neo liberal do tucano Meireles deu tão certo que a Sinistra Dilma está até contemplando o nome de Meireles para compor a sua chapa como vice.