A certeza de que o Banco Central não alteraria – como não alterou – a taxa de juros na primeira reunião do Copom de 2010 esconde o tamanho da divergência que está em curso em relação ao assunto – no governo, na academia e até no mercado financeiro. Se 10 entre 10 analistas avaliavam que a Selic permaneceria em 8,75% ao ano na reunião do Copom encerrada agora há pouco, o mesmo não pode ser dito em relação aos passos seguintes da chamada autoridade monetária.
Na bolsa de apostas, a liderança disparada, hoje, é do grupo que acha que a Selic terá inevitavelmente de subir em algum momento do ano. Até porque o próprio BC se encarregou de “coordenar as expectativas” nessa direção. Desde o fim do ano passado, prepara o mercado, por meio das atas do Copom e dos relatórios de inflação, para o “inevitável”.
Mesmo entre aqueles que incorporaram o recado do BC, há muita incerteza sobre como, quando e quanto a Selic subirá. Há palpite de todo tipo: alta de 1, 2, 3 e até 4 pontos percentuais até o fim do ano; início do ciclo de elevações em março, abril, junho, julho e outubro; fim do período de altas em outubro ou apenas em meados de 2011. Isso sem contar que, apesar da pressão do próprio mercado e do BC, alguns analistas – poucos, bem poucos – ainda avaliam que não há razão para o Copom mexer no juro.
Uma previsão menos incerta é a de que muito chumbo será trocado nos próximos meses, especialmente no governo, em torno da política macroeconômica. O Ministério da Fazenda, para variar, tem deixado claro que discorda da necessidade de elevação da Selic, considerada inevitável pelo BC.
Por trás de toda essa polêmica estão dados inconclusivos sobre a dinâmica da inflação. De um lado, preços de alimentos e de diversas commodities vêm pressionando os índices (algo parecido com o que ocorreu ao longo de 2008, antes de estourar a crise), tendência que a recente escalada do câmbio, se persistir, potencializa. De outro, diversos segmentos da economia que ainda não conseguiram retomar os níveis pré-crise, acumulam algum estoque e operam com capacidade ociosa.
A ansiedade para puxar rápido o gatilho dos juros parece ficar meio fora de propósito quando se verifica a convergência bem maior das projeções quanto ao crescimento da economia em 2010. Há uma concentração de apostas em torno do índice de 5%, com algum desvio para cima e algum desvio um pouco maior para baixo – este último baseado numa evolução mais pessimista do cenário internacional.
Esse cenário leva em conta os movimentos de contração relativa da atividade na China, crises fiscais como a da Grécia e mesmo dos Estados Unidos, além das dúvidas sobre a recuperação nas economias centrais. No caso americano, por exemplo, a recuperação que parece apontar no horizonte se dará sem absorção do exército de desempregados formado na crise.
(Um pouco antes de o Copom manter a Selic em 8,75%, o Fed, o BC americano, também manteve seu juro básico em zero. O argumento é o de que a economia ainda vai demorar a se recuperar da crise.)
No fim das contas, as projeções de crescimento, no Brasil, não despregam do nível em que se encontra o famoso produto potencial – aquele que determina o teto de expansão da economia sem a deflagração de pressões inflacionárias.
O resumo da ópera é que, diante de um quadro desses, seria prudente esperar antes de acionar o gatilho. Mas, quando se trata de subir juros, mostra a história, o BC não costuma agüentar a comichão.
José Paulo Kupfer
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