AYRTON CENTENO
Sob pressão de centenas de manifestantes que levantavam cartões vermelhos diante do prédio da Assembleia Legislativa, os deputados gaúchos adiaram para hoje a votação do projeto em que a governadora Yeda Crusius (PSDB) oferece pela bagatela de R$ 79,3 milhões os 74 hectares mais cobiçados de Porto Alegre, situados diante do estádio Beira-Rio, com direito a visão perene da capital gaúcha e do estuário do Guaíba. Custa pouco mais de R$ 1 milhão por hectare. Para a especulação imobiliária é a barganha do ano. Basta saber que, a poucas quadras dali, cada hectare do terreno do antigo estádio do Internacional é oferecido por R$ 9,2 milhões.
“Este projeto tira a nossa casa, a nossa vida, o nosso direito de sobreviver”, discursou a dona de casa Nora Nei da Silveira Ferreira, uma das líderes das seis comunidades ameaçadas pela venda do terreno da Fundação de Atendimento Sócio-Educativo (Fase), antiga Febem/RS, junto ao morro Santa Teresa, no bairro Menino Deus.
Como os moradores, ambientalistas e sindicalistas foram impedidos de entrar na sede do Legislativo, Nora Nei desafiou os deputados com seu palavreado seco e direto do alto do caminhão de som:
“Vocês têm que tirar a bunda dessas cadeiras e deixar a gente entrar, porque nós é que botamos vocês aí”.
Sobrou para a governadora Yeda uma referência à mal explicada compra da mansão de sua mansão:
“A senhora disse que sua casa não foi roubada. Pois a nossa também não!”
“Daqui não saio, daqui ninguém me tira” cantavam moças e rapazes das seis vilas do morro segurando faixas onde se lia “Não à venda da área da Fase”, “Levanta favela!” ou “O luxo dos ricos ameaça o nosso futuro”.
De quando em quando, o locutor da manifestação perguntava: “Quem votar contra o povo, o que vai ganhar?”. E a resposta: “Cartão vermelho”, dizia a multidão erguendo os cartões.
ACAMPAMENTO
Antigo companheiro de José Lutzenberger, um dos maiores nomes do ambientalismo brasileiro, o ex-vereador Caio Lustosa lembrou as lutas passadas contra a devastação ambiental e se solidarizou com as comunidades.
Três vereadores de Porto Alegre – Sofia Cavedon e Carlos Todeschini, ambos do PT, e Fernanda Melchiona, do PSol — subiram ao carro de som para comunicar que a Câmara Municipal, por unanimidade, decidira pedir a retirada do projeto de pauta e entregara moção neste sentido ao presidente da Assembléia, Giovani Cherini (PDT). O Tribunal de Justiça já pedira aos deputados que não votassem o projeto da maneira como fora encaminhado. Na semana passada, o Ministério Público Estadual fizera a mesma recomendação.
Porém, à tarde, após a reunião de líderes, Cherini comunicou que o projeto irá a votação nesta quarta sob pena de trancar a pauta. O deputado Elvino Bohn Gass (PT) percebeu a intenção da base de Yeda de votar favoravelmente à proposta, o que inclui PMDB, PSDB, PP, PPS e PTB. A oposição reúne, sobretudo, o PT, PCdoB e PSB. Há expectativa, dos oposicionistas, de que DEM e PDT também se posicionem contra a venda do terreno. Segundo o sindicato que representa os funcionários da Fase, a proposta não explica como ficará a situação dos 23 hectares protegidos pela lei ambiental e das duas mil famílias que vivem nas seis vilas do morro.
No projeto, o Estado vende ou troca os 74 hectares para aplicar o dinheiro na construção de nove unidades descentralizadas da Fase. Além do governo e de sua base do Legislativo, opinou a favor da proposta o Conselho de Supervisão dos Juizados Regionais da Infância e da Juventude.
Moradores das seis comunidades, ambientalistas, funcionários públicos, sindicalistas, estudantes e apoiadores prometem montar acampamento diante do Legislativo e não arredar pé do local para acompanhar a votação. Eles advertem que o deputado que “entregar a área para a especulação” terá seu nome e sua foto espalhada em outdoors para a população saber como se comportou. Para dona Nora será “o momento de saber quem está contra nós”.
Sendo verdadeiro que cada hectare do antigo estádio do Internacional é oferecido por 9,2 milhões...O que Yeda (Cruzes) está fazendo, é roubar descaradamente o povo gaúcho. Como sempre com a cumplicidade de muitos.
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