Através da revelação de um casal de ter integrado o banco de Lampião e Maria Bonita e apoiado por fato material de pesquisa, o cineasta Wolney Oliveira resgata, em Os Últimos Cangaceiros, um pedaço da memória do cangaço e o insere a história do País
Alguns detalhes tornam precioso o documentário Os Últimos Cangaceiros, de Wolney Oliveira. Primeiro, trazer de volta a memória de uma época, através da revelação de José Antônio Souto e sua mulher, Jovina Maria da Conceição, de terem integrado o bando de Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião. Segundo, ampliar o conhecimento do que foi o cangaço na história nordestina, e, terceiro, integrar à história do cangaço esses dois personagens anônimos que guardaram o seu segredo durante 70 anos. A revelação de José e Jovina ultrapassa os limites de um mero segredo familiar para se tornar um importante retorno à época do cangaço e lançar-lhe novas inserções sobre a integração de homens e mulheres à liderança de Virgulino em sua jornada pelas terras nordestinas e sua relação com a igreja e os políticos.
José e Jovina eram nomes falsos. Na verdade eles se chamavam Antonio Ignácio da Silva e Durvalina Gomes de Sá. Eram conhecidos pelos apelidos de Moreno e Durvinha. Durvinha entrou para o congaço cansada de apanhar do “mestre”, o professor, e da severidade de seu pai. Moreno, após levar uma surra da polícia, tornando-se um cangaceiro tão corajoso quanto violento, tendo, segundo ele mesmo, atirado em 21 almas. Isso, no início dos anos 30. Lampião, Maria Bonita e seu bando saíram do cenário das caatingas do Nordeste em 1938. Moreno assumiu o bando após a morte de Lampião, mas abandonou o cangaço após as mortes de Corisco e Dadá, em 1940. Passaram ainda dois anos perambulando entre Pernambuco e Alagoas, até decidirem sair no Nordeste através do rio São Francisco. Assumiram nomes falsos e durante três meses percorreram 1.352 quilômetros, de Tacaratu, no interior de Pernambuco, até Augusto de Lima, em Minas Gerais. Ali constituíram família, mas não revelaram, sequer aos filhos, quem realmente eles eram.
Mas, como do passado ninguém se livra, em 2005, a filha Nely resolveu localizar o irmão que tinha sido entregue pelos pais a um padre em Pernambuco. O aparecimento de Inácio trouxe a verdade à tona. Verdade escondida que passou para os livros (“Moreno e Durvinha: sangue, amor e fuga no cangaço”, do historiador baiano João de Sousa Lima) e agora chega ao cinema com o trabalho de Wolney. É essa a maior importância de Os Últimos Cangaceiros: resgatar um pedaço desconhecido da história do cangaço e dar-lhe a merecida dimensão histórica. No entanto, o filme se enriquece com o relevante material de pesquisa, especialmente em termos de imagem.
Além de utilizar com conhecimento o acervo filmado por Benjamin Abrahão, também relembrado por Moreno e Durvinha, Wolney faz uso de cenas de filmes como O Cangaceiro (1951), de Lima Barreto, Memória do Cangaço (1964), de Paulo Gil Soares, Corisco e Dadá (1996), de Rosemberg Cariry, A Mulher no Cangaço(1974), de Hermano Penna; Baile Perfumado (1997), de Lírio Ferreira e Paulo Caldas, além de imagens de época de várias cidades pelas quais os cangaceiros transitaram.
Louve-se, ainda, o fato do cineasta ter percorrido diversos estados – Alagoas, Bahia, Pernambuco, Sergipe, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo – em busca da registro e da autenticidade dos fatos. O resultado é um documento importante sobre um pedaço desconhecido da história do cangaço que desde já se insere no processo histórico do Brasil.
Mais informações
Os Últimos Cangaceiros (Brasil-Ceará, 2011), de Wolney Oliveira. 88 minutos. Livre.
Confira uma reportagem sobre a passagem de Moreno, Durvinha e Aristéia por Fortaleza.
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