Neste espaço o tentarei desenvolver uma compreensão holista do Brasil, tal qual o vejo. Passo por passo, submeterei meu entendimento político e econômico de nosso Pais à inteligência dos que me derem sua paciente leitura. Por momentos refletirei sobre questões estruturais. Em outros, chamarei a conjuntura a demonstrar o que penso.
No Brasil, todas as melhores energias se dispersam nas conjunturas. Ao pensamento estratégico pouco, ou quase nada, se dedica. Entre os tomadores de decisão na vida pública, então, esta constatação beira o trágico! Há explicação compreensível pra isto. O que não há é justificativa para a persistência deste colapso institucional crônico; para este apagão de idéias, ou para a morte da audácia, mínima que seja, que se exige daqueles ou daquelas de quem a sociedade espera e precisa para crer no futuro da Nação.
Dois momentos explicam modernamente este fenômeno: a geração que está operando o País na política ainda é, em larga escala , aquela dos tempos que se sucederam a 1964. Mais precisamente, de Fernando Henrique para cá, é a geração que se opôs ao regime autoritário. Esta geração de gente respeitabilíssima, e a quem o povo brasileiro deve muito, historicamente, padece de um cacoete, entretanto: foi obrigada a reduzir sua compreensão do Brasil a um conjunto de reivindicações de natureza institucional essenciais mas não o bastante: eleições diretas, anistia, constituinte,democracia política, enfim.
Economia política virou assunto proibido em nossas reuniões. O consenso necessário à reinstitucionalização se dissolveria numa frente em que, na reta final, confraternizavam, por exemplo grato, Teotônio Vilela e João Amazonas, Arraes e Quércia, Tasso Jereissati e José Dirceu. Democracia formal e sua agenda uniam, refletir modelos de economia política desunia.
Tudo certo! Certíssimo! Para a hora…
Depois veio o governo Fernando Henrique. À absoluta falta de projeto e, capitaneando o exitosíssimo plano de estabilização econômica, que encerrou 25 anos de superinflação, FHC aderiu à exuberante ideia neoliberal. O mundo se prostara a ela. O gravíssimo buraco em nossas contas externas nos impunha uma submissão à hegemonia ideológica norte-americana enfeitada pelo charme de Bill Clinton. O apetite particular pela reeleição abatia a tradição progressista de FHC. Esta é a segunda fase.
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De novo, o Brasil não perdeu propriamente, mas a tática das organizações progressistas do País e mais, do melhor de seu pensamento acadêmico, dos intelectuais, dos artistas, das vanguardas sindicais e estudantis, optou por aceitar a sábia inflexão de Lula e aceitar o adiamento, por assim dizer, do debate sobre nossa estratégia de futuro em nome de avanços possíveis que evitassem os riscos reais de enfrentamento do pacto reacionário vigente no seu centro.
Debater modelo de desenvolvimento poderia dissolver, num primeiro momento, a vitória eleitoral; no segundo e terceiro momentos, atrapalhar o avanço de melhorias concretas na vida do povo, agora! E mais uma vez nos vemos como Nação, levados a dar valor definitivo à comparação do que temos hoje em comparação com o passado. Como se essa fosse a tarefa definitiva que nos toca. Não é!
Tudo tem melhorado em nosso País. Concretamente. O desemprego caiu, a participação dos salários na renda nacional aumentou, as políticas sociais compensatórias atingiram níveis inéditos, o poder de compra do salário mínimo é o maior da história, políticas afirmativas acenam concretudes para estudantes pobres, para quilombolas, negros, mulheres, agricultura familiar. Ações tópicas recuperaram de forma expressiva a indústria naval e a nova orientação pública deu-nos protagonismo global em petróleo. Não há dúvida em defender a tática de Lula, seu legado, os valores que impôs ao Estado Nacional Brasileiro.
Nosso País desfruta hoje de uma presença internacional nunca vivida modernamente. Não só porque temos reservas cambiais em nível jamais experimentado, mas porque politicamente jogamos o jogo internacional sem vassalagens e subalternidades que nos encheram de vergonha em vários momentos recentes, inclusive.
Quer dizer então que agora, desta vez por nosso lado, anunciaremos que a história acabou, como dizia o sub intelectual guru modista do neoliberalismo, Fukuyama?
Penso comovidamente que não! Se compararmos o Brasil de hoje com o passado das últimas 3 décadas, tudo está melhorando. Mas e se compararmos o Brasil com os países que dispõem de condições semelhantes? Pior: e se perguntarmos para onde estamos indo em 10, 20, 30 anos, alguém sabe dizer?
Crescer e parar a cada 3 anos é tudo que temos para nossos 60 milhões de pobres? Pior, crescer em taxas menores que a soma dos ganhos de produtividade – que substituem gente por máquinas – e da chegada de cerca de um milhão e meio de jovens por ano ao mercado de trabalho é mesmo o máximo que podemos aspirar coletivamente?
Dá pra crer que, com os atuais e crescentes déficits nas contas externas, não estaremos daqui a pouco revendo o filme inglório de crises externas que nos atolaram por décadas inteiras?
Nada devemos fazer em relação ao fato de que temos déficit de gigantescos 100 bilhões de dólares no comércio externo, se olharmos apenas as trocas de manufaturados?
A conta de nossas aspirações de consumo de massa será sustentável se aceitarmos passivamente o que a divisão internacional do trabalho deixa pra nós: produtores decommodities de baixo ou nenhum valor agregado?
Temos algum futuro com a educação que temos? É minimamente responsável darmos a quem não tem plano de saúde privado a saúde pública indigna que oferecemos a nosso povo?
Apos 32 anos de experiência na vida pública brasileira, aprendi pelo menos que o céu não é perto. Sei que não é fácil nem trivial encaminhar saída factível pra esta encalacrada.
Mas aprendi também que é possível avançarmos muito mais profundamente e muito mais velozmente. Já experimentei algumas vezes o milagre da política feita com largueza, amor verdadeiro ao povo, competência, seriedade e audácia!
E as condições hoje são, em parte, muito melhores que jamais foram em tempos modernos.
É sobre o que escreverei neste espaço.
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