Enxergar só uma característica do outro ou dar muita importância ao detalhe: experts ensinam a analisar o relacionamento e descobrir se você idealiza demais o parceiro
Diferentemente da música “La Vie em Rose”, que embala tantos momentos românticos ideais, a vida real não é totalmente cor de rosa. O seu amado – como todas as pessoas – também tem defeitos, às vezes difíceis de enxergar. Se esse é o seu caso, cuidado: você pode estar sofrendo de miopia amorosa.
Segundo o psicólogo Ailton Amélio, isso ocorre quando se projeta no outro aquilo que se gostaria que ele fosse. “Apaixonar-se envolve admirar o outro. E a admiração envolve idealização”, explica o especialista, autor do livro “Relacionamento Amoroso”
A miopia faz com que você olhe de tão perto que acabe enxergando só uma característica do parceiro. “Você vê apenas um ponto, geralmente aquele que pensava ser o mais importante em um homem”, explica a coach de relacionamentos Margareth Signorelli.
Esse tal ponto varia de mulher para mulher, de acordo com idade e características pessoais. Uma mulher madura pode estar procurando um parceiro bem-sucedido, não necessariamente rico. Já uma mais jovem pode estar buscando apenas um corpão. Elas focam tanto nesses pontos pré-definidos que acabam esquecendo que o parceiro não é só aquilo.
Foi exatamente o que aconteceu com a universitária Marcella Munhoz, que sempre quis – e arrumou – um namorado com abdômen definido. A relação era ótima, até que ele começou a cobrar dela que também perdesse peso. “Ele me fazia sofrer horrores, colocava minha autoestima super para baixo”, desabafa a estudante.
Ao realizar o sonho do tanquinho próprio, Marcella apresentou o primeiro sintoma de miopia amorosa: focou demais em uma parte – o abdômen – e acabou se esquecendo do todo. “Tem que enxergar de longe. Só se afastando podemos ver que a pessoa é muito mais do que isso”, aconselha a coach.
E esse “muito mais do que isso” pode não ser nada agradável. Quando observado de longe, talvez o príncipe se mostre, na verdade, um sapo – daqueles que destratam o garçom, não falam português corretamente, são um tanto frouxos com os amigos enquanto bancam o machão com você, entre outras atitudes extremamente broxantes.
“Todo meu tempo livre era para ele”
A analista de trade marketing Thalita Gut Pilcsuk viveu um romance que já começou com pouca probabilidade de dar certo. Bem colocada profissionalmente e com mestrado concluído, ela se apaixonou por um homem com baixo grau de instrução e que havia voltado para a casa dos pais após um divórcio.
Mesmo com tantas diferenças, Thalita apostou na relação. “Eu achava que ele era o amor da minha vida. Todos diziam que eu estava vivendo a vidinha que ele queria e tinha deixado minha família, meus amigos. Todo meu tempo livre era para ele”, conta a analista de trade marketing, que sustentou a relação emocionalmente e financeiramente por dois anos.
Afastar-se de pessoas próximas é mais um sintoma da miopia. “Você monta uma lente que distorce e tende a ver do seu jeito”, comenta Amélio. A partir desta distorção, é muito comum o míope amoroso brigar com amigos e familiares que tentam lhe abrir os olhos, o que o afasta ainda mais do próprio círculo.
Marcella e Thalita superaram a miopia e, hoje, estão em outros relacionamentos. Marcella recorreu a sessões de terapia para ajudar. “Com muita clareza, minha terapeuta me mostrava aos poucos o quanto aquela pessoa não me fazia bem”, declara. A maior lição da experiência foi aprender a fazer uma autoanálise e se colocar em primeiro lugar.
O desfecho de Thalita foi um pouco mais dramático. Ela acabou descobrindo que o ex a traía com uma amiga de melhores condições financeiras. “Até hoje, não sei exatamente quem é a pessoa a quem me dediquei por dois anos. Era um desconhecido, por quem eu não sentia absolutamente nada”, conclui a analista de trade marketing.
Mas nem sempre a miopia amorosa é algo ruim. Depende da recorrência, da intensidade e de quanto ela complica a vida de uma das partes. “O mecanismo pode ser bom para preservar o relacionamento, mas se torna disfuncional quando a pessoa está carente e tende a repetir isso. Tem gente mais predisposta a se apaixonar e distorcer”, completa Ailton.
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