Seus restos mortais serão levados de São Borja a Brasília, onde uma equipe internacional de peritos investigará se de fato Jango morreu de “doença”, como diz o atestado feito na Argentina, onde o ex-presidente brasileiro se encontrava, ou se foi envenenado pela Operação Condor quando se preparava para retornar ao Brasil em 1976.
Se se consumassem, a volta de Jango e o exercício dos seus direitos políticos retomados dariam um xeque-mate na ditadura empresarial-militar que o depôs em 1 de abril de 64 e nove dias depois o cassou por 10 anos.
Ao se abrir o caixão pela primeira vez (a urna chegou lacrada, sem que a própria família pudesse ver Goulart), dúvidas cruciais poderão ser sanadas. Há de fato um corpo dentro da urna funerária? É o de Jango? Ele foi assassinado pela Condor, uma rede de repressão política que os governos do Cone Sul montaram com apoio dos EUA?
Porém, por mais importantes que sejam as respostas a estas perguntas, elas ainda estão longe de esgotar as questões levantadas pela morte de Goulart. À Justiça cabe autorizar o interrogatório no presídio de segurança máxima em Charqueadas (RS), onde se encontra há mais de 10 anos, de Mário Neira Barreiro, do ex-agente secreto uruguaio que diz ter informações sobre a morte de Jango.
O Judiciário também precisaria inquirir, nos EUA, o ex-Secretário de Estado Henry Kissinger e os agentes da CIA Frederick Latrash e Michael Townley, que alimentaram a caça articulada aos opositores políticos na América do Sul. E à Dilma cabe solicitar aos Estados Unidos os documentos secretos daquele país que ajudem a explicar a morte de Goulart.
Movimentos do mesmo naipe fez o juíz espanhol Garzón, que mandou prender o ex-ditador chileno Pinochet pelas mortes de cidadãos espanhóis após o golpe que assassinou Allende no Chile. O general desfrutava na Inglaterra das benesses proporcionadas pela corrupção que engordou toda a alta cúpula militar das ditaduras da região.
E, para realmente seja consequente uma ampla revisão da historiografia e da Lei que Anistiou os torturadores do Estado, deve-se exumar também o corpo de outro presidente, Juscelino, que em agosto daquele fatídico 1976 faleceu em um mal esclarecido acidente automobilístico.
Urge, portanto, caminhar a passos largos para desmentir a história oficial de que o golpe foi dado por militares com apoio civil; que começou naquele 64; e que foi tramado por nacionalistas.
Documentação farta prova que empresas participaram da concepção do golpe e do financiamento à tortura e que golpistas se articulavam desde 54; pesquisas de opinião agora reveladas indicam apoio popular a Jango superior a 60%; e documentos desclassificados como secretos nos EUA mostram que Lyndon Johnson e seus maiores grupos econômicos foram tão protagonistas dessa história quanto Castelo Branco e a Fiesp.
Carlos Tautz, jornalista, é coordenador do Instituto Mais democracia – Transparência e controle cidadão de governos e empresas
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