Me lembro do meu pai treinando seu francês para o discurso que faria em saudação ao Albert Camus, que estava no Brasil e visitaria Porto Alegre. Era “Camus” com final “mus” como em “músculo” ou “Cami”?
Eu só sabia que era um francês importante. Depois ele falou mal da sua visita. Nunca ficou claro o que o desagradara tanto no Brasil. Seu desgosto foi com todo o país, não só com Porto Alegre. O que pelo menos livrou a pronúncia do meu pai.
Antes de ler qualquer coisa do Camus, eu já sabia da vida dele, instigado por aquela sua visita à minha cidade quando eu tinha 13 anos. Sua infância na Argélia, sua atuação na resistência durante a ocupação nazista da França, e — o que mais me interessava — o fato de ele ter sido goleiro na juventude.
Mais tarde, quando comecei a ler sua obra, me interessei pelo mito inteiro. Sua definição do absurdo da existência na figura de Sísifo, sua posição ambígua diante da guerra de independência da Argélia, seus desentendimentos com Sartre, seu Prêmio Nobel (que Sartre também ganhou, mas se recusou a receber) e sua crescente reputação entre os intelectuais da época como alternativa para o engajamento radical do Sartre, e entre as leitoras da época como a personificação do escritor enquanto galã.
Este ano comemora-se o centenário do nascimento de Camus, cujo nome e cuja influência, acho eu, duraram mais do que as do Sartre. O dele ainda é um modelo de engajamento a ser seguido.
Numa entrevista publicada na “Les Nouvelles Littéraires” em 1951, ele qualifica a conclusão, representada no mito de Sísifo e o eterno retorno da sua pedra, de que a condição humana é um absurdo inescapável. Diz Camus: “Nada realmente tem sentido? Nunca acreditei nisso. Enquanto escrevia ‘O mito de Sísifo’ eu já pensava no ensaio sobre a revolta que escreveria em seguida.”
O ensaio citado pelo autor é o livro “O homem revoltado”, uma receita para que a vida faça sentido, na revolta contra a injustiça.
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