Nos corredores do poder, uma decisão crucial para o futuro do País

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Lula, o lobby de Aras e o futuro do Ministério Público

Brasília, se coberta com uma lona, em nada ficaria a dever ao circo do Doutor Lao, clássico da Sessão da Tarde dos anos 80 do século passado. Seus seres imaginários, bizarros, têm a mágica faculdade de desviar a atenção dos brasileiros dos assuntos realmente importantes.


Nesta semana em particular, o noticiário político esteve mais palpitante do que a cobertura de um reality show recheado de subcelebridades. As cenas foram dignas dos comentários de Léo Dias. Só babado.


Os leitores atentos (ou nem tanto) certamente se deliciaram com o barraco no grupo de WhatsApp de "família" do PL, as novas presepadas do senador Marcos do Val, nosso homem na Swat, e o constrangedor não depoimento do tenente-coronel Mauro Cid, cuja inteligência estratégica, certamente adquirida em anos de preparação no Exército, o levou a manter registrado no celular o passo a passo do frustrado golpe. Ninguém contava com sua astúcia, diria o Chapolin Colorado. Farda engomada, cabelo emplastrado, Cid mostrou-se no Congresso como é: uma versão contemporânea do Seu Batista, embora lhe falte a técnica de Eliezer Motta, mestre do humor.


O "Seu Batista" das casernas, apesar do amadorismo, ou por causa dele, não decepcionou. A passagem pela CPI dos Atos Golpistas, minguada, covarde e patética, avalizada por superiores, produziu outra mancha na (escassa) credibilidade das Forças Armadas. O rebranding verde-oliva levará tempo.

Não nos deixemos, porém, perder pelas sedutoras distrações deste circo de horrores. Nos corredores do poder, está em curso uma decisão crucial para o futuro do País.


Em setembro termina o mandato do procurador-geral da República, Augusto Aras, que fez jus ao apelido de "engavetador-geral". De uns tempos para cá, estimulado pela simpatia do presidente da Câmara, Arthur Lira, e de integrantes do governo, entre eles o ministro da Casa Civil, Rui Costa, Aras passou a alimentar a esperança de ser reconduzido ao cargo. E está em campanha explícita, como se vê em um tuíte publicado recentemente.


"Resta saber", escreveu, "se todos eles (os concorrentes) terão a disposição que o procurador-geral demonstrou nesses 4 anos para enfrentar e desestruturar as bases do lavajatismo."


Esqueçam meu passado, implora Aras.


Para azar do procurador-geral, o presidente Lula, comenta-se nos bastidores, não se comoveu. Aras, é verdade, conteve os esbirros da força-tarefa de Curitiba, mas o fez em grande medida por não pertencer ao clube e por conta da pressão dos aliados de Bolsonaro no Centrão.


Cumprir o dever é só um entre os requisitos exigidos para o cargo. Quando se coloca na balança os prós e contras, o saldo de Aras é mais negativo do que o rombo da Lojas Americanas. O comandante da PGR será lembrado pela conivência, ou melhor, cumplicidade com os inúmeros crimes praticados pelo ex-capitão, antes, durante e depois da pandemia. De lesa-pátria a lesa-humanidade.


Há dois concorrentes no páreo. Paulo Gonet tem a chancela de Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, juízes do Supremo, e de Flávio Dino, ministro da Justiça. Antonio Carlos Bigonha é o preferido do campo progressista, incluídos aí parlamentares do PT e advogados garantistas que enfrentaram os desmandos da "República de Curitiba".


Circula igualmente nos bastidores que Lula, a exemplo da escolha de Cristiano Zanin, tomará uma decisão solitária, sem submeter o nome de sua preferência a um colegiado. O petista fecha-se em copas.


Seja qual for a escolha, o presidente segue na direção correta ao dispensar a lista tríplice apresentada pelo Ministério Público. O que no passado aparentava um avanço institucional mostrou-se, ao longo do tempo, um equívoco monumental. A escolha do mais votado pelos pares para o comando do MP não reforçou o caráter republicano da instituição, apenas concentrou um poder desmedido nas mãos da corporação.


À margem de suas prerrogativas, contra as garantias constitucionais e ao arrepio de suas funções delegadas, procuradores imbuídos de um projeto messiânico, político, ideológico e partidário colocaram em risco a democracia e a soberania do País.


Não custa lembrar: o bolsonarismo é o filho dileto do lavajatismo.

Lula parece consciente do dever histórico. De uma só tacada, o presidente pode se livrar do "engavetador-geral" e recolocar nos trilhos uma corporação desvirtuada pelo apego ao poder. A esta altura, é preciso salvar o Ministério Público de si mesmo.


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