A lição de Erundina ao STF, por Bernardo Mello Franco

Em dezembro do ano passado, o Supremo Tribunal Federal recebeu um pedido para afastar o deputado Eduardo Cunha da presidência da Câmara. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sustentou que a medida era necessária e urgente para proteger a Lava Jato e a "dignidade do Parlamento".

Enquanto fosse mantido no cargo, escreveu Janot, o peemedebista continuaria a usá-lo "em benefício próprio e de seu grupo criminoso, com a finalidade de obstruir e tumultuar as investigações". Em 183 páginas, o procurador acusou o deputado de "destruir provas, pressionar testemunhas e intimidar vítimas".

"É imperioso que a Suprema Corte do Brasil garanta o regular funcionamento das instituições, o que somente será possível se (...) adotada a medida de afastamento do deputado Eduardo Cunha", afirmou Janot.

Apesar do pedido de urgência, os juízes do STF saíram de férias sem analisar o documento. Voltaram em fevereiro, mas a ação continuou na gaveta, onde adormece há 135 dias. Neste período, alguns ministros da corte foram à TV dizer que as instituições estão funcionando. Nunca explicaram por que o pedido para afastar Cunha ainda não foi julgado.

Enquanto o Supremo lavou as mãos, o deputado recuperou força política ao chefiar o processo de impeachment contra Dilma Rousseff. Conseguiu uma trégua da oposição e encorajou aliados a falarem abertamente numa "anistia" para salvá-lo.

Na quarta-feira, Cunha retomou uma prática antiga. Derrotado num debate que opunha a bancada evangélica à minoria feminina na Câmara, parou a sessão e forçou o plenário a votar de novo até reverter o resultado, em prejuízo das mulheres.

A deputada Luiza Erundina, do PSOL, subiu à presidência para protestar. O peemedebista se levantou, e ela se sentou por alguns minutos na cadeira que ele não deveria mais ocupar. Aos 81 anos, a paraibana deu uma lição aos ministros do Supremo que continuam de braços cruzados.

na Folha de São Paulo