Lá vem a Rússia

Na época de reunificação da Alemanha, fato contra o qual se bateu, Margaret Thatcher deixou escapar um desabafo numa reunião de líderes mundiais: “Lá vêm os alemães.”

Pois é.

Lá vêm os russos, como o caso da Crimeia mostra claramente.

Uns gostam dos russos, outros detestam, alguns ignoram, mas o que é claro que o mundo precisa de um anteparo ao poder unilateral dos Estados Unidos.

É uma necessidade, um imperativo geopolítico.

O que se viu depois da desintegração da União Soviética foi uma única superpotência abusar da paciência do mundo.

A Guerra do Iraque – feita com premissas mentirosas e não questionadas – é o maior exemplo disso, e está longe de ser o único.

Na Era da Informação, ficou difícil para os americanos sustentar a pose de campeões da liberdade. Não existe um único caso de um país que você possa dizer que melhorou depois de uma intervenção militar americana.

No mundo menos imperfeito, você não precisaria de contraponto aos Estados Unidos, mas este mundo em que vivemos é absurdamente imperfeito.

É admissível que o horror do Iraque não tivesse ocorrido com uma Rússia forte freando a agressividade destruidora dos Estados Unidos.

Putin, aparentemente, entende que a obra de sua vida é devolver grandeza global à Rússia. Haverá nisso mais ganho que perda, embora a Rússia não seja a Madre Teresa de Calcutá.

A Rússia tem a única coisa que os Estados Unidos verdadeiramente respeitam nas relações internacionais: bombas. Muitas bombas. São armas capazes de destruir várias vezes os Estados Unidos.

O outro possível contraponto ao poder americano, a China, tem uma economia fabulosa, mas sem armas acaba tendo escasso poder intimidatório para Washington.

Devemos ler com algum cuidado o noticiário nacional e internacional sobre a Rússia e Putin, pois a tendência é demonizar ambos.

Mas uma coisa é certa: com todos os defeitos da Rússia, é melhor um mundo com ela do que um mundo sem ela – ao menos enquanto os Estados Unidos estiverem tão dispostos a fazer uso de seus armamentos.

Sobre o Autor

O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

AP 470 - começar de novo

Se o Supremo Tribunal Federal pretende recuperar sua respeitabilidade, só há uma saída: refazer, do começo ao fim, o julgamento do chamado mensalão petista. A admissão, pelo presidente do STF, de que penas foram aumentadas artificialmente em prejuízo dos réus fez transbordar o copo de irregularidades da Ação Penal 470.

Relembrando algumas: a obrigatoriedade de foro privilegiado para acusados com direito a percorrer várias instâncias da Justiça; a adoção do princípio de que todos são culpados até prova em contrário, cerne da teoria do "domínio do fato"; o fatiamento de sentenças conforme conveniências da relatoria. E, talvez a mais espantosa das ilegalidades, a ocultação deliberada de investigações.

A jabuticaba jurídica tem nome e número: inquérito 2474, conduzido paralelamente à investigação que originou a AP 470.

Não é um documento qualquer. Por intermédio dos 78 volumes do inquérito 2474, repleto de laudos oficiais e baseado em investigações da Polícia Federal, réus poderiam rebater argumentos decisivos para sua condenação.

A negativa do acesso ao inquérito foi justificada da seguinte forma: "razões de ordem prática demonstram que a manutenção, nos presente autos, das diligências relativas à continuidade das investigações [...], em relação aos fatos não constantes da denúncia oferecida, pode gerar confusão e ser prejudicial ao regular desenvolvimento das investigações." O autor do despacho, de outubro de 2006, foi ele mesmo, Joaquim Barbosa.

Imagine a situação: o sujeito é acusado de homicídio, o julgamento do réu começa e, durante os trabalhos da corte, antes mesmo de qualquer decisão do júri, a suposta vítima aparece vivinha da silva. "Ah, mas outra investigação afirma que ele estava morto", argumenta o promotor. "Isto vai criar confusão". O julgamento continua. O vivo respira, mas nos autos está morto. E o réu, que não matou ninguém, é condenado por assassinato.

O paralelo parece absurdo, mas absurdo é o que fez o STF. A existência do inquérito 2474 tornou-se pública em 2012, em reportagem desta Folha sobre o caso de um executivo do Banco do Brasil, Cláudio de Castro Vasconcelos.

A conexão com a AP 470 era evidente, pois focava o mesmo Visanet apontado como irrigador do mensalão. O processo havia sido aberto seis anos antes, em 2006, portanto em tempo mais do que hábil para ser examinado.

Nenhum desses fatos é propriamente novidade. Eles ressurgiram em janeiro deste ano, quando o ministro Ricardo Lewandovski liberou a papelada aos advogados de Henrique Pizzolato. Estranhamente, ou convenientemente, o assunto passou quase despercebido.

É hora de acender a luz. O comportamento ao mesmo tempo espalhafatoso e indecoroso do presidente do STF tende a concentrar as atenções no desfecho da AP 470. Neste momento, por razões diversas, pode ser confortável jogar nas costas de Joaquim Barbosa o ônus, ou o bônus, do julgamento. É claro que seu papel é inapagável, mas ele tem razão ao lembrar que o fundamental foi decidido em plenário.

No final das contas, há gente condenada e presa num processo que tem tudo para ser contestado. O país continua sem saber realmente se houve e, se houve, o que foi realmente o chamado mensalão.

Conformar-se, ou não, com o veredicto da inexistência de formação de quadrilha é muito pouco diante das excentricidades jurídicas, para dizer o menos, que cercaram o julgamento e têm orientado a execução das penas.

Embora desperte curiosidade justificada, o que menos importa é o futuro de Barbosa. Quem está na berlinda é o STF como um todo: importa saber se o país possui uma instância jurídica com credibilidade para fazer valer suas decisões.

Ricardo Melo, 58, é jornalista. Na Folha, foi editor de 'Opinião', editor da 'Primeira Página', editor-adjunto de 'Mundo', secretário-assistente de Redação e produtor-executivo do 'TV Folha', entre outras funções. Também foi chefe de Redação do SBT (Sistema Brasileiro de Televisão), editor-chefe do 'Diário de S. Paulo', do 'Jornal da Band' e do 'Jornal da Globo'. Na juventude, foi um dos principais dirigentes do movimento estudantil 'Liberdade e Luta' ('Libelu'), de orientação trotskista.

AP 470 - começar de novo

Se o Supremo Tribunal Federal pretende recuperar sua respeitabilidade, só há uma saída: refazer, do começo ao fim, o julgamento do chamado mensalão petista. A admissão, pelo presidente do STF, de que penas foram aumentadas artificialmente em prejuízo dos réus fez transbordar o copo de irregularidades da Ação Penal 470.

Relembrando algumas: a obrigatoriedade de foro privilegiado para acusados com direito a percorrer várias instâncias da Justiça; a adoção do princípio de que todos são culpados até prova em contrário, cerne da teoria do "domínio do fato"; o fatiamento de sentenças conforme conveniências da relatoria. E, talvez a mais espantosa das ilegalidades, a ocultação deliberada de investigações.

A jabuticaba jurídica tem nome e número: inquérito 2474, conduzido paralelamente à investigação que originou a AP 470.

Não é um documento qualquer. Por intermédio dos 78 volumes do inquérito 2474, repleto de laudos oficiais e baseado em investigações da Polícia Federal, réus poderiam rebater argumentos decisivos para sua condenação.

A negativa do acesso ao inquérito foi justificada da seguinte forma: "razões de ordem prática demonstram que a manutenção, nos presente autos, das diligências relativas à continuidade das investigações [...], em relação aos fatos não constantes da denúncia oferecida, pode gerar confusão e ser prejudicial ao regular desenvolvimento das investigações." O autor do despacho, de outubro de 2006, foi ele mesmo, Joaquim Barbosa.

Imagine a situação: o sujeito é acusado de homicídio, o julgamento do réu começa e, durante os trabalhos da corte, antes mesmo de qualquer decisão do júri, a suposta vítima aparece vivinha da silva. "Ah, mas outra investigação afirma que ele estava morto", argumenta o promotor. "Isto vai criar confusão". O julgamento continua. O vivo respira, mas nos autos está morto. E o réu, que não matou ninguém, é condenado por assassinato.

O paralelo parece absurdo, mas absurdo é o que fez o STF. A existência do inquérito 2474 tornou-se pública em 2012, em reportagem desta Folha sobre o caso de um executivo do Banco do Brasil, Cláudio de Castro Vasconcelos.

A conexão com a AP 470 era evidente, pois focava o mesmo Visanet apontado como irrigador do mensalão. O processo havia sido aberto seis anos antes, em 2006, portanto em tempo mais do que hábil para ser examinado.

Nenhum desses fatos é propriamente novidade. Eles ressurgiram em janeiro deste ano, quando o ministro Ricardo Lewandovski liberou a papelada aos advogados de Henrique Pizzolato. Estranhamente, ou convenientemente, o assunto passou quase despercebido.

É hora de acender a luz. O comportamento ao mesmo tempo espalhafatoso e indecoroso do presidente do STF tende a concentrar as atenções no desfecho da AP 470. Neste momento, por razões diversas, pode ser confortável jogar nas costas de Joaquim Barbosa o ônus, ou o bônus, do julgamento. É claro que seu papel é inapagável, mas ele tem razão ao lembrar que o fundamental foi decidido em plenário.

No final das contas, há gente condenada e presa num processo que tem tudo para ser contestado. O país continua sem saber realmente se houve e, se houve, o que foi realmente o chamado mensalão.

Conformar-se, ou não, com o veredicto da inexistência de formação de quadrilha é muito pouco diante das excentricidades jurídicas, para dizer o menos, que cercaram o julgamento e têm orientado a execução das penas.

Embora desperte curiosidade justificada, o que menos importa é o futuro de Barbosa. Quem está na berlinda é o STF como um todo: importa saber se o país possui uma instância jurídica com credibilidade para fazer valer suas decisões.

Ricardo Melo, 58, é jornalista. Na Folha, foi editor de 'Opinião', editor da 'Primeira Página', editor-adjunto de 'Mundo', secretário-assistente de Redação e produtor-executivo do 'TV Folha', entre outras funções. Também foi chefe de Redação do SBT (Sistema Brasileiro de Televisão), editor-chefe do 'Diário de S. Paulo', do 'Jornal da Band' e do 'Jornal da Globo'. Na juventude, foi um dos principais dirigentes do movimento estudantil 'Liberdade e Luta' ('Libelu'), de orientação trotskista.

Meu coração bate assim

Lu
Tu
Te
Amo

Meu coração bate assim

Lu
Tu
Te
Amo

Sou ateu

A vida se resume a Fé , Esperança e Amor.
Não tenho fé
Tenho esperança e amor.
Aí , como fica ratos de religião?...
Vou queimar nas brasas do inferno?....

FHC apoio todos os golpes desferidos pelos EUA

“Chegou a hora de corrigir o rumo. Que a crise venezuelana nos desperte da letargia.”
A frase não foi dita por nenhum golpista de Caracas, após sacar uns dólares no guichê do consulado americano. Quem a pronunciou, em artigo publicado nos principais jornais do país, foi Fernando Henrique Cardoso, nosso ex-presidente.
Em seu estilo altamente engordurado, FHC não faz outra coisa senão dizer que o Brasil deveria se aproximar mais dos EUA e assumir posições antibolivarianas, sobretudo na Venezuela.
É uma posição ideologicamente ultra-conservadora. E burra economicamente, porque a Venezuela tem sido, nos últimos anos, nosso melhor parceiro comercial, o que paga mais caro pelos produtos brasileiros. Não porque os venezuelanos gostem de pagar caro, mas é que os importadores do país preferem comprar no Brasil aqueles produtos que outrora só se comprava na Europa e EUA.
Diz FHC:
O Brasil, timidamente, se encolhe enquanto o partido da presidente apoia o governo venezuelano, sem qualquer ressalva às mortes, aprisionamento de oposicionistas e cortinas de fumaça que querem fazer crer que o perigo vem de fora e não das péssimas condições em que vive o povo venezuelano.
Ora, FHC poderia muito bem se distanciar do golpismo doentio da máfia midiática do continente. Poderia falar dos problemas atuais, fazer críticas políticas à Maduro, mas deveria, se fosse honesto, admitir que o chavismo zerou o analfabetismo na Venezuela e melhorou profundamente a vida das camadas mais pobres do país. Não, ele prefere chancelar a mentira.
O seu artigo é uma prova de que a volta do PSDB ao poder constituiria um elemento de perigosa instabilidade para o continente, porque insuflaria confiança ao golpismo de oposição em todos os países latino-americanos.
FHC manda um recado até para Honduras, sempre apoiando o golpe: “[o Brasil] interfere contra o sentimento popular em Honduras (…)”
Os governos Lula/Dilma têm sido, até então, um dos principais anteparos contra os golpes de Estado, antes tão comuns, em nosso continente. E mesmo assim, eles aconteceram: em Honduras e Paraguai, por exemplo, vimos a estreia de um novo tipo de golpe, disfarçado de legalidade.
Em Honduras, a suprema corte, presidida por algum joaquim barbosa, aliada aos barões da mídia, não apenas destitutiu sumariamente o presidente, sem direito à defesa, como mandou o exército prendê-lo em sua casa, de madrugada, e ainda o expulsou do país. Para FHC, no entanto, isso foi fruto do “sentimento popular”, mesmo que a maioria das manifestações populares nas ruas fossem em favor de Manuel Zelaya.
E agora FHC apoia o golpe contra a Venezuela.
A qualidade dos tucanos é que eles são previsíveis. Onde houver golpe patrocinado pelos EUA, eles darão suporte.
Mais uma vez, as eleições presidenciais no Brasil definirão não apenas a nossa soberania, mas de todo o continente. Uma vitória do partido de FHC seria automaticamente entendida como autorização para todo o tipo de atentado contra governos eleitos democraticamente. Supremas cortes, mídia, consulados americanos, partidos de direita, todos os núcleos golpistas, corruptos e corruptores sentiriam-se estimulados a tomar o poder sem passar pelo crivo do povo.
Fernando Brito no Tijolaço