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Paulo Nogueira - O STF pós Barbosa

É o início da era pós-JB no STF, e recuperar a credibilidade será um desafio de anos.

Sob Barbosa, o Supremo politizou de tal forma a justiça que você sabia o voto de cada um dos juízes muito antes que fosse proferido.

A reconstrução do STF terá que se dar também nos detalhes. Que sentido faz, por exemplo, o palavreado pomposo, solene, muitas vezes indecifrável e ridículo dos juízes?

Eles têm que se expressar num português compreensível para todos. Nas sociedades mais avançadas, não se admite que um juiz use uma linguagem que não seja entendida pela voz rouca das ruas.

A agenda é portentosa. É necessário que surjam inovadores entre as lideranças jurídicas brasileiras para que seja feito o trabalho imperioso de modernização.

Por ora, a prioridade é, naturalmente, a reconstrução do STF. O atual sistema de indicação se revelou um formidável fracasso: basta olhar para uma indicação de FHC, Gilmar Mendes, e outra de Lula, Joaquim Barbosa. Está claro que é preciso achar um novo jeito de nomear juízes.

O mais sensato é examinar quais são as melhores práticas internacionais. Pior que a brasileira provavelmente não há.

No curto prazo a questão é restaurar as ruínas deixadas por Barbosa.

As primeiras decisões depois de JB geram sentimentos ambíguos.

No caso de Dirceu, a mensagem é boa. Barbosa vinha sendo absurdamente injusto com Dirceu ao não lhe permitir o trabalho fora da Papuda.

Isso foi corrigido. Os 9 votos a 1 mostram quanto era precária a argumentação de Barbosa.

No caso de Genoino, ao qual foi negada a prisão domiciliar, a mensagem é confusa. Ficou a sensação de que alguns juízes temeram que favorecer num mesmo dia Dirceu e Genoino seria demais. Poderia ganhar força a imagem de um Supremo "petista".

Sob essa ótica, o que se viu foram votos menos técnicos e mais de conveniência, para infortúnio de Genoino.

Barroso, o relator, alegou "isonomia". Outros presos na mesma situação de Genoino estariam sendo injustiçados.

A melhor resposta a esta estranha tese veio de Miruna, a filha de Genoino. Numa carta ao pai, escrita no fragor da sentença, ela notou: "Que mundo é esse, meu Deus, em que as pessoas querem igualar a injustiça e não a justiça?"

Num português claro, simples, sem magníficas pomposidades, Miruna disse numa frase mais que todos os juízes.

É uma prova a mais de como será longa a jornada para a construção de uma justiça à altura do que o Brasil merece.

Sobre o Autor

O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

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"Deus mudou o teu caminho até juntares com o meu e guardou a tua vida separando-a para mim.
Para onde fores, irei;
Onde tu repousares, repousarei.
Teu Deus será o meu Deus.
Teu caminho o meu será."

Arrocho ou Distribuição de Renda,você decide

Democracia, organização popular e produtividade compõem a alternativa à agenda de arrocho e desemprego preconizada pelo conservadorismo

por Saul Leblon

O entusiasmo do ex-presidente Lula com um  programa de fomento tecnológico a ser anunciado pelo governo –Plataformas do Conhecimento, cuja existência ele antecipou em palestra a empresários, nesta 3ª feira–  reflete  a ansiedade do campo progressista  diante de uma corrida contra o tempo  que pode decidir  o futuro brasileiro.

'Há dois modelos em jogo, um prega a volta ao passado, com arrocho salarial e a alienação do patrimônio. Nós propomos maior distribuição de renda' , resumiu a Presidenta Dilma em discurso quase simultâneo ao  de Lula,  na mesma 3ª feira.

Ele em São Paulo, ela em Brasília, ambos falavam sobre o mesmo tema: a disjuntiva por trás dos dois projetos de país  em disputa nas urnas de outubro.

A encruzilhada do desenvolvimento brasileiro é real.

A dimensão dos conflitos acirrados pela crise internacional – marcada pela anemia da demanda, a canibalização de mercados e a voragem por mais-valia–  induz  o conservadorismo brasileiro a abraçar uma versão ainda mais radical do seu projeto para o país.

Não importa o que diz a oratória dissimulada de seus candidatos de sorriso fácil: eles cavalgam uma lógica imiscível com os avanços econômicos e sociais registrados desde 2002 .

Nos salões do dinheiro grosso, seus formuladores  despem a dissimulação e  adiantam que  será preciso baixar a ordem unida do desemprego para ajustar a economia à taxa de exploração compatível  com a voragem conservadora global.
Competitividade para eles é isso.

A continuidade do projeto progressista, no entanto, requer  igualmente uma  inflexão de densidade que não pode ser subestimada.

Ela  só vingará com um enorme esforço político desdobrado em uma alavanca de três pontos de apoio:  organização popular, democracia participativa e salto tecnológico sistêmico, que irradie a produtividade necessária para atender à demanda por direitos  e qualidade de vida.

Não é uma operação de natureza contábil.

Trata-se de deslocar  a correlação de forças para uma nova hegemonia capaz de definir  o rosto de um Brasil onde palavras como igualdade, cidadania e democracia participativa  não sejam mero adorno do futuro.

Mais democracia, mais organização popular e mais produtividade.

As três pontas do tripé se equivalem em importância.

Mas o salto de produtividade é o lubrificante  estratégico para contrapor  o ganho tecnológico ao lacto purga conservador  feito  de arrocho salarial & desemprego.

'São dois modelos em jogo e nós propomos maior distribuição de renda', disse-o bem a Presidenta da República.

Essa é a nervura política por trás do programa Plataformas do Conhecimento, que  entusiasma Lula.

E o entusiasma por  vislumbrar aí o espaço para  a construção de uma democracia social negociada,  condizente com  uma mudança  progressiva na correlação de forças não apenas no país, mas na geopolítica mundial.

Para dizê-lo de modo muito grosseiro: o Brasil precisa de mais uma década para o pré-sal maturar e  os Brics  se consolidarem como um polo alternativo à truculenta hegemonia do capital financeiro mundial.

A confrontação direta, nas condições atuais, teria poucas chances de êxito.

Nas palavras de Maria da Conceição Tavares : 'é preciso resistir para avançar'  (leia sua entrevista nesta página).

Não uma resistência passiva. Mas feita de prioridades pactuadas, o que inclui  setores onde fincar as estacas fundadoras do passo seguinte do desenvolvimento brasileiro.

Maria da Conceição  Tavares, na entrevista citada, admitia que  o Brasil talvez não possa mais  recuperar integralmente o espaço perdido pela sua indústria para  a concorrência internacional.

Mas preconizava uma revitalização em novas bases, injetando fôlego tecnológico adicional em setores  em que o país já detém  certa vantagem  competitiva.

É o que visa o programa antecipado por Lula, que tem entre os seu salvos  a agropecuária, o petróleo (a cadeia do pré-sal)  e a aeronáutica.

Os dois primeiros  são de pertinência reconhecida.

Mas é justamente  no menos óbvio  –a aeronáutica—que se evidencia, de forma exemplar,  o papel de uma política pública de fomento tecnológico, capaz de  catalisar  potencialidades  que de outra forma seriam desperdiçadas  pelo  país.

Em março último, Carta Maior  relatou  um caso exemplar nessa fronteira entre o desperdício e o salto para o futuro.

Reportagens publicadas então na  Exame  e na revista on line, 'Defesa Aérea e Naval',   chamaram a atenção de Carta Maior.

As matérias davam conta de que a Polaris, empresa de  ex-engenheiros  do CTA/ITA , de São José dos Campos (SP), havia desenvolvido  uma micro turbina , com densidade tecnológica suficiente para  credenciar o Brasil no seleto clube dos fabricantes mundiais de grandes turbinas aeronáuticas, dominado por um número muito reduzido  de corporações.

A oportunidade, porém, estava ameaçada de se perder –ou 'migrar' para centros de desenvolvimento em países ricos–  por falta de apoio de políticas públicas.

O caso da Polaris remetia, ademais, à contraposição de  projetos antagônicos,  destinados a resgatar a eficiência e a competitividade da industrialização  brasileira no século XXI.

Falta uma peça na engrenagem de uma nação que  tem 8,8 milhões de pequenos empresários, mas  não  possui uma  estrutura favorável à emergência de startups mundiais , como as credenciadas na famosa lista do Wall Street Journal, avaliadas em mais de 1 bilhão de dólares cada uma.

A Polaris poderia ser uma delas, se há vinte anos o Brasil tivesse criado uma plataforma de fomento semelhante a essa que tanto entusiasma Lula.

Avançar de uma economia de renda média, como a brasileira,  para um padrão de renda alta, capaz de associar eficiência produtiva, bons empregos e qualidade de vida  implica não mais desperdiçar essas oportunidades.

A questão é: quem comandará o desbaste dos gargalos? Que forças podem e devem impulsioná-lo? Que diferença faz a escolha de um ou de outro protagonista?

A pedra de toque do tabuleiro conservador , a redução do 'Custo Brasil',  mal disfarça o propósito de quebrar a espinha dorsal dos assalariados, com uma purga de arrocho nos holerites  e cortes de direitos sociais expandidos  desde 2003.

O arrocho , ademais da funcionalidade econômica, tem sentido político.

O objetivo é lubrificar a adesão das empresas  à derrubada drástica das tarifas de importação, compensando-as duplamente, com o corte nas folhas de pagamento, e o ajuste no câmbio que deprime o poder de compra real dos trabalhadores.

Substituir a carta branca  delegada aos mercados pela negociação política de  um novo pacto para o desenvolvimento é a alternativa progressista.

Nele, a alavanca da produtividade  ocupa o espaço reservado à marretada do arrocho.

Que destino  amargaria uma empresa brasileira como a Polaris, em um governo  embarcado na lógica da marreta?

E quantas outras  milhares de startups  de potencial equivalente  não teriam o mesmo destino sombrio?

O engenheiro Alberto Carlos Pereira Filho, presidente da Polaris,  explica, por exemplo, que o processo de desenvolvimento e certificação internacional de uma turbina para aviões comerciais custa dezenas de milhões de dólares.

O percurso do laboratório ao mercado leva anos:  é impensável sem um apoio efetivo do setor estatal.

Foi por isso que a Polaris  optou, inicialmente, por  uma versão de menor complexidade, com investimentos de R$ 4,5 milhões, via Finep (Financiadora de Estudos e Projetos).

Vencida a barreira do conhecimento e, com dois anos de testes,  a TJ200 é a  primeira turbina aeronáutica de pequeno porte a entrar em produção num mundo cada vez mais receptivo  ao seu uso civil.

'A disseminação de  drones para serviços de correio', exemplifica Luis Klein, diretor comercial da empresa, 'vai acelerar a adequação desses equipamentos  — a exemplo do que deve ocorrer também na agricultura, nas operações de pulverização e controle'.

Daí  para disputar o mercado de aviões comerciais configura um salto que está nas mãos do governo, diz ele.

As oportunidades não são tão remotas quanto se imagina.

'Recentemente', exemplifica,  'o Brasil assinou um contrato para o primeiro avião a ser fabricado 100% dentro da Unasul; a turbina prevista é de origem  russa'.

'Poderíamos ter acoplado ao projeto o desenvolvimento de uma tecnologia própria', lamenta: 'São apenas dois exemplos de oportunidades à espera de uma política estratégica de Estado'.

O Programa de Plataformas  do Conhecimento  a ser anunciado por Dilma pode ser um sinal de que esses equívocos começam a ser retificados pela  necessidade de se oferecer uma resposta crível à estratégia conservadora do arrocho.

Se for assim, será uma auspiciosa ruptura com a lógica embutida nos planos  da candidatura  conservadora.

Mas não com a receita de adensamento tecnológico  adotada pelas maiores economias industriais do planeta.

Caso dos EUA, por exemplo, cuja  bilionária política de encomendas do setor militar  constitui a principal alavanca de impulsão tecnológica do país.

Ainda hoje,  o orçamento militar norte-americano figura como o maior sistema de encomendas públicas e de incentivo à   inovação  do mundo.

A tal ponto que  Estado autoriza margens de preferência de até 50% nas compras do Exército –ou seja, as compras bilionárias das Forças Armadas dos EUA  privilegiam empresas locais,  mesmo que o seu preço  seja  até 50% superior ao similar importado.

Pelo menos até a crise de 2008, mais de 30% dos gastos dos EUA  com  pesquisas correspondiam a  recursos canalizados  a  empresas inovadoras .

É assim que a maior economia capitalista do planeta fomenta novas tecnologias, garantindo-lhes  uma escala de compras compatível com a sua sustentação comercial.

Uma dessas linhas de fomento, a Small Business Innovation Research Program, foi a estufa onde floresceu a Microsoft.

A centralidade  de uma política industrial soberana, portanto,  não é um mero fetiche da esquerda. Tampouco  um anacronismo ideológico da Unicamp , como quer a soberba  tucana.

Trata-se de um trunfo indispensável à irradiação da produtividade sistêmica, sem a qual não haverá  excedente econômico capaz de  ampliar direitos sociais, empregos de qualidade e salários dignos.

A indução estatal desse processo não esgota o duplo desafio de conciliar a construção de uma democracia social no Brasil com a inserção de sua economia nas grandes cadeias globais.

Mas figura, por assim dizer, como a chave-mestra das  escolhas  fundadoras de um novo ciclo.

Elas  vão decidir se o país logrará se reposicionar no século XXI como uma economia dotada de turbinas  próprias, ou como figurante caudatário, a  turbinar interesses antagônicos aos do seu povo.

Mensagem da Vovó Briguilina


Amigo é aquele que consegue forças para levantar o astral do outro, quando o dele está abaixo do chão. E fazer isso sem esperar retribuição.

Semvergonhice derrotada

DERROTA DE UMA VERGONHA Vitória de Dirceu deve ser comemorada mas derrota de Genoíno mostra que não é preciso exagerar nos festejos

Deve-se comorar a votação de 9 a 1 que garantiu a José Dirceu o direito de trabalhar fora da Papuda. Quem ainda não perdeu a capacidade de reconhecer o valor da liberdade e a importância da Justiça, deve sentir-se um pouco mais feliz desde ontem. Respire: há oxigênio no ar.

Não se deve exagerar nos festejos, porém. Basta recordar a derrota de José Genoíno em seu pedido de prisão domiciliar para compreender isso.

Ontem, o STF garantiu o acesso de Dirceu – e de outros presos em situação semelhante – a uma jurisprudência firmada há quinze anos pelo Judiciário brasileiro. Tem garoto que poderá votar em outubro e era um bebê de colo e mamadeira quando isso já funcionava.

Os ministros não definiram uma nova garantia, nem esclareceram uma dúvida. Nada inventaram. Nada descobriram. Corrigiram uma situação vergonhosa, que estava diante do nariz do país inteiro desde 15 de novembro, quando um avião da Polícia Federal levou os prisioneiros para Brasília.

Troféu da AP 470, Dirceu ficou trancafiado na Papuda por sete meses quando tinha, desde o primeiro dia, direito a regime semi-aberto, definido no momento em que sua sentença transitou em julgado. Esse direito até foi confirmado em fevereiro, mais tarde, quando o STF concluiu que não havia provas para sustentar a condenação por quadrilha. E mesmo assim Dirceu só teve o direito assegurado ontem. Deve começar a trabalhar na segunda-feira.

Terá tranquilidade quando sair à rua? Irá enfrentar repórteres hostis, cidadãos insuflados, a turma do VTNC? Vamos ver. A prisão injusta, o desrespeito aos direitos de um cidadão não constiituem fatos isolados. Criam intolerâncias, estimulam posturas inadequadas e mesmo violentas. A historiadora Lynn Hunt explica que o espírito democrático e o respeito dos direitos humanos são uma invenção belíssima do seculo XVIII. Mas só funciona em sociedades onde homens e mulheres são ensinados a respeitar os direitos do outro, a sentir empatia – que é diferente de concordância – por eles.

Ministro do governo Lula, um dos principais arquitetos do Partido dos Trabalhadores, adversário da ditadura desde os tempos de estudante da PUC paulista, Dirceu passou sete meses na condição de perseguido político.

Como foi demonstrado por Ricardo Lewandowski, e admitido de viva voz pelo presidente do tribunal, Joaquim Barbosa, Dirceu fez parte da lista de réus que teve a pena agravada artificialmente e assim foi trancafiado, como um pária, um marginal, um criminoso que representa perigo para a sociedade. Condenado por chefiar uma ex-quadrilha, foi o alvo principal das grandes aberrações do julgamento. Também era a motivação maior para denúncias que seriam risíveis, se não fossem trágicas, de contar com privilégios e regalias na cadeia.

Ao longo da AP 470, Dirceu foi o protagonista do teatro do mensalão sem que se pudesse demonstrar –juridicamente – seu papel no enredo. A teoria do domínio do fato entrou na denúncia para que pudesse ser condenado. O fatiamento da denúncia serviu para que a acusação pudesse ligar Dirceu a cada um dos réus. O desmembramento não podia ser aceito porque iria permitir a Dirceu ser julgado de acordo com a Constituição: como um réu comum, sem privilégios que, usados de forma perversa, permitiram que fosse condenado sem recurso. (Quando não foi impedido de recorrer, ganhou).

Ao recusar o direito de José Genoíno cumprir sua pena sob regime domiciliar, o STF tomou uma decisão política. Poucos ministros, ao longo do processo, deixaram de pronunciar palavras bonitas para homenagear Genoíno – o que ajuda a lembrar que a Justiça não precisa de sentimentalismo, nem de frases grandioloquentes, mas de firmeza em relação a princípios e direitos.

Num processo de corrupção, o sobrado onde Genoíno mora com a família, comprado a prestações na Caixa Economica, é a contra-prova de uma existência dedicada à luta honesta por suas convicções. A tentativa de criminalizar empréstimos tomados pelo PT, que ele assinou na condição de presidente da legenda, ficou desmoralizada quando a própria Polícia Federal provou que eram empréstimos autênticos, que sairam do banco para pagar despesas do partido.

Se foi absurdo condenar Genoíno, em 2012, a maioria formada para negar seu pedido de prisão domiciliar, ontem, não faz bem ao STF. Mostrou que, mesmo ausente do plenário, a caminho da aposentadoria, Joaquim Barbosa e aquilo que representa -- o apoio incondicional dos meios de comunicação -- tem seu lugar no tribunal.

Os sucessivos laudos assinados depois que Genoíno foi preso mostram que os médicos estão divididos e, sem pretender apostar na avaliação de X, Y ou Z, a prudência e o espírito de Justiça recomendam que, em dúvida, decide-se a favor do réu. Juizes tomam partido num debate médico?

Confesso que é natural ouvir juizes falarem de legislação e jurisprudência. Explicarem a constituição, a lei ordinária. Mesmo assim, não é fácil.

O próprio barroquismo da linguagem da maioria dos atestados mostra o tamanho da dúvida dos próprios doutores.

Os médicos da Câmara de Deputados produziram dois laudos. Um resumido, ótimo para ser lido na TV, desfavorável a Genoíno. Outro, completo, com ponderações que favoreciam o regime domicilar. Até a primeira junta médica montada por Joaquim Barbosa, para responder ao médico particular que examinou o prisoneiro após sua chegada a Papuda, também fez diversas ressalvas.

Arte e ciencia da vida de todos nós, a medicina não costuma ficar melhor quando é atingida por pressões políticas – como recordam estudiosos do ciclo militar, quando doutores eram convocados para assinar falsos atestados de óbito e até para examinar as condições de um prisioneiro depois da tortura.

Não. Estamos muito longe disso. O país vive outro tempo.

Mas cabe uma lição. Neste regime democrático construído pela luta de homens e mulheres -- como Dirceu e Genoíno – também é preciso manter os princípios, defender direitos e entender que nenhuma conquista está assegurada por antecipaçao.

Autor: Paulo Moreira Leite