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Lei de Gérson na lava jato, por Paulo Moreira Leite

Como ocorre com grandes operações de natureza político-policial dos anos recentes, a Lava Jato não costuma ser justificada apenas por seus benefícios materiais, como a localização e punição de corruptos e as vezes de corruptores, nem só pela recuperação de ativos furtados de uma riqueza que pertence a maioria dos brasileiros.

      Outra justificava seria a capacidade para contribuir para uma suposta  "regeneração moral" dos brasileiros, este povo que, conforme um diagnóstico partilhado pela unanimidade de nosso pensamento conservador,  em qualquer de suas ramificações, sobrevive e se reproduz a margem de bons princípios morais. É um ponto de vista tão difundido como duvidoso.

       Um dos patronos do pensamento  do século XX, o pensador Isaiah Berlim, produziu uma das mais conhecidas contribuições para o debate ético contemporâneo. Berlim ensinou que os bons princípios não podem ser aqueles que nos trazem vantagem. Pelo contrário: "são aqueles que contrariam nossos interesses."

       Moral, desse ponto de vista, envolve uma noção de despreendimento e mesmo sacrifício -- e não admite vantagens do ponto de vista pessoal.

       O desinteresse de que fala Berlim é obviamente incompatível com o caráter seletivo das investigações, que atende as conveniências políticas da oposição e ajuda a entender o caráter espetaculoso da operação. Mas um aspecto essencial envolve as delações premiadas, como se viu na surpreendente acareação promovida pela CPI em Curitiba, quarta-feira passada.

       Chamado a responder às  denuncias de Augusto Mendonça, da Toyo Setal, o diretor da Petrobras Renato Duque devolveu toda e cada uma das acusações com a frase: "ele é um grande mentiroso." Pelas contas de Duque, Mendonça mentiu 80 vezes, depois, 90 vezes e por fim mais de "cem vezes."

       Falando baixo, evitando olhar Renato Duque, Mendonça confirmou a maior parte do que disse nas delações premiadas. Mas a acareação colocou uma dúvida importante sobre recursos repassados por Mendonça ao Partido dos Trabalhadores. Mendonça admitiu que, embora representassem o pagamento de propinas, jamais havia agido como se não fossem contribuições legítimas de campanha. Quando disse que não se recordava de determinado episódio, Mendonça foi atingido por Duque: "mentiroso esquecido." Perguntado se era verdade, como Mendonça dissera, que havia recorrido aos serviços dele para remeter dinheiro ao PT, Duque retrucou dizendo que, se quisesse mandar dinheiro ao PT, teria feito isso por sua própria conta.

      A mesma questão ética apareceu dias antes, com outro personagem. O empreiteiro Marcelo Odebrecht disse que não pretendia "dedurar" ninguém. Explicou que em primeiro lugar não tinha o que "dedurar". Mas também deu um argumento moral. Citando a educação das filhas, revelou que o ato de dedurar alguém por uma falta cometida pode ser até mais grave do que a própria falta.

     À frente de um grupo econômico que, conforme uma reportagem recente da revista britânica Economist, cultiva princípios e valores, Odebrechet chegou a ser criticado pelo exemplo. Mas é difícil negar que tenha colocado um elemento ético à mesa: o da lealdade que se justifica como um valor em si, e não se dobra às conveniências.

     Na prática, a  delação é tão favorável aos interesses do delator que parece ter mais apoio numa nova versão da lei de Gerson anunciada numa propaganda de cigarros ( "tirar vantagem em tudo, certo?") do que na formulação de Berlim.  

     Depois de desviar recursos durante anos criminosos apanhados em flagrante têm a oportunidade salvar a pele desde que apontem para colegas de trabalho, quem sabe auxiliares que eles trouxeram para o esquema,  que tiveram o azar de não terem sido aprisionados com antecedência -- ou que, menos envolvidos na trama, têm segredos menos interessantes para contar. 

    Pelas regras da delação, os grandes corruptos, são os candidatos a grandes delatores.

    É como se a mesma "organização criminosa" continuasse a funcionar, agora com o sinal trocado:  quanto maior o grau de responsabilidade de um acusado pelos crimes cometidos, maior será o interesse por sua delação -- e maior o benefício recebido pelo desempenho. Quem explica é o  professor Renato Mello Jorge Silveira, diretor-adjunto da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo: " beneficia-se o criminoso de alta gama, aquele que teria mais informações. Pactua-se, portanto, com quem mais delinquiu. Pune-se, por outro lado, a menor criminalidade ou outros, que simplesmente ficaram aquietados."

Levy falhou, por Luís Nassif

Não há limites para a irracionalidade de determinados jornalistas econômicos e economistas ligados ao mercado.

Durante anos acostumaram-se com o mantra de que ajuste fiscal é recomendado para qualquer circunstância. Não se está falando das práticas prudenciais, mas do ajuste pelo ajuste.

Repetem o mantra como araras destrambelhadas, incapazes de analisar cenários, pesar variáveis.

Mesmo ante todas as evidências, continuam defendendo as taxas de juros irresponsavelmente elevadas do Copom, sob o argumento de que o lado fiscal não está sendo executado.

São incapazes de entender correlações mínimas da economia, os fatores que obrigam à  compatibilização das políticas fiscal e monetária.

Qual a razão de se puxar mais pela monetária quando a fiscal está frouxa? Reduzir o aquecimento da demanda supostamente produzida por uma política fiscal frouxa.

Ora, não se consegue equilibrar as contas fiscais devido à frustração das receitas decorrente da queda do nível de atividade econômica. Como pretender que um déficit, fruto da redução da atividade econômica, esteja pressionando a atividade econômica a ponto de responder pela inflação?

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O que está em jogo é mais do que a disputa pelo bolo, entre mercado e atividade produtiva: é a própria estabilidade econômica e política.

É hora de se aceitar o inevitável: o plano Joaquim Levy falhou. E não falhou pelo que deixou de conseguir, mas pelo que implementou até agora.

Não se debite apenas a ele o tamanho da recessão.

Houve uma desatenção indesculpável com os efeitos da Lava Jato sobre a economia. E não se vá culpar a força-tarefa. A responsabilidade por minorar os efeitos econômicos caberia ao Executivo.

Desde o ano passado poderia ter sido negociado com o Ministério Público Federal um acordo de leniência que punisse os acionistas preservando as empresas. Aqui mesmo, mostrei a fórmula simples e óbvia:

Uma empresa vale, digamos R$ 2 bilhões.

Se tiver que ressarcir R$ 1 bilhão à Petrobras, quebra. Não vai valer nada.

Se abrir como única porta a obrigação dos acionistas controladores venderam sua participação, eles arrecadarão R$ 1 bilhão, pagarão a Petrobras e a empresa sairia incólume, apenas mudando de controle.

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Não se pensou em nenhuma saída. Deixou-se o setor de petróleo e gás à míngua, com a presidente da República se comportando como se não tivesse nenhuma obrigação de resolver o problema.

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Empresas de consultoria calcularam em 1 ponto percentual do PIB os efeitos da Lava Jato sobre uma economia que já vinha despencando desde o ano passado.

Mesmo assim, insistiu-se em um ajuste que busca a quadratura do círculo: quanto mais corta, mais cai a atividade produzindo uma queda de receita maior do que os cortes efetuados. E ainda há quem defenda mais cortes.

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Mais cedo ou mais tarde o governo terá que engavetar o plano Levy e apresentar outro factível, que persiga o equilíbrio fiscal pelos caminhos corretos: sendo prudente nos cortes e ousado na busca do crescimento perdido.

Por tudo isso, e por conta do fato de que a crise também não perdoa grupos de mídia, solicita-se um mínimo de bom senso a esses arautos do mau mercadismo.

Mostra as algemas Zé, por Ademir Teixeira

Exiba a todos, daqui e para o resto do mundo!
Mostre a todos o que se faz aqui no Brasil a homens como você, que prestaram valorosos serviços à pátria; que lutaram com destemor contra a ditadura; que ajudaram a eleger o Lula; que empenharam a sua vida e juventude no afã de mudar um pouco a feia face desse país tão injusto com seus filhos, ajudando a implantar políticas públicas que tiraram milhões da miséria e do desalento".

Janio de Freitas: com e sem jato


Cada dia do novo ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Edson Fachin, vale quase um mês e meio do ministro Gilmar Mendes.

Em 11 dias, Fachin informou o tribunal de que concluíra o seu voto sobre descriminalização do porte de drogas, para o qual pedira vista no julgamento em 19 de agosto. A votação já pode ser retomada.

Gilmar Mendes pediu vista e sustou a decisão sobre financiamento eleitoral por empresas em abril de 2014. Ainda não foi capaz de ter o voto para continuidade do julgamento. Apesar de sua opinião ser conhecida –e já estar derrotada no tribunal, com a companhia dos empresários que financiam campanhas para manipular políticos.

No Tribunal Superior Eleitoral, Gilmar Mendes tem outra atitude típica. Quer uma investigação da Procuradoria Geral da República nas contas da campanha de Dilma Rousseff, suspeitando de recursos provenientes dos truques que a Lava Jato investiga. A defesa argumenta que as contas foram examinadas pelo tribunal e "aprovadas com ressalva". O relator da aprovação: Gilmar Mendes. Mas, acima disso, lembra a defesa, em abril deu-se o "trânsito em julgado" do processo das contas, o que encerrou o prazo para qualquer recurso contrário à sua aprovação.

Por coincidência, ou não, a iniciativa de Gilmar Mendes corresponde, inversamente, a uma não destacada ou mesmo silenciada na imprensa. Como relatora, a ministra Maria Thereza Moura apontou 15 problemas encontrados pelos técnicos do tribunal nas contas da campanha de Aécio Neves. Pediu esclarecimentos, se possíveis. Na segunda-feira passada, Aécio disse que "já foram apresentadas todas as justificativas, coisas eminentemente formais".

Não. Algumas estão definidas como graves. Nada mais adequado, tratando-se de pessoa sempre afinada com a moda, que ao menos um dos problemas refira-se a uma doação da Odebrecht: R$ 2 milhões com registro de recebimento e sem a comprovação do destino alegado (o próprio partido). Também há declaração de menos de um terço da doação feita pela Construbase, alguns milhões cuja entrada os técnicos do TSE perceberam, mas não encontraram na contabilidade –enfim, não apenas "coisas eminentemente formais".

SEM JATO

Outras afirmações de Marcelo Odebrecht impressionaram mais, com motivo real para tanto. Mas, a meu ver, merece a mesma atenção esta outra, que leva também para um futuro a ser verificado: "Eu garanto que sairemos dessa ainda mais fortalecidos". É uma convicção que se conjuga com a recusa a fazer delação premiada e com sua crítica moral a essa prática.

Preso há 44 dias, até ontem, Marcelo Odebrecht só foi ouvido uma vez na Lava Jato. Preso há um mês, completados hoje, José Dirceu só foi ouvido uma vez na Lava Jato. No seu caso, o prazo da Polícia Federal venceu sem que Dirceu fosse ouvido, e o juiz Sergio Moro precisou prorrogá-lo.

À TOA

Não tem sentido a discussão sobre o cabimento, ou não, de ficar com o Congresso o acerto do Orçamento de 2016, que o governo montou e lhe entregou com receitas menores que as despesas. No Congresso, todo Orçamento anual sofre cortes e recebe acréscimos, estes, sobretudo, para servir a interesses de congressistas. Logo, Executivo e Legislativo têm poderes e responsabilidades equivalentes no que venha a ser cada Orçamento. Em caso de dúvida, é só dar uma olhada na Constituição, nos capítulos onde se definem as atribuições de cada um desses Poderes.

A gritaria da oposição é porque dela só sai isso mesmo: gritaria. A gritaria mais geral no Congresso é porque ficou muito mais estreita a margem para os congressistas incluírem as verbas dos seus interesses.

Frase do Dia

O homem é um aprendiz, a dor é a sua mestra.
E ninguém se conhece enquanto não sofreu.

Alfred de Musset

O Senado votou proposta que proíbe a doação de empresas a candidatos.

Ainda assim, a decisão é melhor do que o absurdo que existe hoje e que Eduardo Cunha ameaça "constitucionalizar" na Câmara.

 

Não é ainda esta PEC que foi submetida aos senadores, mas é um sinal evidente de que ela terá dificuldades imensas de sr aprovada no Senado.

 

A decisão ainda não significa a moralização total do processo eleitoral, porque os empresários, como pessoas físicas, poderão financiar candidatos, mas isso é infinitamente menos do que o dinheiro carreado pelas empresas às campanhas.

 

E, embora eu e você tenhamos um voto – igual e tão importante quanto o de qualquer um – não temos milhares nem milhões de reais para dar a um partido ou candidato e ajudá-lo a vencer.

 

A votação, apertada (36 a 31 votos pela vedação das doações empresariais), deixou a nu a posição dos falsos moralistas, que acusam as doações feitas ao PT de serem propina disfarçada, enquanto as suas são puras e castas.

 

Aécio Neves, José Serra, Aloyzio Nunes, Ronaldo Caiado, Cassio Cunha Lima e outras vestais do demotucanato, todos votaram para que as empresas pudessem continuar despejando fortunas nas eleições. (veja aqui como votou cada senador)

 

O argumento era a hipocrisia de que, sem poder doar legalmente, as empresas contribuiriam pelo "caixa-dois".

 

Como se o "caixa-dois" não existisse hoje e, pior, seja encoberto a partir de  doações contabilizadas.

 

O tema vai continuar ardendo, por uma única e simples razão: o fato de Gilmar Mendes ter "sentado em cima" de uma votação já decidida pelo Supremo, que proclama o obvio: empresa não tem ideologia nem cidadania que lhe habilite a ter candidato e influir em eleições.

 

Empresa é feita para ganhar dinheiro e se participa da escolha dos eleitos será sempre para este fim que investirá neste ou naquele.

 

E se o faz é um crédito que espera seja devolvido com juros e muito lucro.

 

É , porém, com todos os limites, a esperança que possa sair algo aceitável do parlamento brasileiro, que tem se tornado um jardim fecundo de podridões.

 

 

Quem sabe, apesar de Cunha e Gilmar, a democracia brasileira possa se livrar do pântano de dinheiro onde se sufocou.