Diário do bolso, por @diariodobolso

"Diário, ontem foi um dia cheio. Cheio de porcaria! Mas por que será que elas aconteceram? Por que será? Olha só:

- O Ronaldinho Gaúcho, meu embaixador do Turismo, foi preso por usar passaporte falso. Embaixador do Turismo preso com passaporte falso já é ruim. Mas onde isso aconteceu? No Paraguai! Pô, aí é vergonha demais! Diário, por que será que tem tanto pilantra ao meu redor? Por que será?

- O Flávio está tentando pela nona vez parar a investigação das rachadinhas. Vai tentando, meu filho, vai tentando. Uma hora a petição cai no colo do juiz certo. Aliás, por que será que tem tanta gente com problema com a lei em volta de mim. Por que será?

- Descobriram que a Bolsofeios, aquela ótima página que atacava o Rodrigo Maia, o STF e uns jornalistas, foi feita no gabinete do Dudu. E aí a página saiu do ar rapidinho. Mas, pô, ela foi registrada a partir do telefone do Eduardo Guimarães, secretário parlamentar do Dudu, e o email do registro da página é eduardo.gabinetesp@gmail.com. Assim dá na vista! Por que será que tanto amador em volta de mim. Por que será? 

- A Regina Duarte assumiu ontem numa cerimônia bacana, onde ela falou de pum e de palhaçada. Mas todo mundo só comenta que ela, a Damares e a Michele pareciam três galinhas d'angola com aqueles vestidos de bolinhas. Por que será que tem tanta gente com mau gosto em volta de mim? Por que será?

- O Olavo está enchendo o saco porque a Regina mandou uns afilhados dele pra rua. Por que será que tem tanto chupim perto de mim? Por que será?

- Pô, Diário, eu preciso de 492 mil assinaturas para fazer o meu partido. Mas até agora a gente já teve 13.977 assinaturas rejeitadas e só 5.499 validadas. Inclusive, sete dos rejeitados eram defuntos. Por que será que tanta falsidade me persegue, por que será?

- E deu certo levar um humorista para falar com a imprensa. Comentaram mais o Carioca do que o pibinho de 1,1%. E nem reparam que o PIB, medido pelo dólar, foi pior ainda. Aí ele teve queda de 4,8%. Um número pior que o do pior ano da Dilma! Por que será que tem tantos números ruins me cercando, por que será?

Olha Diário, aconteceu tanta coisa ruim ontem... Por que será? "

@diariodobolso

Mensagem do dia

Gostei demais desta mensagem. Leiam com atenção e reflitam: 

A fala do corpo, por Silvia Mendonça

O meu corpo é um grande tagarela: fala demais porque sente demais. Tantas vezes percebi-me querendo ser tudo para todos e, então, gritei, irritada: Por que não te calas, ó corpo? Porém, ninguém consegue calar um corpo a não ser com outro corpo: por isso buscamos o amor.

Estou tentando dizer o óbvio, sobre um assunto tão discutido, filosofado, vulgarizado: o corpo fala. Mas há que se ter cuidado com a fala do corpo, pois qualquer gesto mais ousado, mesmo o mais ínfimo, é como um grito. Muitas vezes, grito de desespero, de socorro, de pedido de ajuda. Noutras, de negação, de desistência. Quem presta atenção em nós, se não nós mesmos, deixando-nos levar por um ou outro estado? Depende do gesto, e do intento! A compreensão, quando acontece, vem despida da compaixão. Infelizmente!

Se nem sempre me reconheço em meu próprio espelho, como alguém poderia reconhecer-me, imagem opaca de mim? Também não se deve esperar muito dos outros, pois estes, assim como eu, tem corpos, que falam, gritam - e eu nem sempre ouço, ensurdecida pelos meus próprios gritos. Sinto-me egoísta, incapaz de compartilhar falas, acudir aos gritos que não superam os meus.

Mas o meu corpo não apenas grita: ele dança, e canta a plenos pulmões uma música que só ele conhece. E por mais que eu tente entendê-lo em suas reviravoltas e harmonias, ele me é um ser estranho, bailando em torno do meu espírito - este, sim, o maestro, arranjador e coreógrafo.

É impressionante como o meu espírito consegue dialogar com o meu corpo, sua acolhedora moradia. Então, percebo que o corpo é apenas uma marionete, pois é o espírito que fala. Muitas vezes dos seus desejos, do que necessita para ser compreendido. É o espírito manipulando o corpo, falando de sonhos, de amor, de luta - procurando entender a vida, aos outros, a si próprio.

Tanta reviravolta nos cordéis do corpo, girando-o daqui para lá, de lá para cá, só para dizer que os desejos sexuais são os mais tagarelas. Falam através da força selvagem da libido, mas não apenas como vontade de afirmação do corpo - o espírito, mestre, mais do que o corpo precisa do amor, do aconchego, de sentir-se feliz e amado.

Ouça a fala do meu corpo: podes escutá-la? Ela está cantando a melodia do espírito. Um canto de encantamento, acompanhado por uma harpa mágica, dedilhada pelo coração. Uma fala nem tão compreensível, reconheço, pois vivemos em mundo distintos, mergulhados em nossas diferenças e ousadias. Quem sabe um sentimento "tradutor" possa ajudar-nos na tarefa de tentar que um compreenda a fala do outro, mesmo que a minha seja dialeto; a tua, oficial.

[MENDONÇA, Silvia - 08/07/2008]

O Direito

"Sabem do que são feitos os direitos, meus jovens?

Sentem o seu cheiro?

Os direitos são feitos de suor, de sangue, de carne humana apodrecida nos campos de batalha, queimada em fogueiras!

Quando abro a Constituição no artigo quinto, além dos signos, dos enunciados vertidos em linguagem jurídica, sinto cheiro de sangue velho!

Vejo cabeças rolando de guilhotinas, jovens mutilados, mulheres ardendo nas chamas das fogueiras! Ouço o grito enlouquecido dos empalados.

Deparo-me com crianças famintas, enrijecidas por invernos rigorosos, falecidas às portas das fábricas com os estômagos vazios!

Sufoco-me nas chaminés dos Campos de concentração, expelindo cinzas humanas!
Vejo africanos convulsionando nos porões dos navios negreiros.
Ouço o gemido das mulheres indígenas violentadas.

Os direitos são feitos de fluido vital! Pra se fazer o direito mais elementar, a liberdade,
gastou-se séculos e milhares de vidas foram tragadas, foram moídas na máquina de se fazer direitos, a revolução!

Tu achavas que os direitos foram feitos pelos janotas que têm assento nos parlamentos e tribunais?
Engana-te! O direito é feito com a carne do povo! Quando se revoga um direito, desperdiça-se milhares de vidas ...

Os governantes que usurpam direitos, como abutres, alimentam-se dos restos mortais de todos aqueles que morreram para se converterem em direitos!

Quando se concretiza um direito, meus jovens, eterniza-se essas milhares vidas!
Quando concretizamos direitos, damos um sentido à tragédia humana e à nossa própria existência!

O direito e a arte são as únicas evidências de que a odisseia terrena teve algum significado!"

Texto da Juíza Federal Raquel Domingues do Amaral

Bolsonaro: sem mim a direita não entra no Palácio do Planalto

Bolsonaro continuará no cargo enquanto continuar útil ao projeto do golpe de 2016: banir o campo popular do espaço da negociação política.

O miliciano-em-chefe do país aderiu à manifestação convocada para o próximo dia 15, cuja bandeira principal, descrita em bom português, é "fechem o Congresso!" O que isso significa?

Não creio que seja muito diferente de situações similares que ocorreram no ano passado. Bolsonaro sabe que não tem força para aplicar um novo golpe e instaurar uma ditadura pessoal.

A ampliação do espaço dos generais em seu governo não significa que ele está ganhando ascendência sobre as forças armadas, muito pelo contrário. E, apesar da calculada explosão de Augusto Heleno, a cúpula militar sabe muito bem que lhe convém mais essa "democracia" tutelada e capenga do que uma ruptura aberta com a ordem constitucional.

A jogada de Bolsonaro tem que ser entendida à luz das acomodações dentro da coalizão golpista – aquela que arquitetou a derrubada de Dilma e a criminalização da esquerda e na qual ele, o ex-capitão extremista, estava destinado inicialmente a um papel secundário.

Nas últimas semanas, Bolsonaro acumulou desgastes – culminando na agressão misógina à repórter da Folha de S. Paulo – e voltou a se acenar com a ideia de impeachment. Como fez no ano passado, ele quer mostrar à direita que, sem ele, ela não governa.

A base de que ele dispõe não é irrelevante. São aqueles que são leais ao "mito" e continuarão sendo por muito tempo, não importa o quão catastrófico o seu governo seja. São militares de baixa patente e policiais que se veem "empoderados" com o atual governo. São os que continuam iludidos com Moro – e que, na verdade, se sentem atraídos com o odor distintamente fascista que o ex-juiz confere a seu ministério.

São os milhões que se identificam com o obscurantismo moral da estrela em ascensão do governo, a ministra Damares Alves. (Não dá para desenvolver aqui, mas suspeito que as bases sociais diferentes do pentecostalismo brasileiro, bem como as características próprias do nosso Welfare State gorado, tornam pouco úteis para nós as teorias sobre o casamento entre neoliberalismo e neoconservadorismo importadas dos Estados Unidos.)

E temos também, claro, o grande grupo dos pragmáticos, aqueles que podem se incomodar com a truculência de Bolsonaro e mesmo com a incontinência verbal de Guedes, mas julgam que o principal é avançar no programa de aniquilamento dos direitos e destruição do Estado social.

Esse é o ponto: toda a direita limpinha, incluídos aí Maia, FHC, a mídia corporativa, os banqueiros cosmopolitas, o escambau, pertence ao grupo dos pragmáticos.

Bolsonaro quer colocar sua tropa na rua para dizer a eles: segurem a onda aí, porque sem mim um governo de direita não se sustenta, talkey?

Afinal, o que ele pede para si e para os seus é tão pouco – umas vantagenzinhas, uns esqueminhas, umas impunidadezinhas. E em troca ele faz tanto, faz todo o serviço sujo.

Em quatro – quem sabe oito? – anos, entregará o país que eles querem.

Sim, ao se associar pessoalmente ao ato pró-ditadura aberta do próximo dia 15, Bolsonaro cruzou, pela enésima vez, a linha que separa o admissível do inadmissível. Ouviremos, já estamos ouvindo, as vozes indignadas da imprensa, dos conservadores respeitáveis, dos pró-homens do parlamento.

Mas Bolsonaro continuará no cargo enquanto continuar útil ao projeto do golpe de 2016 – banir o campo popular do espaço da negociação política.

*Luis Felipe Miguel é professor de Ciência Política na UnB.