A salada, por Luis Fernando Verissimo

Vivemos na era da comunicação total. Basta ter um computador — ou melhor (ou pior), um telefone esperto — para ter à mão toda a informação de que se precisa. Já existe a tecnologia para transmitir imagens holográficas de pessoas e coisas, que se materializam, em três dimensões, em qualquer lugar, a qualquer distância, como se estivessem lá.
Nas campanhas eleitorais, já é teoricamente possível o candidato ter contato com o eleitorado sem sair de casa. O chamado “corpo a corpo” não tem mais sentido. Ou tem, mas sem os corpos presentes. O candidato pode estar no palanque de um comício em Maceió e num comício em Porto Alegre ao mesmo tempo, dizendo as mesmas coisas. É ele e não é ele, é sua imagem transmitida e multiplicada.
O próprio comício torna-se uma coisa obsoleta. E diminuem as viagens dos candidatos em aviões que às vezes caem, um risco proporcionalmente maior num país deste tamanho. Tudo isto é fazível, mas ainda é ficção científica e vai demorar para ser realidade. Provavelmente nunca será.
A política irá sempre exigir a presença física do candidato, o aperto de mão, a pele contra pele e o beijo no bebê. Entre o que poderia ser e o que continuará a ser há um abismo, e foi nesse abismo que desapareceu o Eduardo Campos, como já tinham desaparecido outros antes dele e (bate na madeira) desaparecerão outros depois.
A morte de Campos e o alvoroço que causou no seu partido e nos partidos coligados, indecisos quanto à confirmação ou não da Marina Silva como candidata da aliança, mostram mais uma vez a salada ideológica e programática que é a política brasileira. Parte da aliança faz restrições a Marina, o que deve levar seus apoiadores a estranhar que as restrições não tenham aparecido quando ela foi escolhida como segunda da chapa.
Qual é a posição da maioria da aliança quanto às posições da Marina, como sua crítica ao mega-agronegócio, por exemplo? Não se duvida do socialismo sincero da sigla PSB, mas que espécie de socialismo une o resto da aliança? A salada não exclui ninguém, nem o PT, com suas chamadas “alianças espúrias", epitomadas naquela visita à casa do Maluf, uma cena da qual o Lula poderia ter nos poupado.
Nenhum eleitor brasileiro sabe exatamente no que está votando, nessa mistura do pragmatismo dos grandes partidos com o oportunismo dos partidos caroneiros, que não representam nada a não ser sua própria gula por um naco de poder. Uma salada decididamente indigesta.

 


Luis Fernando Veríssimo é escritor