Capitalismo de ouvir falar


Meu post sobre a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) despertou reações iradas. Fui "acusado" de estatista. Eu me recuso a debater esse assunto pelo ângulo da ideologia. Ideologia demais emburrece. Eu quero discutir o caso da CVRD pelos critérios do management e do business na iniciativa privada. Eu não tenho MBA nem estudei em Harvard, mas uma armadilha do destino colocou-me certo dia em contato com as terminologias e os critérios do mundo dos negócios. Foi entre 1996 e 2002, quando pusemos de pé o Universo Online (UOL). Dia sim dia não conversava-se com banqueiros e investidores sobre market capitalization, IPO e coisas assim. Não sei se cheguei a aprender alguma coisa naquela época, mas pelo menos de uma piada eu me lembro. Quando você entrar numa reunião com banqueiros, procure, cuidadosamente, por um pato. Se não encontrar, cuidado redobrado. O pato deve ser você. Como eu disse, topo discutir a privatização da Companhia Vale do Rio Doce, mas só pelos critérios do capitalismo. O que eu sei é o seguinte: se você for o acionista de uma empresa privada e o seu executivo lhe propuser a venda da empresa nas condições em que a CVRD foi vendida, demita-o. Imediatamente. Imagine que você é o acionista principal de uma companhia. Aí aparece um banco para medir o valor de mercado da empresa e organizar o processo de venda. O banco diz que a empresa vale "x" e, em seguida, o mesmo banco participa do consórcio de investidores que compra a empresa por cerca de "x". Poucos anos depois, a empresa está valendo vinte ou trinta vezes "x". Você vendeu o ativo para pagar dívidas e hoje suas dívidas estão maiores do que antes. E o banco comprador fez um dos melhores negócios do mundo, um verdadeiro Nobel de relação custo-benefício. Como eu disse, é no mínimo demissão. No mínimo. Se a CVRD fosse vendida hoje em bolsa ela traria para o caixa do Tesouro recursos suficientes para cobrir quase metade do dinheiro público previsto no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para os próximos cinco anos. Sim, você poderá argumentar que a valorização da CVRD deu-se pelo brilhante management da companhia depois de privatizada. Conversa. A Petrobrás é estatal e a trajetória dela nos últimos anos é tão brilhante quanto. Outro argumento é que a valorização da CVRD deu-se por causa do aumento de preço das commodities, coisa que não se podia prever. Não se podia prever? Mas como, se os encarregados de prever o futuro da empresa na época eram os maiores interessados em comprá-la? Tanto que acabaram comprando. Ah, sim, tem também o argumento de que se o negócio era previsivelmente tão bom teria aparecido no leilão da Vale um monte de gente disposta a fazer um negócio não necessariamente tão bom assim, mas ainda bom, o que teria elevado o preço da ação. Se você acredita nisso, se você acredita que um leilão dessa magnitude rege-se pelas "leis do mercado", então você entende mesmo de capitalismo. Do capitalismo de ouvir falar.

Eu acrescento : As privatizações (?) no Brasil foram mesmo a maior assalto já praticado no planeta.

Alon Feuerwerker

Nenhum comentário:

Postar um comentário