Levantamento feito pelo GLOBO aponta o alto número de processos que filhos de ministros e de ex-ministros da cúpula do Judiciário têm, como advogados, no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Superior Tribunal de Justiça (STJ). O destaque vai para Marcos Meira, filho do ministro do STJ Castro Meira. No STF, ele tem 1.099 processos em tramitação. No tribunal de seu pai, tem outros 882 processos. O levantamento inclui ações, recursos e outros tipos de demandas aos tribunais. O pai não vê problemas éticos e faz questão de não participar dos julgamentos das causas de seu herdeiro.
- Não sei informar sobre a atuação dele, porque faço questão de guardar distância absoluta dos processos nos quais ele atua. E jamais pedi preferência a qualquer dos ministros. Quando Marcos está envolvido, eu me afasto. Eu não posso porém impedir que ele seja advogado, o que ele fazia antes de eu chegar ao STJ e provavelmente continuará fazendo depois que eu sair - diz Castro Meira.
Marcelo Lavocat Galvão é filho do ex-ministro do STF Ilmar Galvão. No tribunal onde o pai atuou, Marcelo tem 88 ações em curso. No STJ, assina outras 1.098.
Não há nenhuma diferença no tratamento. Basta ver os resultados dos julgamentos
- Meu pai já se aposentou há seis anos. Não há nenhuma diferença no tratamento dos advogados por ser filho de ex-ministro. Basta ver os resultados dos julgamentos. Como qualquer outro advogado, os filhos às vezes ganham e às vezes perdem. Seria menosprezar a responsabilidade, a competência e a ética dos ministros imaginar que eles mudariam algum resultado por que o advogado é filho de um colega - pondera o advogado.
Carlos Mário Velloso Filho, herdeiro do ex-ministro do STJ e do STF Carlos Velloso, acumula 658 ações no STJ e 200 no STF.
- Nunca vi nenhum problema nele atuar no Supremo. Meu filho tem mais de 20 anos de advocacia, com um comportamento ético esplêndido, muito acentuado, graças a Deus - argumenta o ex-ministro.
O próprio Carlos Velloso, hoje advogado no mesmo escritório do filho, tem cinco ações no STJ. No Supremo, ele ainda não atuou em respeito à quarentena. Em janeiro, completaram três anos de sua aposentadoria. Agora, ele avisa que começará a defender causas no STF.
- Fui ministro do STJ 19 anos atrás. Já não existe praticamente nenhum ministro do meu tempo. Não tenho tratamento privilegiado. Os ministros são pessoas éticas, corretas - diz Velloso.
A versão dos outros advogados, filhos de pessoas comuns, é outra. Eles costumam reclamar que os sobrenomes pomposos dos concorrentes costumam contar na hora de escolher um profissional. Nem sempre isso funciona na prática. E há queixas de privilégio no atendimento pelos ministros.
Conheço vários filhos que se utilizam do parentesco na hora de atuar, mas cansei de ver os pleitos indeferidos também
- Conheço vários filhos que se utilizam do parentesco na hora de atuar, mas cansei de ver os pleitos indeferidos também. Tem julgadores que, para fazer questão de manter certa independência, votam contra. É um tiro que pode sair pela culatra - conta um advogado que atua em tribunais superiores e preferiu não se identificar.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) não vêem problemas na prática:
É possível que haja tráfico de influência, mas a gente não pode generalizar
- Como a atuação profissional de ex-ministros e de parentes tem autorização legal, a OAB não pode entender esses atos como falta disciplinar - afirma o presidente da ordem, Cezar Britto.
- É possível que haja tráfico de influência, mas a gente não pode generalizar. Se houver algum indício, que se denuncie - diz o presidente da AMB, Mozart Valadares, completando: - Como há autorização legal e constitucional, não há muito o que fazer no campo ético.
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