Teste de Q.I

A brigalhada pelo comando dos fundos de pensão faz lembrar uma história que conheço há mais de trinta anos. Uma piada de centro acadêmico. E nem é tão piada assim. Dois líderes de facções adversárias conversam para tentar montar uma chapa de consenso na entidade. Estão num impasse. Quem fará a maioria? Um dos dois chefes políticos tem a ideia. “40% para vocês, 40% para nós e o resto para os independentes.” O outro sorri. “Ótimo. A gente interrompe a conversa agora e voltamos a falar amanhã de manhã. Eu trago a lista dos meus independentes e você traz a dos seus.”

Minhas homenagens ao eterno Centro Acadêmico “Oswaldo Cruz”, escola insubstituível de política e jornalismo. Toda vez que leio em algum lugar sobre a necessidade de “não ceder às pressões dos partidos” e de “preencher com técnicos” as vagas que dependem de indicação arbitrária do poder eu me recordo da historinha e ajusto o ceticismo um grau acima. Para o meu juízo de observador (crítico?) dos fatos, sempre que alguém comparece à imprensa argumentando que determinada posição estatal deve estar blindada contra indicações políticas eu desconfio de que o sujeito deseja mesmo é defender as suas próprias indicações políticas -e naturalmente resistir à ocupação de espaços pelos adversários. Modéstia à parte, a taxa de acerto nessas análises tem ficado perto dos 100%. Não por eu ser particularmente esperto. Talvez por ter tido a oportunidade de um dia montar uma chapa de centro acadêmico.

Uma arte na luta política é apresentar objetivos partidários (de uma parte) como a expressão do interesse geral. Daí que os meus apaniguados sejam sempre “técnicos” e “competentes”. Já os seus, se você estiver na rinha comigo, são necessariamente “políticos” e comprometidos com o “fisiologismo”. Entre nós brasileiros, aliás, ficar conhecido como alguém que combate o fisiologismo é uma coisa muito boa. Você ganha o direito de cuidar dos seus próprios interesses fisiológicos sem ser incomodado.

Viu gente brigando por causa de um cargo qualquer no governo? Faça o teste de “QI” (quem indica). Com essa medida simples, você evita cair em conversas que só deveriam enganar os ingênuos.

Eles de novo

Por falar em explorar a ingenuidade alheia, o governo planeja relançar o debate sobre a reforma política. A probabilidade de ela avançar não é grande, mas convém estar alerta. Como aprendi com o meu bom amigo Fernando Rodrigues, toda vez que a turma se move para mudar o sistema político há uma chance enorme de a mudança ser para pior.

Agora não é diferente. A proposta do governo para a reforma é uma estrovenga com a finalidade de limitar ainda mais o poder e o controle do eleitor sobre os políticos. Se ela passar tal como foi articulada no Palácio do Planalto, as cúpulas partidárias é que vão definir quem será eleito para o Legislativo (federal, estadual ou municipal) e o partido do governo terá sempre mais dinheiro do que a oposição para fazer campanha eleitoral. E se o detentor de mandato não estiver de acordo que o seu voto seja negociado com o Executivo pelos caciques partidários pode perder a legenda (ou uma vaga viável na chapa) na eleição seguinte.

Sobre a reforma política, uma curiosidade. O sistema defendido pelo PT, de lista fechada (com financiamento exclusivamente público) e cláusula de barreira, é vendido no mercado das ideias como a solução contra a dispersão partidária. Pois em Israel o voto é em lista fechada nacional e existe uma cláusula de barreira. O eleitor vota no partido e a legenda que não obtém um mínimo de votos fica fora do Knesset (Parlamento). E o principal problema do sistema israelense é justamente a dispersão partidária.

Por uma razão simples. Lá, como aqui, o eleitor tem preferido espalhar o voto por um número maior de legendas do que seria do agrado dos candidatos a monopolizar a política. Dos bem-pensantes. E ali, do mesmo jeito que aqui, ainda não encontraram um modo de obrigar o eleitor a votar de uma maneira mais conveniente aos bem relacionados. Por isso ali persiste, e se agrava, a dispersão. O que impõe complicadas negociações para formar um governo, dado que o sistema é parlamentarista. Pelo menos isso, o parlamentarismo, parece que desta vez aqui não vão querer propor. Parece.
POR ALON FEUERWERKER @

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