A presidente abandona a cerimônia, cobra seus ministros de forma enérgica e entra pesado no jogo político do Congresso para conseguir fazer de seu candidato o presidente da Câmara
Sérgio Pardellas – Istoé
A três dias da posse, sem fazer alarde, a presidente Dilma Rousseff sacou o telefone celular da bolsa e ligou para o presidente do PCdoB, Renato Rabelo. Na pauta da conversa, a candidatura do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) à presidência da Câmara. "Vocês não podem insistir com o nome do Aldo. Precisamos de consenso neste momento. Querem que isso seja interpretado como um movimento de oposição?", questionou a presidente. Começava ali a operação comandada com mãos de ferro por Dilma destinada a mudar os rumos da eleição da Câmara, que prenunciava uma disputa fratricida de consequências imprevisíveis entre integrantes de partidos da base aliada ao governo. Desde então, os candidatos avulsos saíram, um a um, do páreo. Os resultados práticos da ação direta da presidente foram colhidos na última semana. Na quinta-feira 20, o candidato do PT e do governo ao comando da Câmara, deputado Marco Maia (RS), recebeu o apoio de dez partidos, entre eles o PCdoB, de Aldo e Renato Rabelo. Pela primeira vez, desde 2003, a eleição na Casa caminha para uma candidatura única. Para se ter uma ideia da dificuldade de consenso na Câmara, nem o peemedebista histórico, ex-deputado Ulysses Guimarães, expoente da redemocratização no Brasil, conseguiu ser aclamado pelos colegas. "Dilma teve um papel fundamental para a unidade na Câmara. A opinião dela pesou e as bancadas foram naturalmente convergindo para o consenso", atesta Rabelo.
No episódio específico da sucessão na Câmara, a atuação da presidente Dilma revelou outra face de seu já conhecido perfil essencialmente executivo de quem estabelece metas, cobra resultados e fixa prazos. Mostrou também que, quando necessário, ela saberá ter jogo de cintura político, característica pouco presente nos tempos de Casa Civil, mas bastante exercitada durante a campanha eleitoral. De acordo com parlamentares envolvidos nas negociações, Dilma teve muita habilidade, por exemplo, ao conquistar o apoio do PR a Marco Maia, formalizado em jantar na noite da terça-feira 18. Na semana anterior, Dilma havia travado um longo bate-papo com o ministro dos Transportes e presidente da legenda, Alfredo Nascimento. A reunião foi considerada fundamental para o acordo e deixou órfã e isolada a candidatura do deputado e empresário Sandro Mabel (PR-GO), que desistiu da disputa.
Para atrair o PSB, Dilma também conversou com o presidente da legenda, o governador pernambucano, Eduardo Campos, que nos últimos dias se transformou num dos principais soldados da candidatura de Marco Maia. Rendeu frutos. Com a bancada socialista quase toda engajada na campanha do petista, coube ao ministro da Casa Civil, Antônio Palocci, procurar o deputado Júlio Delgado (PSB-MG) para demovê-lo da ideia de se lançar candidato. A estratégia incluiu ainda adiar as nomeações para cargos do segundo escalão e estatais para depois da eleição e acenar para partidos menores, como o PTB e o PSC, que também terão garantido seu lugar ao sol durante a partilha.
Deu certo. Com a candidatura consensual de Maia na eleição marcada para 1º de fevereiro, o governo sacramenta o acordo de revezamento entre PT e PMDB e afasta de uma vez por todas a possibilidade do surgimento de um aspirante francoatirador, oriundo do chamado baixo clero da Casa, como em 2005. Na ocasião, o deputado Severino Cavalcanti (PP-PE) saiu vitorioso e deixou o governo em permanente estado de insegurança política até a sua renúncia por envolvimento com o escândalo do mensalinho. "É bom iniciarmos o governo com a base em torno de um candidato único. Assim construímos uma pauta comum. A decisão também respeita a proporcionalidade, que era tradição. O partido com o maior número de deputados vai presidir a Câmara, respeitando a vontade popular", comemora o líder do PSB na Câmara, Rodrigo Rollemberg (DF).
EXPEDIENTE
Dilma determinou que ministros não podem usar
jatinho da FAB para ir para casa nos
fins de semana
Nos últimos dias, os parlamentares tiveram um aperitivo do que poderá vir a ser o relacionamento com a presidente Dilma durante os próximos quatro anos. Já os ministros, em sua maioria egressos do governo Lula, aos poucos vão tentando se acostumar com o novo modelo de gestão. Logo nas primeiras reuniões, eles receberam determinações que podem soar desagradáveis para quem não está acostumado com o trabalho duro. Uma delas: agora, as sextas-feiras são consideradas dia de expediente normal. Não por acaso, a primeira reunião ministerial ocorreu na sexta-feira 14. Outra mordomia usufruída a torto e a direito pelos antigos ministros está expressamente proibida por Dilma. A partir deste mês, nenhum deles poderá usar jatinhos da FAB para desfrutar do fim de semana em seu Estado de origem. No governo Lula, os ministros costumavam marcar reuniões sem nenhuma relevância em suas cidades, às sextas ou segundas-feiras, somente para se valer do privilégio. Agora quem não tiver compromisso oficial agendado terá de pegar o avião comercial.
ESCOLHIDO
Com o apoio de Dilma, pela primeira vez em décadas
Marco Maia pode ser candidato único na disputa
pelo comando da Câmara
DE FORA
Antes de assumir, Dilma negociou com o PCdoB
para que Aldo Rebelo não fosse candidato
à presidência da Câmara
A presidente Dilma também promete não deixar barato se algum integrante do primeiro escalão destoar do script combinado. Ela não gostou, por exemplo, do entrevero criado pelo ministro da Saúde, Alexandre Padilha, com o PMDB em torno da direção da Funasa. Chamou-o em seu gabinete e disse que não admitiria "cavalo de pau" logo no início do governo, numa alusão às mudanças feitas na pasta sem antes consultá-la. Padilha, que conhece bem a presidente, engoliu a bronca em seco. Mas sabe que a crítica não foi de cunho pessoal. Trata-se simplesmente do modo Dilma de governar. E obedece quem tem juízo.
Tomara que não estejamos alimentando os sonhos de uma ditadura (ditadora).
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