"Os podres poderes fortalecem os argumentos pela indiferença e o não envolvimento na política. É o moralismo abstrato e ingênuo que oculta a ignorância e dissimula a leviandade egoísta dos que não conseguem pensar para além do próprio bolso. O analfabeto político não sabe que sua indiferença contribui para a manutenção e reprodução desta corja de ladrões que, desde sempre, espreitam os cofres públicos, prontos para dar o golpe à primeira oportunidade que surja. Os analfabetos políticos não vêem que lavar as mãos alimenta a corrupção".No passado, escravizava-se com grilhões nas senzalas. Hoje, a moderna tecnologia estabeleceu formas sofisticadas de escravidão - o uso da eletrônica para mantê-lo alienado, indiferente, motivado por outras sensações.
Antonio Ozaí da Silva , escritor e Docente na Universidade Estadual de Maringá
(Artigo completo na revista ESPAÇO ACADÊMICO, março de 2004)
No passado, escravizava-se com grilhões nas senzalas. Hoje, a moderna tecnologia estabeleceu formas sofisticadas de escravidão - o uso da eletrônica para mantê-lo alienado, indiferente, motivado por outras sensações.
Toda a ciência da indução é usada para paralisar os cérebros. Milhões de pessoas passaram a delegar o seu hábito de raciocinar. Não pensam. Deixam que a máquina pense por elas. E seguem seus passos, posicionam-se em função da carga de informações servidas com o sabor dos doces mais apetitosos.
Faço esse preâmbulo ao apresentar minha opinião de hoje, severa, mas incontestável: o analfabeto político é um virtual criminoso social.
Postei um vídeo no
YOU TUBE e escrevo a propósito da repercussão da matéria sobre a necessidade de mobilização dos mais velhos, os alvos centrais da "otimização de custos" dos serviços públicos, aqueles que são vistos como uma ameaça social porque o aumento da expectativa de vida, algo altamente enternecedor, é apresentado com as tinturas do terror.
Muitos leitores me escreveram sugerindo que mobilizássemos para a criação de um partido de aposentados - que já existiu, sabe Deus como, até ser "comido" pelo PTB de Roberto Jefferson para somar votos e garantir os valores robustos do dinheiro público, através do Fundo Partidário.
Despolitização programada como grilhões da modernidade
Penso, no entanto, que a questão é mais ampla. O grande problema é a despolitização do povo, essa tendência cada vez mais ostensiva de virar as costas para a atividade política, deixando que ela seja privativa dos profissionais da lambança, da corrupção, das propinas, do exercício do mandato em causa própria.
A máquina do sistema trabalha com esse propósito, inoculando na esmagadora maioria dos cidadãos a idéia de que "todos os políticos são iguais" na prática de repetidos atos delituosos.
Com essa versão consolidada, o cidadão eleitor torna-se presa fácil da malta de políticos bandidos, destituindo-se dos critérios críticos que sinalizariam diferenças protuberantes entre mandatários.
Há ainda homens de bem na vida pública. Serão menos a cada eleição, na medida em que os cidadãos torcerem o nariz para a política ou sufragarem qualquer um, sem nenhum grau de exigência.
Pautados por uma máquina inescrupulosa de fazer cabeças, os cidadãos vão sendo dominados no esplendor de perdidas ilusões. E são cada dia levados a maiores sacrifícios, em função de sua ignorância política.
Pagamos por serviços privados pela insuficiência do Estado
Veja que coisa mais patética: pagamos altos tributos, em todos os níveis, para desfrutar de algumas obrigações de Estado, como educação, saúde pública e segurança. No entanto, somos forçados a enviar nossos filhos para escolas particulares, contratar onerosos planos de saúde e pagar a empresas particulares de segurança para suprir a deliberada deficiência das forças policiais.
Esses três serviços, que são da essência das responsabilidades dos governos, que representam parcelas consideráveis dos orçamentos, são hoje, paradoxalmente, os melhores negócios da atividade privada.
Os cofres das escolas e faculdades particulares estão abarrotados. Há redes de ensino superior que já ultrapassaram nossas fronteiras. A Estácio virou Estácio Participações e é controlada por fundos de investimentos através da GP Investments, com ações na Bolsa, 205 mil alunos nos cursos de Graduação e ramificações em 20 estados e países vizinhos.
Na área da saúde, que desfruta de um dos maiores orçamentos públicos, a qualidade dos serviços continua ruim, com algumas exceções, favorecendo a pujança dos planos privados. Aí, se aprofundarmos, as responsabilidades são fomentadas por um ambiente privatizante que seduziu a grande maioria dos médicos.
Uma oferta da Prefeitura do Rio de Janeiro, através de uma organização terceirizada, de salários que podem chegar até R$ 15 mil não tem sido suficiente para atrair a uma quantidade suficiente de profissionais. Segundo o presidente do Sindicato dos Médicos, Jorge Darze, seus colegas rejeitam as 40 horas semanais e isso impõe uma conversa sincera, a que nos dedicaremos em outra oportunidade, esperando ter a compreensão e ajuda dos muitos profissionais da saúde que leem nossas colunas.
De qualquer forma, estamos num país que exacerba ao extremo as pretensões pessoais, como tenho dito. Numa ambiente em que a regra é o sucesso individualizado, tudo é possível. Difícil será imaginar alguém, em qualquer ramo de atividade, impregnado do espírito público, do despojamento, que faça do "compromisso social" mais do que uma linguagem do marketing empresarial.
Distorção grave vem se agravando na área de segurança. Embora existam pessoas que exercem esses serviços com a observação de certos valores morais e a convicção de que eles são indispensáveis numa sociedade em que as forças públicas não são capazes sequer de elucidar homicídios, há também outras, as que cresceram mais rapidamente, com poderosa representação política, que jogam pesado na gestão de um poder policial paralelo.
Muitas das empresas de segurança são propriedades de policiais, civis e militares, que usam terceiros, inclusive suas esposas, para escamotear sua presença. Como pode um oficial da PM ou um delegado de Polícia resolver na sua cabeça essa ambiguidade profissional?
O certo é que os Estados cobram impostos de toda natureza para nos prover de segurança. E, no entanto, como o máximo que conseguem oferecer, quando oferecem, é uma "sensação de segurança", temos de tirar do bolso para o pagamento da proteção privada, que só no Rio de Janeiro tem hoje mais de 100 mil homens, entre os das empresas legais e os informais.
Bom, tudo isso se inclui numa agenda que só será viável na medida em que tivermos capacidade de mobilizar, de unir, de politizar.
Esse desafio, exponho também no nosso ENCONTRO MARCADO do You Tube de hoje.
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