Em lugar algum
Certa vez me vi perdido, sem referencial de nada, sem me dar conta para onde era o Norte ou o Sul. Era dia, mas me parecia noite escura, sem lua e sem estrelas para olhar, para contar, para fazer um pedido ou dividir um medo beirando o pavor. É ruim quando não se sabe onde está ou para onde pode ir e todas as lembranças são apenas aquelas do lugar de onde estamos vindo, mais nada. Queria voltar à origem e não sabia o caminho. Faltou-me o fôlego e havia um aperto enorme no peito, como a pressão de uma angústia que sufoco aos poucos. Depois de um tempo, recompus as emoções, assumi o adulto que já era e assumi o controle que permite o raciocínio lógico. Era preciso contar até três e havia todo o tempo do mundo para contar até muito mais. Perguntar não podia, porque não havia a quem. Aproveitei para fazer uma profunda reflexão e mergulhei na paz aparente de uma meditação que me fez companhia. Trouxe para o campo de uma visão imaginária as imagens dos rostos amigos e, mais ainda, daqueles a quem queria especial bem. O pavor parecia sumir e as primeiras pontinhas de coragem me enchiam de força. A saída estaria em algum lugar, era tudo uma questão de tempo. Lembrei que meus limites se haviam ampliado quando pensei em desistir no meio de um desafio e justo ali fui vítima de um revés que quase me deixou por terra. Juntei os restos de força que tinha e fui à luta. Quando dei por mim, estava com a sensação de haver vencido duplamente: pela força com que havia vencido o desânimo e pelo ideal que me havia conduzido à glória. Desde então, e até aquele momento, pequenos dissabores, pequenos, médios ou grandes problemas m, eram apenas coisas a serem resolvidas, e porque não aquele medo? Estava ali levado por uma dessas fugas tolas. Aquelas que arrastam a gente para cada vez mais longe das grandes decisões. Chegamos a pensar que fugir de um problema é resolvê-lo temporariamente. Quem consegue fugir da própria sombra? À noite? À noite as sombras estão dormindo, ao menor sinal de qualquer luz, lá está ela, fiel como sempre, a seguir adiante - quando o sol está às nossas costas - como um fiel escudeiro ou a nos seguir, se temos a luz de frente. Era uma daquelas fugas cheias de angústia por conta de recordações sem retorno. De repente, uma luz! Não era do céu, não era divina, não era milagre. Uma luz dessas que alguém acende quando nos toca o rosto, quando nos sorri sem cobranças, quando pura e simplesmente chega, senta ao nosso lado dizendo apenas "oi!". De repente, havia luz e depois o luar, o sol do dia seguinte e as paisagens eram coloridas, haviam sons de boa vizinhança, de vozes conhecidas, de lugares peculiares. Sons da volta, de mãos acenando, lenços agitados no ar, alegria de todo retorno tão ansiado. De repente, estava tudo muito mais bonito do que antes. As tristezas haviam ido embora, as mágoas haviam sumido e palavras doces diziam o quanto éramos bem-vindos. O importante foi não ter perdido a esperança no amanhã seguinte. Não ter perdido a fé na capacidade e na força que existe dentro de nós, de mesmo sofrendo injustiças, ter coragem de ser bom. Aqueles olhos azuis não me faziam mais falta nem me despertavam mais sadias inspirações. Descobri que haviam olhos negros, de mistérios profundos, que poderia tentar desvendar e os castanhos reais, tão cheios de ternura. Não saber para onde ir é a melhor forma de se chegar a um lugar onde nunca estivemos e aí descobrir, como descobri certa vez, que existe uma casa no fim do mundo, quando me decidi por conhecer John O´Groats, no extremo norte na Escócia. Quando me disseram que ali era nenhum lugar e que não havia nada para ver, insisti para chegar até lá e foi essa decisão que me levou a descobrir que entre nada e lugar algum existe um mundo incrível para se descobrir sozinho.
A. Capibaribe Neto
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