por Marcos Coimbra


Governo e Crise

Dilma atravessou a crise causada pelas denúncias contra Antonio Palocci do mesmo modo que seus antecessores passaram pelas suas. No fundo, pouco houve de surpreendente na que ela viveu.
São raros os momentos em que tudo anda bem ou mal para qualquer governo. Os primeiros costumam ocorrer apenas nos meses iniciais, quando está no chamado “período de graça”. Ninguém se queixa, ninguém cobra, todos aplaudem. Sua bancada é dócil e vota disciplinadamente. A imprensa não procura assuntos para alfinetá-lo.
Tudo tende a se deteriorar no fim. Que o diga José Sarney, que passou seu quinto ano isolado no Palácio do Planalto, alvo de uma rejeição quase unânime. Ou Fernando Henrique, com menos de 20% de avaliações positivas ao longo de 2002.
É difícil dizer quanto dura a fase boa. Já tivemos casos em que, ao longo de todo o primeiro ano, prevaleceu uma alta tolerância da opinião pública e do sistema político para com o novo governo. Foi o que aconteceu com Lula em 2003. Era uma experiência tão nova, um presidente tão diferente do padrão, que a lua de mel chegou a dezembro.
Os partidos derrotados estavam atordoados e não tinham traquejo para desempenhar o papel de oposição, depois de tantos anos acostumados ao outro lado da mesa. O PT estava com ele.
Com seu antecessor não havia sido igual. Como ex-ministro da Fazenda, tendo assumido o protagonismo do governo Itamar em seus últimos meses, a posse de FHC não representou descontinuidade e não lhe trouxe crédito para começar a administrar com a condescendência da sociedade.
Desde o início, era encarado com desconfiança por parte relevante da opinião pública: com seis meses no cargo, apenas 30% avaliavam o governo como ótimo ou bom, segundo o Datafolha, em pesquisa de junho de 1995.
(Para não falar de Collor, cujo período de graça durou algumas horas, entre a cerimônia de transmissão do cargo e o discurso em que anunciou o confisco da poupança.)
Talvez Dilma seja uma mistura de modelos. Por um lado, é diferente (no mesmo sentido de Lula), por ser mulher e não ter um perfil convencional, não se encaixando no estereótipo da “política profissional”.
Por outro, no entanto, se propôs, na campanha, a fazer um governo de continuidade, montou sua equipe com uma maioria de caras conhecidas e não fez, nos primeiros meses, nada que representasse ruptura.
Sua lua de mel, portanto, pode ser menor que a de um e maior que a do outro. Em quanto?
Pelo que se lê na imprensa, o caso Palocci terá sido, para ela, o fim dessa etapa. A crer em seu coro quase uníssono, de agora em diante, enfrentará problemas crescentes. Perdeu a iniciativa do jogo político e só lhe resta esperar até que sua popularidade comece a cair.
Será? O golpe na imagem do governo terá sido tão fundo? O caso atingiu uma proporção tão grande da população, de maneira tão severa, que não cicatrizará nunca mais?
Parece improvável. Pelo que conhecemos de nossa sociedade, ministros com problemas são coisas que não afetam o governo inteiro. Mas é razoável supor que alguns admiradores tenham se afastado da presidente.
Especialmente os recentes, os “agradavelmente surpresos” com seu desempenho e que diziam estar encantados com ela, depois de a terem rejeitado a vida inteira. É ruim perdê-los, embora o mais provável é que a abandonassem de qualquer maneira, mais cedo ou mais tarde.
Esse “dilmismo” de verão, que contagiou classes médias e jornais, não tinha cara de ser duradouro. Logo, logo ia acabar.
Ou seja, no cômputo final, o prejuízo da crise terá sido apenas antecipar algo que aconteceria inevitavelmente. Por mais agradável que seja para quem está no poder, a unanimidade costuma ser artificial e é sempre passageira.

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