Marina Silva concluiu o ciclo dela no PV em situação de claro
isolamento. Saiu do partido levando com ela um punhado de fiéis. Os
detentores de mandato preferiram a cautela, pois caso deixem a sigla
ficam sujeitos a perder a cadeira.
No fim das contas a máquina do PV prevaleceu.
É injusto com a ex-ministra e ex-senadora acusá-la de ter pretendido
adonar-se do partido. Pediu apenas regras democráticas para a eleição
de dirigentes e escolha de eventuais candidatos.
Era um pedido prudente, dada a possibilidade sempre real de os donos
do cartório usarem o potencial eleitoral de Marina para, no fim da
trilha, negociarem a cabeça dela e entregarem o troféu numa bandeja
para o governo, ou mesmo para o PSDB.
Nas nossas regras quem deseja ser candidato precisa estar filiado ao
partido um ano antes. Assim, o PV teria a opção de vender ao governo
ou aos tucanos a degola de Marina, e ela não teria a opção de reagir a
posteriori.
O sistema partidário brasileiro transformou-se nisto: uma federação de
máquinas, abastecidas por dinheiro público e dominadas por caciques
incontestáveis, um oligopólio paraestatal.
É impensável o sujeito entrar num partido para disputar, para colocar
a possibilidade de uma alternativa. Será expelido antes de esboçar o
primeiro passo.
Assim, Marina, que tem seu legítimo projeto, precisou sair.
A nova trajetória dela carrega belas possibilidades e pelo menos uma
fraqueza estrutural. As possibilidades vêm do espírito do tempo. O
ambientalismo ocupa neste início de século 21 o espaço dogmático, é
quase uma nova religião.
Na prática, Marina nem precisa se preocupar em fazer a apologia dela
própria, o mundo já cumpre esse papel.
Se Luiz Inácio Lula da Silva preencheu no final do século 20 o locus
do promotor da justiça social, Marina ocupa o lugar da portadora da
utopia do momento. A verde.
Os operadores hegemônicos das ideias trabalham para ela, na prática.
A fraqueza estrutural, até agora, é Marina sistematicamente encontrar
dificuldades intransponíveis quando procura materializar uma aliança
social que a apoie estrategicamente.
Marina tem com ela as simpatias difusas, mas lhe falta articulação.
Faltou-lhe quando no governo. A proposta dela, de uma transversalidade
que amarrasse horizontalmente as políticas públicas, acabou batendo de
frente com o então desenvolvimentismo da mãe do PAC.
Faltou-lhe na campanha eleitoral, quando não quis -ou não foi capaz-
de usar no segundo turno o capital político acumulado no primeiro.
E faltou-lhe agora, quando abriu a batalha contra os donos do PV e perdeu.
O marinismo pode argumentar, e haverá alguma lógica nisso, que até
agora Marina sempre esteve constrangida por pertencer a arcabouços
políticos sobre os quais não tinha efetiva liderança.
No governo do PT a que ela serviu, quem mandava eram o PT, Lula e,
depois, Dilma. No PV, como se viu, os donos estavam bem estabelecidos.
A dúvida é sobre a campanha eleitoral. O "se" na História não tem
muito valor, mas é possível que mais protagonismo no segundo turno
tivesse reforçado o papel de Marina no cenário político, e no próprio
PV.
Mas por que Marina sistematicamente bate na trave quando se coloca o
desafio da articulação? Talvez por uma razão política.
O único momento recente em que Marina conseguiu deixar o cercadinho do
fundamentalismo ambientalista foi na reta final do primeiro turno
presidencial, quando recolheu um amálgama de votos conservadores e
votos ansiosos por uma política mais limpa.
Antes e depois, aceitou ser empurrada para o cercadinho da política verde.
Que recolhe simpatia difusa, mas encontra uma barreira quando precisa
responder aos desafios da vida prática. Quando precisa transformar o
rejeicionismo em alternativas viáveis para o andamento da civilização.
Talvez Marina Silva esteja precisando publicar uma Carta Verde aos
Brasileiros.
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