Ranking reformulado e atualizado da corrupção nos partidos


 Rodrigo Travitzki, via Blog do Digão
Anda circulando pelo Facebook um ranking de corrupção nos partidos, alvo de muita discussão, críticas e elogios. Como é comum na internet, algumas pessoas tecem sua análise crítica de dez segundos, “curtem” ou não, e logo passam pro próximo tópico. No entanto, a pressa é inimiga do esclarecimento. Ler é diferente de navegar. A mesma internet que permite aos antigos boatos circularem como se fossem recentes descobertas científicas, também é um espaço que pode ser usado para se esclarecer as coisas e buscar um pouco de objetividade no conturbado mundo da informação. O processo que levou a este post é um interessante exemplo desta dupla função da rede mundial de computadores.


Bem, para quem gosta de ver apenas os resultados, aí vai o ranking que acabei de produzir, com base naquele que foi divulgado no Facebook e outras informações. 
Para quem quiser saber de onde veio isso, eu explico:

Em primeiro lugar, esclareço que, como muita gente, trato a política como trato o futebol. A diferença é que não torço pra time nenhum. Gosto de ver um jogo sem preconceitos. Ou pelo menos me esforço pra isso, porque a mente é uma máquina preconceituosa por natureza.



Pois bem, quando o ranking apareceu “no meu face”, dei uma olhada, gostei e “compartilhei” com meus amigos, como é de praxe nas redes sociais. Por curiosidade, fui ver os comentários e neles havia uma rica multiplicidade de ideias, opiniões e resmungos. Evidentemente, as pessoas eram contra ou a favor dependendo de seu partido político predileto, assim como a qualidade do juiz depende do time para o qual se torce. Mas havia também alguns comentários mais inteligentes, criticando pontos significativos do ranking e questionando sua veracidade.



Com receio de ter enviado uma lorota aos amigos, fui procurar a fonte original do ranking e em menos de dez minutos descobri que ele datava de 2007 e tinha como base a tese de doutorado que o juiz Márlon Reis desenvolveu na Universidade de Zaragoza, Espanha. Isto porque, infelizmente para nossa “democracia”, o TSE não produz estatísticas desse tipo, embora tenha as informações. Isso quer dizer que, para realizar sua pesquisa, Márlon Reis teve que analisar os dados processuais de cada caso. Bom, isso me deixou mais tranquilo, porque de fato parecia uma fonte confiável. A coisa poderia ter parado por aí, mas seja por amor à pátria ou por falta do que fazer, resolvi ir um pouco mais além. Havia pelo menos duas coisas nos comentários que me estavam incomodando. 


Uma é que o ranking se baseava em números absolutos, então um partido com 600 políticos eleitos e 3 cassados poderia ser considerado mais corrupto do que um partido com 2 políticos eleitos e ambos cassados. Muita gente fez essa observação, revelando que mesmo as análises críticas de dez segundos podem ser feitas com inteligência, felizmente. O segundo incômodo é que, como observou um dos “comentaristas”, havia no ranking de 2007 um partido que só foi criado em 2011 (o PSD), o que punha em risco todo o resto, porque as informações são como maças: basta uma podre para que todo o cesto seja jogado no lixo. Para resolver esses dois incômodos, tive de recorrer aos recursos mais trabalhosos que a internet proporciona. Em primeiro lugar, para compreender como uma tese de doutorado poderia citar um partido que ainda não existe, dei uma boa olhada no dossiê, mas nada encontrei que pudesse ajudar. Com uma esperança quase ingênua, resolvi enviar um e-mail ao autor da tese pedindo esclarecimentos a este respeito. Para minha surpresa, recebi a resposta no mesmo dia, o que me motivou a escrever este “longo” post e terminar o que havia começado. Márlon me explicou que o PSD, partido que o Kassab criou ano passado, não é o mesmo que aparece no dossiê, trata-se de um partido homônimo que foi extinto em 2003. Muito bem, um incômodo a menos. Para resolver o segundo incômodo, por sua vez, eu precisava de alguns números. No caso, o número total de políticos eleitos em cada partido entre 2000 e 2007, período ao qual a pesquisa se refere.


Isso me pareceu muito difícil de conseguir, então voltei ao dossiê em busca de alguma dica. Percebi que a grande maioria dos políticos cassados estava nas prefeituras, como se vê na tabela abaixo.

Partindo dessa informação, procurei algum site conhecido que me dissesse quantas prefeituras havia por partido naquela época. Acabei chegando numa reportagem do G1 de 2008, o que levou talvez pouco mais de meia hora. A reportagem informava o número de prefeitos eleitos por partido em 2004, o que estava bastante próximo do que eu queria. Com os números em mãos fiz a tabela abaixo, a partir da qual pude construir o ranking que está no início do post. 



PartidoPolíticos cassados entre 2000 e 2007
Prefeituras eleitas em 2004 
Porcentagem aproximada* de políticos cassados por partido


 A porcentagem é aproximada porque a primeira coluna se refere a todos políticos cassados entre 2000 e 2007 – cuja imensa maioria estava nas prefeituras –, enquanto a segunda se refere apenas às prefeituras eleitas em 2004. Vemos assim que, com um pouco de tempo e paciência, a internet pode ser um excelente instrumento para o esclarecimento. Sem isso, o risco de divulgar lorotas para os amigos é sempre grande. Por fim, é bom lembrar que, como qualquer outro, isso é só um ranking, não é a verdade universal sobre os partidos políticos. Ele tem diversas limitações, como já expliquei. Mesmo assim, creio que isso é melhor do que o puro “achismo” ou do que opiniões bem escritas mas opacas, que não podem ser verificadas mais a fundo, como se vê em muitas reportagens de “fontes anônimas”.

Um comentário:

  1. Os ministros do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) desaprovaram as contas do PT referentes a 2005 e, com isso, o partido ficará por um mês sem os R$ 3,8 milhões do Fundo Partidário.

    De acordo com o relator, ministro Gilson Dipp, a sigla foi várias vezes notificada para sanar as irregularidades apontadas pelo TSE. "O partido não sanou as irregularidades, mesmo com muitas oportunidades", afirmou.

    Dipp disse que o PT não apresentou informações complementares de pagamento de passagens e diárias no valor de R$ 166 mil, usou indevidamente recursos do Fundo Partidário para o pagamento de contas de telefones particulares, multas de trânsito e bebidas alcoólicas, no total de R$ 11 mil, e deixou de registrar o valor de R$ 1 milhão pago à Companhia de Tecidos Norte de Minas, o que representa quase 5% do total do valor recebido pelo partido do Fundo Partidário em 2005, no valor de R$ 24 milhões.

    "É um conjunto de irregularidades que se projeta nos valores e no descumprimento das normas de prestação de contas", disse o relator.

    O ministro considerou também que, ao aplicar a sanção de suspensão do repasse da cota do Fundo Partidário, não houve desrespeito ao prazo de cinco anos para a imposição da pena de suspensão das cotas previsto na Lei dos Partidos Políticos.

    A lei estabelece que a falta de prestação de contas ou sua desaprovação total ou parcial implica na suspensão de novas cotas do Fundo Partidário e sujeita os responsáveis às penas legais.

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