Falácias eleitorais
O começo oficial da campanha para as eleições municipais deste ano deve acirrar as disputas políticas e colocar em cena a discussão sobre as questões importantes para as cidades e seus cidadãos, propostas e alternativas de políticas públicas para lidar com antigos e novos problemas.
Esse é o cenário desejável e esperado, pois a eleição é o ápice desse processo de debates sobre os interesses da sociedade.
Contudo, o que os embates acabam trazendo, muitas vezes, são discursos vazios, falácias e obscurantismos, utilizados por determinados candidatos, com o intuito de alardear e promover questões imaginárias, desviando a atenção do debate das questões reais e concretas, empobrecendo o jogo político e eleitoral.
É preciso, portanto, que o eleitor fique atento a esse tipo de estratégia e repudie determinadas condutas. Ataques pessoais, boatos, deturpação de dados e informações, distorções e mentiras divulgadas pela Internet, panfletos apócrifos, manipulações e descontextualizações encobrem a falta de propostas de quem não tem nada a dizer, nem respeito pelo eleitor.
O exemplo mais emblemático dessa postura foi a candidatura à Presidência da República, em 2010, de José Serra (PSDB), hoje, candidato à Prefeitura de São Paulo. Pelo que se viu até agora, Serra ameaça repetir o script: o candidato tucano mal começou sua campanha e já foi capaz de produzir um dos discursos mais “enigmáticos” das últimas eleições.
Valendo-se de argumento falacioso, comumente empregado em seus discursos, Serra tentou assustar a população de São Paulo, afirmando que o futuro da democracia no Brasil está em jogo na eleição paulistana.
Ao tecer essa declaração, o candidato considerava que uma vitória do PT na capital paulista daria ao partido a hegemonia no cenário político nacional e que isso seria prejudicial ao Estado Democrático — portanto, à democracia.
Se o PT vier a vencer na cidade com Fernando Haddad, o simples fato de a escolha ser da população, a partir do voto na urna, já é suficiente para revelar o pleno exercício da democracia.
Mas a linha de argumentação de Serra é curiosa também porque durante as gestões do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o alinhamento do Estado de São Paulo —já então sob comando dos tucanos— com a União se deu sem qualquer prejuízo às instituições democráticas. E não se viu o PT aludir a supostos riscos à democracia.
Além disso, está claro que não há qualquer fundamento em associar uma disputa eleitoral e a vitória de um partido com ameaças antidemocráticas. Pelo contrário, é justamente o processo eleitoral que consolida o regime, a cada novo pleito.
O que Serra fez neste caso e em muitos outros foi repetir a fórmula largamente usada pela direita, que prega a ignorância e o medo, apelando à emoção das pessoas, em detrimento da verdade dos fatos.
O expediente do medo foi largamente utilizado contra o ex-presidente Lula, durante a campanha que o elegeu presidente, em 2002. No discurso de seus então adversários, Lula representava uma ameaça de crise para o país.
O presidente também foi desqualificado inúmeras vezes, por exemplo, por não ter concluído o ensino formal, ao que pôde responder, anos depois, que o presidente sem diploma foi o que mais levou jovens ao ensino superior no Brasil.
Em 2010, o roteiro foi repetido, desta vez, com uso de temas religiosos e contra a presidenta e então candidata, Dilma Rousseff.
Ataques e artifícios de baixo nível como esses desviam o foco dos verdadeiros debates que precisam ser travados: as questões locais, alinhadas às regionais e às políticas implantadas em âmbito nacional.
Além disso, não contribuem em nada para atrair e envolver os cidadãos no processo eleitoral. Na pior das hipóteses, surtem o efeito de afastá-los, por evidenciar o quanto alguns candidatos estão em dissonância com os problemas reais do seu dia-dia.
O eleitor, contudo, a cada nova eleição, vem reforçando o seu papel de ator preponderante da cena eleitoral, não apenas porque é ele quem decide, quem de fato tem o poder do voto, mas porque cobra que as discussões se deem em nível elevado e em torno das ideias e propostas que podem fazer a diferença para a melhoria das suas cidades.
É o eleitor, portanto, que pode rechaçar de forma mais contundente, campanhas nebulosas, discursos sem qualquer compromisso com a coerência e candidatos que tenham pouca disposição para o debate que convém ao momento.
Embora as eleições sejam em âmbito local, há um pano de fundo nacional no debate, pois é possível, e o eleitor fará isso, fazer um contraponto entre o projeto de desenvolvimento em curso no Brasil, desde o início do governo Lula, e a falta de programa alternativo da oposição.
É preciso ressaltar que muitas das políticas implantadas pelo governo federal tiveram como berço as administrações municipais do PT, onde foram aplicadas com ampla participação popular e, depois, levada a todo o país.
Quer dizer: o PT tem experiências importantes de gestão municipal a apresentar e debater com a sociedade.
As cidades brasileiras têm problemas e desafios urgentes a serem enfrentados. Portanto, no dia 7 de outubro, os eleitores irão escolher os candidatos que melhor aproveitarem a oportunidade de debater as questões da cidade, em diversas áreas —Educação, Saúde, Segurança, Cultura e lazer para a juventude, mobilidade urbana e Habitação, tratamento do lixo e Meio Ambiente— e de estabelecer um diálogo aberto com a população.
Esse, aliás, é o principal objetivo a que se destina uma campanha eleitoral e o que se espera de candidatos minimamente sérios e comprometidos com os interesses dos cidadãos. Nesse sentido, cabe aos candidatos e aos cidadãos evitar que a temporada de falácias eleitorais seja de fato aberta.
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