Crônica dominical de A. Capibaribe Neto


Diamante que respirava
Um diamante sem jaça é uma pedra preciosa sem defeito, e assim a queria o poeta, pois ela duraria bem mais que qualquer amor, por mais que esse amor durasse. Queria um tesouro, para acalentar os sonhos do amor perfeito que precisassem de joias raras e caras. Mas era assim que sentia, era assim que queria, era com esse diamante que sonhava. Anoitecia e quando ela chegava e dormia, ele ficava ali, em acalanto silencioso, a acarinhar-lhe a pele macia e morena, a enfiar os dedos, suavemente, por entre suas cabeleiras de castanho reluzente, fazendo com suavidade o contorno de seu rosto enquanto escutava seu ressonar cheio de paz.

E quase num sussurro, repetia sem canseira, "meu amor querido" e quando o sono lhe vencia ia dormir pensando no diamante para no dia seguinte acordar para a realidade. Dinheiro não traz felicidade! Mentira! E nem precisa ser muito, basta o bastante redundante, que seja o suficiente para comprar seu diamante reluzente, dentro do qual se pode enxergar a luz que ilumina e guia os passos da mulher feliz. Mas ela era, mesmo sem diamante, sem tesouro com o qual sonhava, sua melhor joia. Nos seus lábios doces, depois dos beijos sem hora para acabar, havia sempre um brilho, mais reluzente que a luz do brilhante e mais que a pureza da pedra sem jaça. E das mãos fazia uma taça e na taça bebia os vinhos, os licores e nada se comparava ao néctar dos lábios perfumados por natureza. Gostava de sentir seu respirar que parecia a própria vida fluindo do coração como um córrego de águas cristalinas surgindo por entre as pedras de uma fonte escondida na montanha. E ficava ali perto, bem perto, só sentindo, respirando seu ar, vendo seu coração pulsar no colo em repouso dentro do decote generoso largado no repouso depois da canseira do amor ou do cansaço do dia. De manhã, quando saía para o trabalho, ficava abraçado ao travesseiro feito criança a brincar com as lembranças da noite apenas passada. "Esse travesseiro é o seu, está todo amassado..." Ela não sabia que eram os amassados dos abraços que ele dava na sua ausência, sentindo seu cheiro na fronha, vendo seu rosto sorrindo.

Eram seus melhores fantasmas que só iriam embora quando outra noite chegasse e ela voltasse para o mesmo lugar, para os mesmos sonhos silenciosos. Lembrava da crônica que lhe escrevera o pai, quando ficou rapaz. "Hoje, manhã cedo, fui abraçar o fedelho de apenas alguns centímetros de ontem. E vi-o erguer-se um guapo rapaz assumindo o rosto de um homem feito em que se tornaria breve, e perguntei-me que tipo de presente se pode oferecer a um jovem que atinge a plenitude da sua mocidade, quando se tem origem humilde e recursos modestos?

Então, depois de um abraço forte ele disse: meu filho, existe uma razão para haver acabado desde cedo com a sua crença em Papai Noel, dando desculpas por ele haver lhe esquecido. Hoje, pensei muito no tipo de presente para lhe dar no seu aniversário de dezoito anos. Tudo o que tenho para lhe oferecer, meu filho, é um nome decente, para você carregar com orgulho pelo resto da sua vida, como um tesouro". Lembrou disso no aniversário dela. O nome limpo lhe dera melhores condições de vida, é verdade, mas não o dinheiro para comprar um diamante sem jaça para ela. Queria dizer palavras parecidas com as que lhe dissera o pai desde há muito, agora morando entre as estrelas. Pensou em dizer que tudo o que tinha era um amor enorme, mesmo na moldura dos medos de perdê-la. Queria dizer com as suas melhores palavras, fazer juras e renovar promessas, mas queria o diamante que infelizmente, não podia lhe dar. Logo amanheceria e antes de vê-la despertar para mais um dia como os outros, puxou-a para si com cuidado para não acordá-la antes da hora, e em silêncio chorou suas lágrimas mais sentidas. E foi nesse momento, que se deu conta de que ele, tinha seu maior tesouro e estava ali, abraçado a ele, um diamante sem jaça que respirava. 

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