Medos


Meu maior medo é viver sozinho e não ter fé para receber um mundo diferente e não ter paz para se despedir. 

Meu maior medo é almoçar sozinho, jantar sozinho e me esforçar em me manter ocupado para não provocar compaixão dos garçons. 

Meu maior medo é ajudar as pessoas porque não sei me ajudar. 

Meu maior medo é desperdiçar espaço em uma cama de casal, sem acordar durante a chuva mais revolta, sem adormecer diante da chuva mais branda. 

Meu maior medo é a necessidade de ligar a tevê enquanto tomo banho. 

Meu maior medo é conversar com o rádio em engarrafamento. 

Meu maior medo é enfrentar um final de semana sozinho depois de ouvir os programas de meus colegas de trabalho. 

Meu maior medo é a segunda-feira e me calar para não parecer estranho e anti-social. 

Meu maior medo é escavar a noite para encontrar um par e voltar mais solteiro do que antes. 

Meu maior medo é não conseguir acabar uma cerveja sozinho. 

Meu maior medo é a indecisão ao escolher um presente para mim. 

Meu maior medo é a expectativa de dar certo na família, que não me deixa ao menos dar errado. 

Meu maior medo é escutar uma música, entender a letra e faltar uma companhia para concordar comigo. 

Meu maior medo é que a metade do rosto que apanho com a mão seja convencida a partir com a metade do rosto que não alcanço. 

Meu maior medo é escrever para não pensar.
(trecho de Pais e filhos maridos e esposas II)
Fabrício Carpinejar

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