A escolha do nome 'Francisco' pelo novo Papa resgatou a esperança de setores cristãos progressistas numa reconciliação da Igreja com a opção pelos pobres, simbolizada na ordem dos franciscanos, e consagrada nos valores do Vaticano II. A longa noite de repressão doutrinária imposta pelos papados de João Paulo II e Bento XVI, com o aggiornamento dos tribunais da inquisição, teria, desse ponto de vista, atingido o limite de exaustão conservadora na cúpula romana. Crises, escândalos e disputas autofágicas pelo poder entre falanges extremadas desencadearam assim dois movimentos de autopreservação na burocracia de Roma: a renúncia 'sanitária' de Bento XVI e a escolha de um tertius, um papa sulamericano, externo ao embate que corrói o Vaticano. O duplo sinal inauguraria uma espécie de 'abertura lenta, segura e gradual' no interior da igreja. A escolha do nome 'Francisco' pelo novo Papa foi entendida desse modo pela esperança progressista, como um aceno de moderação e retorno a um diálogo reprimido nas últimas décadas. Leonardo Boff, um dos expurgados pelo ciclo Ratzinger, assegura, por exemplo, que o nome escolhido por um Papa não é apenas um ornamento, mas encerra um projeto de Igreja. Isso é o que teria dito a fumaça branca emitida na quarta-feira, em Roma. Pode ser. Mas a ela seguiu-se uma fumaça sombria, densa, carregada de fumos de horror e dúvidas. Uma delas condensa todas as demais: onde estava, e o que fez o cidadão Jorge Mario Bergoglio, o Papa Francisco I, entre 1976 e 1983, quando uma ditadura militar aterrorizante matou e desapareceu com 30 mil pessoas no país em que era bispo? (leia nesta pag. as análises e reportagens de Eduardo Febbro, Dermi Azevedo e Martin Granovsky. E também o especial sobre a crise que levou à renúncia de Bento XVI)
Carta Maior
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