O Brasil está em greve porque os nossos políticos continuam surdos aos gritos das ruas. A afirmação é simplória, mas certas verdades são tão claras que se tornam simplórias. O Brasil está em greve porque muitos políticos são canalhas, aproveitadores, malandros e falsamente surdos. Ouvem, mas não respondem. A prova disso é a reação dos senadores que decidiram manter a estupidez dos parentes suplentes alegando que não viram cartaz algum nas ruas pedindo o fim dessa idiotice oportunista.
O Brasil está em greve porque o presidente do Senado e o presidente da Câmara dos Deputados são duas raposas que há muito deveriam ter sido expulsas da esfera pública. O Brasil está em greve porque o presidente do STF, último herói moralizador nacional, frequenta o camarote de uma estrela de televisão, que retribui com emprego para o filho do magistrado, o qual, muito agradecido, grava vídeo de feliz aniversário para o pai anônimo da estrela. Esse presidente tem sido cantado em prosa e versa não por combater a corrupção, mas por combater a corrupção do PT, o que deixa felizes os antipetistas, com toda razão, sendo que a corrupção dos não petistas não lhes choca da mesma maneira. O mesmo vale para os petistas que combatem a corrupção dos outros, mas não se chocam com a própria.
O Brasil está em greve por não suportar mais esse tipo de moralismo seletivo.
O Brasil está em greve porque lê mal ou pouco, ou nada, admira mal, confunde admiração com idolatria, esquece rapidamente o que condenou e tem conservadores tão conservadores que não conseguem ser conservadores à moda europeia, confundindo-se com a extrema-direita europeia, aquele pessoal que ainda pensa em termos de egoísmo selvagem do século XIX.
É risível que pessoas confundam críticas aos excessos do capitalismo com apologia ao comunismo. Sempre tem um idiota que salta na cadeira e dispara como se fosse um gênio:
– Então vai para Cuba.
Isso é coisa de anta e de quem admira anta. Só atrasado quer ir para Cuba. Só muito atrasado acha que a solução para um país decente é abandonar as pessoas ao salve-se quem puder da ausência total de Estado ou da lei do mais forte com direito a bônus por exploração dos outros. O Brasil está em greve porque ainda não conseguiu corrigir a montanha de erros do passado nem convencer muitos dos seus políticos de que seus hábitos são nocivos, nefastos, hediondos, imorais e, muitas vezes, ilegais.
Sim, o Brasil poderia ter uma constituinte exclusiva. Sim, o Brasil, pode fazer uma consultar popular valendo para a eleição 2014. Isso só não sairá porque os políticos acham que o pior já passou. As ruas precisam rugir sem parar até que eles entendam, até que eles se dobrem, até que eles peçam perdão e capitulem. Enquanto eles não transformarem o Brasil num Egito, não sossegarão. Enquanto o colunista tido por mais lido de um Estado for uma anta que defende a implosão do melhor do nosso patrimônio histórico, continuaremos no atraso e necessitando de greves. Enquanto o fator previdenciário continuar sugando aposentados, precisaremos interromper estradas com manifestações ruidosas.
O Brasil está em greve porque ainda continuamos na pré-história do humanismo social, da democracia social, da visão social de trabalho, produção, lucro e interação. O Brasil está em greve porque, mesmo quando a “esquerda”, quase esquerda, meia esquerda, chega ao poder, o que só aconteceu três vezes, precisa entregar os dedos para não perder as mãos e poder tentar alguma coisa muito pequena.
O PT, para chegar ao poder, fez o jogo dos seus adversários históricos achando que ia enganá-los. Depois de devidamente informados, os aliados abriram fogo. O PT caiu na armadilha. Quis bancar a raposa no meio dos lobos. Sucumbiu. A luta que se trava hoje é entre os que desejam piorar ainda mais a situação, os que pretendem mantê-la como está e os idealistas que sonham com algo melhor.
O Brasil está em greve porque continua acreditando que moderno é ter ônibus, não bondes e metrô, e shopping centers, não mercados públicos pulsando de vida, cores, cheiros e humores.
O Brasil está em greve, de certo modo, em certa medida, porque a sua revista mais lida é a Veja, uma publicação neoconservadora de quinta categoria, que destila como verdade a sua ideologia melancólica, abusiva, jamais sustentada, simplesmente cuspida como uma filosofia.
Eu só sou agressivo contra ideias contrárias que são agressivas contra ideias contrárias.
Daí o tom deste texto.
De resto, viva a diferença!
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