A. Capibaribe Neto - Direito lá. Direito cá

Em um dos muitos vídeos sobre flagrantes de violência urbana, um jovem chega em casa e é abordado por um, como direi? - menor infrator, ordenando que o estudante lhe entregue o celular.

O rapaz, apavorado, entrega, mas o menor, digamos infrator, com todo o respeito, dá-lhe um tiro na cabeça gratuitamente. Um outro menor infrator, durante o assalto a uma farmácia, após recolher o dinheiro do caixa, volta da porta e, sem nenhum motivo que justifique, atira na cabeça da moça do caixa, tirando-lhe a vida.

Em outro episódio, outro desses respeitados menores infratores atira na cabeça de um garoto boliviano só porque a criança, apavorada, chorava sem conseguir se conter e pedia para não morrer. Tiro na cabeça, disparado por respeitáveis menores infratores virou moda.

Com todas essas demonstrações de falta de respeito pela dignidade de quem a tem realmente, até concordo que não é torturando um menor que, mal criado e sem princípios ou de princípios roubados por políticos safadões, que se faz a justiça em flagrante apelação anônima para a aplicação da Lei de Talião. Não, de jeito nenhum.

O que se viu, domingo passado, através das imagens exibidas pelo Fantástico, realmente choca, atenta contra a vida da pessoa, da sua dignidade, principalmente pela truculência de um agente da lei, com quase o dobro do tamanho e corpo do respeitável menor infrator.

Nenhum homem civilizado, por mais agredido no seu dia a dia, acuado pelo medo e pela insegurança das esquinas, das ruas, dos becos, das vielas e dos cruzamentos das grandes avenidas, concorda com tamanha violência.

Mas... venhamos e convenhamos, declarações como a do promotor de justiça da Infância e da Juventude, o respeitável doutor Matheus Jacob Fialdini, quando disse "eu me surpreendi com essa imagem. Me impressionei. Uma imagem muito forte. Eu não tinha visto uma coisa como essa. São agressões físicas, que ofendem também a dignidade" ou, como se expressou o respeitável doutor Ariel de Castro Alves, quando falou "é a primeira vez em 18 anos de atuação, visitando unidades da Fundação Casa, que assisto essas cenas. E isso choca pela covardia com que os torturadores agiram nesses casos", ele que é do Grupo Tortura Nunca Mais e do Movimento Nacional de Direitos Humanos.

Essas declarações remetem a um vazio existente na outra metade dos motivos pelos quais esses jovens senhores, os respeitáveis menores infratores, estão ali, com seus direitos vilipendiados naquelas circunstâncias. Muitos deles invadiram casas, ameaçaram famílias apontando-lhes revólveres, pistolas, facas e fizeram ameaças com garrafas de álcool gritando que tocariam fogos em crianças e idosos.

Alguns até chegaram mesmo a cumprir as ameaças pelo simples fato de suas vítimas não disporem das quantias que eles queriam arrecadar, como foram os casos dos dois dentistas. Existe um vazio chocante pela falta de solidariedade para com as vítimas que foram torturadas brutalmente, estupradas, mutiladas, que levaram chutes na cabeça ou tiveram um parente privado de vida ou incapacitado pelas violências desses pequenos e respeitáveis senhores, que tem os seus direitos muito bem assegurados e vigiados por autoridades.

Defendemos a paridade das demonstrações de solidariedade e preocupação. Falta um Grupo de Violência Nunca Mais e de um representante do Direitos Humanos - Capítulo vítimas da violência cometida sem piedade por esses pequenos respeitáveis adolescentes, senhores menores infratores.

Que se tenha pena deles, que haja uma solidariedade irrestrista a eles, mas que se faça a outra parte que abranja as vítimas desses atos infracionais bárbaros. Que se forje um escudo protetor para os que sofrem todo dia com a violência com a mesma têmpera com que se forjam os escudos mediáticos com que se defende os direitos dessas, digamos, respeitáveis crianças. Que não haja contemplação com quem é o responsável pelo desvio de verbas que poderiam tirar das ruas assassinas as verdadeiras crianças abandonadas. Que se forje um escudo protetor para os que sofrem todo dia com a violência com a mesma têmpera com que se forjam os escudos mediáticos com que se defende os direitos dessas, digamos, respeitáveis crianças. Que não haja contemplação com quem é o responsável pelo desvio de verbas que poderiam tirar das ruas assassinas as verdadeiras crianças abandonadas. Que deixe de existir a manobra ou a chincana que protela o julgamento dos vilões da pátria, os verdadeiros responsáveis por tantos desatinos.

Direito lá, direito cá. Proteção lá, proteção cá. Solidariedade explícita com os pobres coitados menores infratores, mas solidariedade igualmente explícita com os que sofrem todo dia com a perda de um ente querido para as armas nervosas e irresponsáveis desses pequenos senhores, os jovens infratores menores de idade. Com todo o respeito.

Nenhum comentário:

Postar um comentário