A palavra "medo", pura e simplesmente é muito genérica, tem uma abrangência enorme...
Medo do quê?
De alma,
de abelha,
de cachorro,
de ser traído,
ser pego em flagrante?
Medo de viajar de avião, de navio, de ônibus, de trem?
E o medo que o mundo acabe?
A fobia, por exemplo, é um medo mais nervoso, mais radical, quase xiita.
Medo que a Terra seja atingida por um cometa e outros mais. É muito medo, a bem da verdade, mas existem outros, que seja a ser até românticos, se o inserirmos no contexto dos sentimentos frágeis, aqueles que dependem da coragem de duas pessoas para assumir a responsabilidade de um relacionamento, de uma vida a dois, de prometer e cumprir a promessa. Medo de chegar atrasado e aí, pela responsabilidade que envolve toda espera, chega mais cedo e se morde com a lerdeza dos minutos. Medos... Muitos medos, milhares, talvez milhões; muitos deles, que se justificam e outros bobos, sem sentido, mas, nem por isso, menos medo. Cada um com o seu. Medo de ficar sozinho, de ser abandonado, de andar de elevador, de um ruído estranho, de uma escada rangendo ou medo do silêncio absoluto. Pois bem... já provei das sensações incômodas de muitos medos e nenhum deles bateu à minha porta quando, inadvertidamente, entrei em um rio congelado, em Denver, no Colorado, nos Estados Unidos e, de repente, senti o estalar do gelo fino quebrando debaixo dos meus pés. Em uma fração de segundo, a adrenalina chegou antes do medo de morrer e eu me deitei de braços abertos na superfície gelada e sem pressa, comecei a rastejar para o que descobri ser a margem. Depois senti medo. Na hora, não deu tempo. Não foi o medo de morrer. A morte, já venho trabalhando nesse encontro faz tempo, é a coisa mais certa para qualquer um de nós, mas quero morrer olhando nos olhos dela quando ela vier apresentar a conta por já haver tomado tanto tempo da existência com que somos agraciados. Senti medo pela visão do que teria sido cair em um buraco e ser arrastado por baixo da superfície congelada e morrer apavorado. Passou. Pode até ser que irresponsavelmente já tenha desafiado a morte quando ficava amarrado pelo lado de fora de um helicóptero para produzir fotografias exclusivas, como muitas vezes fiz. Certa vez, por exemplo, na companhia de um amigo querido, pulei de uma pedra para outra, a mais de dois metros de distância uma da outra e só ele viu que eu havia pulado essa pequena distância no Grand Canyon, em Utah, nos Estados Unidos, e nem me havia dado conta de que entre uma pedra e outra havia um abismo de mais de 800m. Se eu tivesse sabido antes jamais teria feito tamanha bobice. Mas já passou, estou aqui, não estou? E em momento algum me importei com os chistes cansativos da rotulagem de "doido". Sinto medo, como qualquer mortal, mas não exagero na dose. Meus medos mais sagrados tiveram nome, endereço, telefone, perfume, tinham pele, falavam, gemiam. Eu senti incontáveis receios de perder essas companhias e perdi muito tempo procurando certezas que me levassem a acreditar que as promessas que faziam escrevendo um "para sempre" nos cartões apaixonados eram para valer. E esses medos, sem os quais a minha vida não teria sentido, pela sucessão das promessas nunca cumpridas e por me haverem tornado mais cético na questão desses "para sempre" com data para acabar, mesmo sem que eu tivesse a menor ideia de quando seria. Não me preparei e fui pego de surpresa e se me preparei foi fazendo caminhos tortos, procurando refúgios no pântano das enganações onde a vendita antecipada se escondia na pretensão de sofrer menos. E daí pra frente, deixei de sentir medo de perder ao preço de assumir o risco da reclusão voluntária para pagar o preço, caro pela dignidade negociada. O pior medo que descobrir sentir é um medo diferente: o medo de sentir medo!
A. Capibaribe Neto
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