Imagine que você é um jovem jornalista que trabalhe num site de uma grande publicação.
Você bate os olhos numa notícia: a multiplicação dos memes sobre a foto das atrizes da Globo em protesto contra a decisão do STF de respeitar a lei e, portanto, permitir embargos de alguns acusados no processo do Mensalão.
Repito: decisão de respeitar a lei, como demostrou em mais de duas horas o ministro Celso de Mello.
Então você faz, satisfeito, um texto sobre os memes porque isto é notícia: afinal, é uma reação ao fato que mais marcou os brasileiros na semana.
E finalmente você recebe dos superiores não os parabéns por ter identificado um assunto de alto interesse – mas a brutalidade da censura arbitrária.
Sua reportagem é, simplesmente, deletada porque a realidade que ela revela não se coaduna com a realidade que a publicação tenta, a bordoadas, impingir a seus leitores.
“Que eu estou fazendo aqui?” é a pergunta inevitável que você se faz numa situação deprimente daquelas.
Bem, não é o roteiro de um pesadelo jornalístico para jovens. É o que aconteceu na Veja na mesma semana em que a revista comemora seus 45 anos parecendo ter, mentalmente, 145.
A autocensura foi notada no Twitter, e causou merecido escárnio.
Vai ficando cada vez mais difícil para a Veja, por coisas desta natureza, atrair jovens talentosos: quem quer trabalhar nestas circunstâncias?
Você tem vinte e poucos anos, tem o idealismo da juventude: o que você pode fazer numa revista que representa e defende a manutenção de um Brasil iníquo e na qual você não pode publicar sequer um texto sobre memes?
A Veja, ao chegar aos 45 anos, é simplesmente a negação do zeitgeist – o espírito do tempo. Combater a desigualdade social é a essência do zeitgeist moderno, não apenas no Brasil mas no mundo.
Mas a Veja marcha do lado contrário, impávida e orgulhosa.
É assim que ela chega a 45 anos. E é por causa disso que ela não irá muito adiante: por seu divórcio com o mundo tal como ele é. Em sua louca cavalgada editorial, a revista pôs na capa desta semana a imagem da justiça curva. A justiça teria se curvado aos poderosos, aspas, ao acolher os chamados embargos infringentes. Ora, como um heroi da própria Veja — o jurista Celso de Mello — demonstrou em seu voto longo no STF na verdade o que se fez foi respeitar a lei e a Constituição.
A internet está castigando a revista, é certo: a cada dia menos pessoas leem publicações impressas. Revistas muito maiores que a Veja, no mundo, já morreram, como a americana Newsweek. A própria Time, a maior de todas, agoniza sem que seus proprietários consigam encontrar um comprador para ela.
Mas o problema maior da Veja não é uma tecnologia que a faz obsoleta – é um conjunto de crenças absurdas que a faz cega.
Paulo Nogueira
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