O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, reagiu às acusações proferidas pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG) afirmando que respeita a autonomia dos órgãos de investigação. Horas após o presidenciável tucano cobrar a demissão de Cardozo, ele convocou entrevista coletiva na qual alfinetou o PSDB.
"Imaginar que o ministro da Justiça receba um documento como estes e deve reunir seus assessores para rasgá-lo na frente de todos é imaginar que ainda estamos numa época em que existem engavetadores gerais. A época dos engavetadores gerais de denúncias no Brasil acabou há alguns anos, e eu me recuso a ser um engavetador", disse, em referência a um dos procuradores-gerais da República do governo Fernando Henrique Cardoso (FHC), Geraldo Brindeiro, que ficou conhecido como engavetador-geral da República devido ao arquivamento de denúncias que envolviam o PSDB.
Cardozo iniciou a conversa com jornalistas explicando que as denúncias sobre o esquema de corrupção no Metrô de São Paulo, estado governado há quase duas décadas por tucanos, foram entregues a ele em maio pelo secretário de Serviços da prefeitura da capital paulista, Simão Pedro. O encontro foi na casa do ministro, também em São Paulo, em um domingo. "Não há nenhuma ilegalidade. Onde a autoridade pública estiver, ela pode ser instada. E foi. Não há nada de sombrio nisso. Não vejo por que possa haver qualquer mácula nesse procedimento", argumentou. "Qualquer coisa, com um mínimo de plausibilidade ou consistência que eu receba, encaminho para a Polícia Federal. Não será o primeiro, não será o último. Pode envolver meu partido, pode envolver outros partidos, pode envolver pessoas da minha família."
O documento, apócrifo, apresentava planilhas e nomes dos envolvidos no cartel de empresas formado para dominar concorrências na entrega de trens e equipamentos à autarquia, e se somou a outras investigações em curso na Polícia Federal e no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), ambos subordinados ao Ministério da Justiça. Ao Cade, o caso chegou graças a executivos da alemã Siemens, que participou do conluio e decidiu recorrer a um acordo de leniência, pelo qual pode se livrar de penas em troca de informações sobre o esquema.
"Quero lamentar a tentativa de transformar uma investigação séria, feita administrativamente pelo Cade, e no plano policial pela Polícia Federal, em uma disputa política, em uma disputa eleitoral. Aqui não tem nada de eleições, aqui não tem nada de disputa política. O que existe é uma investigação", afirmou Cardozo. Ele recordou que o esquema vigente em São Paulo é investigado também no exterior, onde houve inclusive condenações, e que o fato de ter partido da Siemens a iniciativa de procurar o Cade deslegitima a tentativa de associar a denúncia a um interesse eleitoral do PT.
Esta semana foi divulgada a informação de que os documentos continham denúncia atribuída ao ex-diretor da Siemens Everton Rheinheimer. Ele delatava a existência do esquema durante as gestões tucanas de Mário Covas, Geraldo Alckmin e José Serra, com objetivo principal de desviar recursos para as campanhas eleitorais do PSDB e do DEM. Além disso, citava o secretário da Casa Civil de Alckmin, Edson Aparecido, como receptor da propina encaminhada pelo lobista Arthur Teixeira. Outros três secretários do governador são citados como pessoas próximas a Teixeira: José Aníbal (Energia), Jurandir Fernandes (Transportes Metropolitanos) e Rodrigo Garcia (Desenvolvimento Econômico), do DEM, além do senador Aloysio Nunes (SP).
Nunes, Aníbal, Aparecido e Aécio convocaram a imprensa para classificar como falso o documento recebido pela Polícia Federal. A postura repete a de Alckmin, que vem dizendo que processará a Siemens e os responsáveis por delatar o esquema. Os tucanos dizem que a Procuradoria-Geral da República deve investigar quem é o responsável pela falsificação dos papéis que levaram à investigação do conluio e querem que todos os contratos da multinacional alemã com órgãos públicos sejam vistoriados pela PF.
Além disso, o PSDB deseja convocar Cardozo ao Congresso na tentativa de questioná-lo sobre o encaminhamento das denúncias de Simão Pedro, além de apresentar pedido de investigação junto ao Conselho de Ética Pública da Presidência da República. Na entrevista, Aécio chegou a pedir a demissão do ministro. "Acho que ele perdeu as condições de ser o coordenador dessas investigações como ministro da Justiça, pelo açodamento e omissão nesse processo", disse Aécio.
Cardozo rebateu: "O presidente do PSDB disse que o ministro da Justiça não tem condições de coordenar e chefiar as investigações. Quem faz isso é o delegado de policia. Há um ligeiro equívoco jurídico, meu poder se limita a pedir investigação que é feita com absoluta autonomia. Não consigo entender o senador Aécio Neves." Em seguida, ele afirmou que o Cade e a Polícia Federal não cederão a pressões. "Aqueles que não têm visão republicana do Estado e acham que denúncias têm que ser rasgadas e não investigadas, talvez algum dia percebam que uma republica não se constrói vendo as pessoas diferentes pela sua cor política."
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