Sobre Dirceu e Genoino, é possível considerá-los "culpados" de muita coisa. Dirceu é "culpado" de dirigir transformações profundas no PT, adequando-o ao jogo eleitoral, tornando-o uma estrutura mais centralizada e burocrática. Genoino é "culpado" de ser um dos primeiros petistas a defender um programa moderadíssimo, questionando inclusive o caráter socialista do PT. Em larga medida, ambos são, ao mesmo tempo, "culpados" de uma estratégia que possibilitou ao PT vencer as eleições presidenciais.
Nos meus 33 anos de vida, metade deles passados no PT, nunca fui "da turma" do Dirceu e do Genoino. Até o dia de hoje. Ver os dois presos na PF, condenados muito mais por serem símbolos de um imenso campo político e social do que pelos erros cometidos, vítimas de um julgamento que inaugura precedentes perigosíssimos para a esquerda brasileira (e o pedaço sectário da mesma esquerda que no momento exulta por acreditar que o PT está ferido de morte deveria se lembrar dos seus próprios militantes presos e enquadrados numa interpretação sui generis do crime de "formação de quadrilha" após as jornadas de junho), só não desperta a solidariedade de quem perdeu o senso de justiça.
Parte da direção partidária é assumidamente culpada do crime de Caixa 2. O PT nunca debateu com a devida profundidade a questão, o que em certa medida nos impediu de virar a página do episódio e dar a devida centralidade às reformas estruturais que promovam a primazia do público sobre o privado e o exercício da cidadania ativa. No entanto, ouvir repetidamente a ladainha do "maior episódio de corrupção da história", ignorando as bases carcomidas do sistema político-eleitoral brasileiro, fazendo vista grossa para inúmeros episódios de favorecimento de interesses privados às custas do Estado, fartamente documentados no livro "A Privataria Tucana", só pra citar um exemplo gritante, só reforça o caráter político de um julgamento cheio de atropelos ao pleno direito de defesa e à presunção da inocência. Não é pouco significativo que as prisões ocorram exatamente um dia após a exumação dos restos mortais e do enterro com honras de Chefe de Estado do ex-presidente João Goulart, episódio dotado de simbolismo ímpar por corrigir uma injustiça histórica. Os abutres da direita tiveram um sábado pra se deleitar e limpar o gosto amargo provocado pelo - tímido, diga-se de passagem - noticiário sobre a ditadura desnuda.
Os que comemoram o dia de hoje são os mesmos que impedem a reforma política, que promovem a exclusão, combatem a promoção dos direitos humanos, criminalizam os movimentos sociais. Apontam o dedo para dizer do PT tudo o que sempre foram: autoritários, parasitas do Estado, corruptos. Não toleram ver as ferramentas que sempre manejaram sendo usadas para iniciar a reversão do entulho excludente depositado ao longo de séculos pelas elites. A euforia é causada pelo sentimento de vendetta, pois o maior crime de Genoino e Dirceu, aquele cuja a culpa de ambos é inegável, é a contribuição decisiva para erigir um Brasil muito melhor do que aquele em que viviam em 1980, ano em que eu nasci e também o ano em que os dois militantes históricos ajudaram a fundar o PT.
Força, camaradas, a História não lhes faltará.
Bernardo Cotrim
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