Crônica dominical de Luis Fernando Veríssimo

Recebo outra carta da ravissante Dora Avante. Dorinha, como se sabe, diz que só Deus e o Pitanguy conhecem sua verdadeira idade, e confia na discrição dos dois. Ela confirma que foi a primeira mulher a fazer topless numa praia brasileira, mas nega que teve que parar porque o Padre Anchieta protestou.

Mesmo assim, a história da Dorinha se confunde com a História do Brasil e ela conta que o que alguns presidentes fizeram, figurativamente, com o país fizeram com ela, na cama — às vezes figurativamente também, suspira.

Dorinha mantém até hoje o que chama de “laços estreitos” com figuras importantes da República, mas nada que envolva arreios ou chicote. Ficou muito enternecida com o uso repetido do termo “Vaquinha” que tem visto no noticiário atual, porque era assim que chamava, carinhosamente, seu quarto ou quinto marido, entre outras razões porque nunca se lembrava do seu nome.

Dorinha e seu grupo de carteado e pressão política, as Socialaites Socialistas, que pregam a instalação no Brasil do socialismo soviético na sua etapa mais avançada, que é a volta ao feudalismo czarista, se reuniram para planejar sua participação no... Mas deixemos que a própria Dorinha nos conte. Sua carta veio escrita com tinta turquesa em papel rosa, cheirando a Engorge moi, um perfume proibido em vários países.

 “Caríssimo: roto-beijos!

É carnaval, e como acontece todos os anos, tivemos que escolher entre a purificação de nossas almas e uma profunda reflexão sobre a condição humana, saindo na Sapucaí, ou o abandono lascivo de um convento.

Você sabe como fiquei traumatizada depois do meu acidente há dois anos, quando desfilei como destaque fantasiada de Pássaro do Paraíso, perdi o equilíbrio e caí do pedestal, abanando freneticamente minhas asas de acrílico na vã tentativa de sair voando em vez de me estatelar no asfalto. Que vexame.

No ano passado decidimos que ninguém sairia de destaque, desfilaríamos todas no chão, com o povo, ou coisa parecida. Mas como só havia vagas na ala dos turistas, que na escola chamam de Ala Scholl, acabamos no meio de uma delegação do Rotary Club do Paraná que parou na frente do camarote da Brahma, para ver os artistas, e se recusava a andar, prejudicando nossa cronometragem.

Este ano resolvemos sair de Black Bloc Estilizado, com o rosto tapado e o resto do corpo completamente nu. Não sei qual será a reação das arquibancadas, e das autoridades. Por via das dúvidas, já preparei meu recurso infringente.

Da tua Dorinha, na expectativa.”

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