A direita e a mídia brasileiras (lo que nos es lo mismo, pero es igual) resolveram politizar a seca extraordinária que atingiu o Sudeste brasileiro em 2014.
Embora nossos tecnocratas não levem a sério a Natureza, ela existe e o amigo está vendo aí ao lado os mapas de precipitação (chuva) acumulada no primeiro trimestre do ano, tanto em 2013 quanto em 2014.
Não é preciso ser meteorologista para ver que a região viveu um imensa seca, totalmente anormal e, como você pode observar, pior até que a de 2001, ano do racionamento de Fernando Henrique Cardoso.
O clima do semi-árido nordestino avançou até o centro de São Paulo, cobrindo todas as áreas de maior capacidade de produção hidrelétrica do país, o que absolutamente não ocorreu durante as dificuldade de 2001.
Não é preciso discutir, é só olhar os mapas ou conferir no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Não é difícil, está na internet, ao alcance de qualquer pessoa que queira escrever sobre isso.
Se a comparação for feita levando em conta a temperatura média do trimestre, a situação ainda é mais gritante.
E isso influi monstruosamente na carga de energia demandada. Um único número: dia 5 de fevereiro, o Brasil consumiu 50 mil megawatt médios; ontem, 40 mil.
Pena que nossa imprensa não seja capaz de fazer o trabalhinho simples de mostrar estas informações, para que a população possa ter ideia do tamanho do problema e formar corretamente sua opinião.
É evidente que, tanto para o abastecimento de água quanto para a produção de energia, não há saída sem chuvas.
Administrar os dois sistemas é, essencialmente, equilibrar as origens da água, combinando áreas, para que o que não chove numa região possa ser compensado, mesmo parcialmente, por outra.
Alás, é isso que permite que o abastecimento possa ser tratado como um sistema. Por isso, mesmo modestamente, os reservatórios das hidrelétricas do Sudeste, mesmo com chuvas muito inferiores à média, puderam apresentar uma pequena recuperação, um pouco mais de 3% acima do que tinham no início do mês passado: de 34,6% em 1° de março para 37,7%, ontem.
Então, como explicar que, no mesmo período, o principal reservatório de abastecimento de água de São Paulo tenha caído para níveis tão dramáticos, caindo de 16,3 para 11,7% no mesmo período? E olha que se reduziu fortemente o fornecimento de água a grande parte da cidade, com um racionamento censitário, onde quem paga tem e quem não tem para pagar fica sem…
Porque não se cuidou, em São Paulo, de interligar o sistema, da mesma forma com que se faz com linhas de transmissão elétrica.
O segundo maior sistema que abastece a região metropolitana, com 14 mil litros por segundo de vazão, o Guarapiranga, tem quase 80% de sua capacidade preenchida, com pouquíssima diferença do que tinha há um ano atrás (89%). Outros dois, menores, Rio Claro e Rio Grande, com mais 9 mil litros por segundo de capacidade, estão pondo água fora, cheios até o limite.
Por isso, está corretíssima a abordagem feita pelo pré-candidato petista sobre o problema da água em São Paulo. Faltar chuva – e já não falta, porque tem chovido há dois meses mais do que a média histórica, é um fato, mas a crise vem essencialmente da falta de ligação entre os sistemas de abastecimento da metrópole, para o qual não se deu um passo concreto até agora e é uma obra que, embora cara e complexa, pode começar a ser executada de imediato.
Nada disso você tem lido na imprensa, embora leia a toda hora as previsões de "especialistas" sobre o risco de apagão elétrico. Que existe, é claro, porque ninguém pode prever anomalias climáticas, mas está mil vezes mais distante que o desastre no abastecimento de água.
Quanto a este, preferiu-se seguir a demagogia do Governador Geral do Alckmin, que criou o factóide da transposição da água do Paraíba do Sul, o que é absolutamente inexequível a curto prazo e, como tudo o que é falso, sumiu tão rapidamente quanto apareceu.
Como também não apareceu o apagão elétrico que, agora, é substituído pelo "escândalo" dos gastos governamentais para compensar a elevação do custo da energia elétrica com o uso da geração térmica.
Não há nenhuma novidade nisso, mas você pensa que é inédito, porque também não se publica que, em 2001, o governo tucano teve de fazer o mesmo – e sem evitar racionamento.
Somados o gasto de 2001 aos de janeiro e fevereiro de 2002, as distribuidoras de energia tiveram perdas, em valores corrigidos pelo IGP-M, de cerca de R$ 15 bilhões com a geração térmica.
Isso sem contar que obrigou a Petrobras a comprar, a preço fixo e muito mais alto que o do mercado, a energia gerada por quem se dispôs a construir térmicas aqui, como a Enron.
Dificilmente você terá tido as informações que se dá neste post.
A imprensa jamais aprofundou essa discussão, preferindo criar um "terror do apagão". Da água em São Paulo só passou a falar, e burocraticamente, quando a situação provocou o corte de abastecimento.
Transformou-se um fenômeno natural em um tema político eleitoral. Não se fez jornalismo, fez-se propaganda.
Aécio Neves fez, no início de fevereiro, um artigo terrorista, prevendo um "apagão" sem, em todo o texto, usar uma vez sequer as palavras "seca" ou "chuva".
Tudo era uma questão de falta de "planejamento e da capacidade de gestão"
Agora, que ninguém reclame que isso se volte contra quem o dizia.
Fernando Brito no Tijolaço
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