Terra entrevista Tasso Genro - governador do Rio Grande do Sul

Primeiro governador eleito ainda no primeiro turno no Rio Grande do Sul desde a Constituição de 1988, o petista Tarso Genro se mostra confiante às vésperas de encarar, nas eleições de outubro, um desafio ainda maior: desde a década de 1980, nenhum mandatário gaúcho conseguiu se reeleger ou sequer levar um sucessor ao poder.

Tarimbado por suas passagens na prefeitura de Porto Alegre e nos ministérios da Justiça, da Educação e das Relações Institucionais, Tarso já tem traçada a estratégia para derrotar a senadora Ana Amélia Lemos (PP), principal força da oposição: comparar a sua gestão com a de sua antecessora, Yeda Crusius (PSDB). “O governo da Yeda foi o governo de todos que estão na oposição a nós. Esta comparação é que vai ser a comparação decisiva”, afirmou, em entrevista exclusiva ao Terra.

Durante a conversa, Tarso fez também uma análise do cenário nacional, projetando uma vitória da presidente Dilma Rousseff ainda no primeiro turno. Para o governador gaúcho, que presidiu o PT após a eclosão do escândalo do mensalão, em 2005, Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB) estão cometendo um “crime” ao alimentarem a criação da CPI da Petrobras, o que, na avaliação de Tarso, “será mortal” para suas aspirações eleitorais, por atentar contra um patrimônio brasileiro.

Veja a seguir os principais trechos da entrevista exclusiva de Tarso Genro ao Terra:

Terra - Durante o evento "Diálogos sobre a Copa", promovido pelo seu governo, o senhor afirmou que a decisão de sediar o torneio foi uma “roubada” para o Brasil, enquanto o discurso da presidente Dilma segue na ideia de que o País fará “a Copa das Copas”. Vendo hoje essa decisão de realizar a competição, o senhor acha que foi uma má ideia?

Tarso Genro - Não, na verdade aquela minha fala tem que ser contextualizada. Eu, quando mencionei a questão da Copa, estava falando da influência da globalização. Globalização tutelada pelos países ricos, que impõem aos países intermediários - como o nosso – e aos países pobres determinados critérios para se integrar ao processo de globalização. E esses critérios normalmente são critérios desfavoráveis aos países "globalizados", e muito favoráveis aos países "globalizantes".

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Tarso diz que CPI contra Petrobras será mortal para Aécio e Campos
É um evento importante e que nós temos que aproveitar para gerar dinâmica comercial, aumentar o nosso PIB, recolher mais impostos, oferecer mais postos de trabalho, movimentar o comércio, os restaurantes e os hotéis.

Uma coisa muito boa, mas fiz o juízo sim. Porque a forma com que esses negócios, em geral, se processam - e a Copa não foge à regra - se tornam problemáticos. Como, por exemplo, nós estamos enfrentando aqui em Porto Alegre manifestações de pessoas que estão sendo deslocadas pela pressa das obras voltadas para a Copa. Isso não é culpa do prefeito, nem culpa da presidenta Dilma. Isso é decorrente de um processo hoje de imposição de normas para realizar os grandes negócios internacionais, que atinge também a Copa. Foi isso que eu falei.

Terra - O senhor acha que o Brasil teria como aceitar a Copa, mas impor limites à Fifa?

Tarso - Eu acho que essa aceitação para esta Copa foi necessária para que a Copa viesse para cá. Não teria outra forma de a Copa vir para cá. E a Copa vir para cá é uma coisa boa, é um bom prestigiamento para o Brasil. Só que eu acho que, daqui pra diante, nós temos que tratar de uma forma diferente esses grandes eventos internacionais.

Terra - Na semana passada, o senhor obteve uma vitória importante na Assembleia Legislativa, com a aprovação do projeto que viabiliza a montagem das estruturas temporárias da Copa do Mundo. No entanto, a proposta enfrentou grande resistência de setores da sociedade que se mostraram contrários à ampliação dos gastos estatais no evento. Esses R$ 25 milhões que o Estado deixará de arrecadar não seriam melhor aplicados em outras áreas estratégicas, como a segurança, por exemplo? De onde vai sair o dinheiro, já que o próprio Ministério Público ameaça entrar na Justiça por conta dessa indefinição?

Tarso - Isso é uma renúncia fiscal futura. É um aporte que nós fazemos, através de renúncia fiscal, de pessoas que fizerem essas obras, que vão permitir que ocorram aqui os cinco jogos, que vão permitir que venham 200 mil pessoas, e que nós vamos arrecadar três a quatro vezes mais do que vai ser renunciado. Então nós tratamos isso aí como um negócio (risos).

Terra - Como um investimento...

Foto: Marcelo Miranda Becker / Terra
Tarso - Um negócio que, para nós, se torna um investimento, porque nós estamos envolvidos em função da Copa. Do ponto de vista mais formal, nós temos consciência de que o Internacional tinha responsabilidade. Agora, nós fomos colocados perante a seguinte disjuntiva: permitimos que esses jogos se façam aqui? (Vamos perder) Erses cinco jogos que são importantes para a Copa do Mundo, e que vão mobilizar enormemente o comércio, os serviços, 200 mil turistas em Porto Alegre, ou não? É uma responsabilidade de governo dizer que "não, nós queremos que esses jogos saiam". E isto é o que ocorreu.

Terra - Como o senhor avalia a posição do governo federal de não aprovar a mudança da indexação da dívida dos Estados, que é uma das suas principais reivindicações para lançar-se a um segundo mandato? O fato de o senhor ainda não ter se manifestado de forma definitiva sobre sua candidatura à reeleição tem relação com isso? Ou o senhor ainda está confiante de que essa questão vá ser votada em breve?

Terra - Eu já tenho dados suficientes para dizer que vai ser votado até julho, agosto, esse projeto. A outra questão que eu tinha colocado, de que a presidenta viesse aqui (apenas) para o nosso palanque, isso aí a vida resolveu. Tudo aquilo que eu previ aconteceu. Que a (senadora) Ana Amélia (Lemos, do PP) ia apoiar o Eduardo Campos (PSB), que o PMDB (gaúcho) não ia apoiar a Dilma. E que o PDT ia ter candidato próprio também, e, portanto, iria procurar aliados também a partir de uma outra visão de associação que não a que reeleja a presidenta Dilma.

A questão da minha pré-candidatura está colocada, tudo indica que o partido vá não só consolidar, como exigir a minha candidatura. Então, nós oportunamente vamos nos manifestar sobre isso.

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Governador responde perguntas da população
Terra - Ainda sobre eleições, o PMDB com palanque próprio no Estado preocupa? Os ex-governadores Germano Rigotto (PMDB) e Yeda Crusius (PSDB) já venceram eleições com candidaturas que começaram desacreditadas. Em um pleito polarizado com a senadora Ana Amélia Lemos (PP), o senhor teme uma ascensão de Ivo Sartori como uma terceira via?

Tarso - Não, não é esse o nosso problema. Nós estamos em melhores condições de competir do que estávamos na eleição em que eu ganhei no primeiro turno (em 2010).

Primeiro, porque nós vamos ter condições de mostrar na campanha eleitoral tudo que nós fizemos, e que não conseguimos demonstrar porque temos poucos recursos para a publicidade e não somos, vamos dizer assim, o governo preferido da imprensa tradicional.

Segundo, porque nós vamos ter um tempo de TV muito maior. Terceiro, porque nós vamos ter aliados importantes no primeiro turno que não tivemos na eleição anterior, onde nós tínhamos só o PSB e o PCdoB, que são dois partidos dignos, mas que não têm um eleitorado grande. O PTB é um partido de massas aqui, um partido que tem um enorme eleitorado e que vai estar conosco, inclusive compondo a própria chapa.

Portanto, eu acho que a questão que vai ser colocada é a seguinte: nós, na campanha eleitoral, vamos conseguir fazer com que a sociedade compare o que é o nosso governo e o que foi o governo da Yeda? Porque o governo da Yeda foi o governo de todos que estão na oposição a nós. O governo da Yeda foi o governo do PMDB, foi o governo do PP, foi o governo do PSDB. Esta comparação é que vai ser a comparação decisiva.

Terra - No plano nacional, a última pesquisa CNI/Ibope apontou queda na popularidade da presidente Dilma Rousseff. O senhor acredita na reeleição de Dilma ainda no primeiro turno? Qual o adversário mais difícil da presidente, Aécio Neves ou Eduardo Campos?

Tarso - Eu acho que qualquer um dos dois, se for para o segundo turno, se torna um adversário difícil. O governo da presidenta Dilma, na minha opinião, está com prestígio político ainda muito forte para ganhar no primeiro turno. Em um segundo turno, nunca se sabe como estará a consciência política média para uma disputa.

São dois bons candidatos, tanto Aécio quanto o Eduardo Campos. Só que eles dividem o mesmo contingente. Eles são candidatos que não têm penetração na esquerda. E estão extremamente aliados em um crime de leso-país que está sendo feito, que é o combate, o confronto para destruir a Petrobras.

Eu acho que este movimento que eles estão fazendo, que a curto prazo pode até baixar o prestígio da presidenta, vai ser mortal contra eles. Como foi na oportunidade em que o Fernando Henrique (Cardoso) queria privatizar a Petrobras. Como foi na oportunidade do (Geraldo) Alckmin, que queria desprezar o Banco do Brasil e acabou vestindo um bonezinho para tentar se consertar no segundo turno. Então eu acho que isso é o que eles mais vão pagar no processo eleitoral, é o crime que eles estão cometendo para destruir a Petrobras hoje, através dessa CPI manipulatória que eles estão realizando.

Terra - Durante as manifestações em Porto Alegre, apesar de eventuais excessos, especulou-se uma possível mudança de postura da Brigada Militar perante os movimentos sociais, principalmente quando comparada à repressão policial vista em protestos no passado. Houve uma ordem específica de seu governo para mudar a abordagem da BM?

Foto: Marcelo Miranda Becker / Terra
Tarso - A visão de segurança pública que estava incrustada, e que de certa forma ainda está incrustada na Brigada Militar, é que as mobilizações sociais são inimigas da polícia, e inimigas do Estado. Isto não é uma visão correta, é uma visão manipulatória da democracia, que utiliza inclusive os servidores públicos para sufocar os movimentos sociais.

Mas a Brigada Militar não agiu como tropa de choque do Estado para dirimir a importância dos movimentos sociais, atacar o livre direito de manifestação. E inclusive com ordem expressa minha de não atacar manifestantes que estejam depredando alguma coisa, (a não ser) que este ataque pudesse causar algum ferimento em alguma pessoa que não estivesse envolvida em depredação. E eu paguei um preço por isso. Mas não me arrependo.

Então, aqui a Brigada Militar tem uma orientação pessoal minha, eu assumo essa responsabilidade pública. A Brigada Militar não é um instrumento de repressão política, e nem é um instrumento de repressão aos movimentos sociais. E vai continuar assim.

Terra - O tema central que motivou os protestos na capital gaúcha foi o serriço de ônibus. O PT comandou a prefeitura de Porto Alegre por 16 anos, seis deles sob a gestão do senhor, sem que fosse feita a licitação do transporte público. Até hoje as empresas atuam no setor sem contrato com a prefeitura. Por que o senhor prorrogou a permissão a essas empresas e não fez a licitação do sistema naquela época? E como vê o processo de licitação proposto pela atual administração e que está para sair?

Tarso - Tomara que dê certo. Tomara que eu esteja enganado. Porque eu acho que essas licitações do transporte público, com esta legislação que está aí, não dão certo. Ordinariamente, quem ganha essas licitações, quando elas ocorrem, são empresas que apresentam preço mais barato, e depois não renovam a frota. Botam a tarifa em preços irreais para ganhar, e depois não conseguem cumprir os contratos.

Eu acho que deveria ocorrer aqui no País uma modificação completa na legislação relacionada com licitações do transporte coletivo. Não pode ser neste modelo que está aí. Repito: tomara que dê certo. Eu não acredito que dê certo. O transporte coletivo deveria ser totalmente subsidiado no País. Eu acho que o estatuto jurídico das empresas deveria ser outro, e eu acho que o poder regulatório do Estado deveria ser muito maior.

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