O fotógrafo Luís Carlos Marigo, que morreu ontem sem atendimento médico na porta o Instituto Nacional de Cardiologia, em Laranjeiras, foi meu parceiro profissional há 32 anos, numa matéria para a Revista de Geografía Universal, editada no México, de maio de 1982, da qual guardo aqui um exemplar.
Era sobre Ouro Preto, feita antes que ele se dedicasse exclusivamente a ser fotógrafo de natureza, acertada no apartamento em que morava, no bairro de Vila Isabel, onde era meu vizinho.
Depois, Marigo ajudou a tornar melhores meus filhos e muitos filhos, de muita gente, com a fotos de animais que vinham em cartões de um chocolate.
Não vou aqui cometer a irresponsabilidade de dizer que ele teria sobrevivido se os médicos do hospital o atendessem. Pode ser que sim, pode ser que não.
Também conheço aquele hospital público, ao qual sou grato pelo atendimento que deu a uma pessoa muito querida, com sérios problemas cardíacos. Não lhe faltam ótimas instalações – ele recebeu uma grande reforma no Governo Lula – e também não lhe faltam profissionais de primeiríssima qualidade técnica.
Não é incorreto que aquele hospital, de especialidade, não tenha atendimento de emergência regular.
Mas o que está acontecendo com a humanidade dos profissionais de saúde brasileira? Aliás, com os profissionais, de qualquer especialidade, neste país?
Não importa se o hospital estava em greve ou se não faz atendimentos de emergência como uma de suas rotinas.
O motorista de ônibus que parou o coletivo para buscar socorro para um passageiro mostrou mais sensibilidade e noção de valor da vida humana.
Ele não tinha qualquer obrigação profissional de assistir seu passageiro, mas o fez.
Em quase uma hora de agonia diante do hospital, sem que não o viessem atender senão o motorista de uma ambulância e os paramédicos dos Bombeiros, Marigo despediu-se de um mundo onde o "tô nem aí" tomou conta de muita gente.
Que enche a boca para falar de falta de qualificação dos médicos estrangeiros que se dispõem a atender pessoas no fim do mundo.
Mas que não atravessa a portaria e a calçada para ver o que está acontecendo com outro ser humano.
Ninguém quer que, no século 21, se faça uma medicina romântica apenas, sem condições de espaço e equipamentos, mas espaços e equipamentos havia lá.
O que não houve, com o perdão dos doutores, foi consciência de seu papel decisivo e essencial para a vida humana.
Fernando Brito
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