por Percival Maricato
Não existem juízes, em qualquer tribunal, que não sejam influenciados por suas convicções pessoais e ideológicas em questões de maior relevância social. Pode-se dizer que alguns são mais legalistas, formalistas, técnicos, preocupados em atender as finalidades das leis, outros são mais políticos, ideológicos. Mas neutralidade mesmo, só aparece em questões eminentemente técnicas, de menor importância (exemplo: um carro bate atrás do outro que parou no farol: o que bateu, exceto em situações excepcionais, é o culpado e deve indenizar).
Em certas matérias, condenações de políticos de determinado partido ideológico ou decisão sobre célula tronco, por exemplo, percebe-se como o tecnicismo tende a perder para a ideologia, religião ou formação pessoal.
A neutralidade é um mito que as facções ideológicas exigem apenas quando interessa. Veja-se o caso da Suprema Corte americana, onde a partir de 1981, Reagan e sucessores, preencheram as vagas que iam surgindo com juízes sectariamente conservadores. E estes corresponderam, dando as respostas que deles se esperava. Desde então a sociedade americana vai numa direção e a Suprema Corte na outra, age como uma âncora, dificultando mudanças.
No Brasil Collor e FHC nomearam juízes indisfarçavelmente conservadores para o STF, com tranquilidade. Collor indicou até mesmo um parente. Posteriormente, a mídia e os setores sociais que se identificam com esses juízes bradaram protestos ante a ameaça de indicação de outros mais progressistas por Lula e Dilma. Mas por que motivo, mudando a orientação política do governo federal, mudança essa ditada pela maioria da população, não pode referido governo indicar juízes mais progressistas? Ainda mais obedecendo as regras do jogo, submetida a indicação a aprovação do Senado? Para evitar a grita, perceba-se que Lula e Dilma indicaram apenas nomes acima de qualquer suspeita, exceto Toffoli, que apesar de preparado, trabalhou no governo petista.
A saída de Joaquim Barbosa do STF, nomeado paradoxalmente por Lula, é oportunidade de dar mais uma arejada na Corte. Temos um time conservador em Gilmar Mendes, Celso de Mello, Fux e Marco Aurélio, juízes mais progressistas como Lewandowski e Toffoli e outros mais para o centro, técnicos, formalistas, como Barroso, Zavaski, Carmem Lúcia e Rosa Weber.
Já se viu como o STF é importante para o país, na medida em que não apenas decide sobre temas relevantes, muitos que caberia ao legislativo se pronunciar, mas também é fundamental para a reforma do judiciário, sem o qual o país tem mais dificuldades de avançar. Dos três poderes, é um dos que vive seu pior momento, marcado pelo corporativismo, lerdeza, corrupção e etc.
Barbosa era um ponto fora da curva. Além de conservador, era arbitrário, deselegante, qualidades negativas que se tornaram positivas para comentarias de direita. Ou seja, ele estava certo em romper e mandar as favas os "rapapés e falsos refinamentos" com que se tratam os demais magistrados, procuradores e advogados. Estupidez vira franqueza e virtude, a ideologia explica. Muito provavelmente até Gilmar Mendes prefere vê-lo distante.
Além de progressista, o que se espera é que o novo ministro seja um "jurista de renome e ilibada reputação, como ocorreu nos casos de Zavaski e Barroso. Ou seja, que tenha ambas as qualidades: competência e mente arejada. O país precisa continuar sua trajetória, não precisa de âncoras que o prenda ao passado.
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