Chegou o fundo do poço?

por José Paulo Kupfer
Evitar exageros nas análises e avaliações é uma regra de ouro, em especial nas questões econômicas. Não é difícil entender por quê. Se, a rigor, até o passado pode ser incerto, o que dizer do futuro, matéria altamente porosa de que, preferencialmente, trata a economia. 

Apesar dos riscos, no entanto, a tentação dos exageros costuma ser maior do que a recomendável moderação. São cotidianos os exemplos da predominância dos chamados overshootings na avaliação de fenômenos econômicos. Sem tradução direta no vernáculo, a expressão em inglês, de uso corrente em mercados de ativos, mas também válida em diversas outras circunstâncias, denota excessos, para cima ou para baixo, em relação ao que se poderia determinar apenas com base nas condições concretas de cada situação.  O problema dos overshootings é que eles, mesmo vazios de verdadeiro conteúdo, afetam a realidade. 

Seu potencial para sombrear ainda mais ambientes nublados não é pequeno. Em compensação, costumam se dissolver relativamente rápido e, ainda que distribuam prejuízos, quase sempre estes se limitam aos muito crentes ou aos muito desinformados. 

 Os excessos encontraram terreno fértil para encorpar, no início atrapalhado do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. 

Notícias negativas na economia, demonstrações de desorientação política da presidente e indignação popular crescente com as revelações de escândalos de corrupção produziram a sensação de um prenúncio de fim do mundo. Mas, agora, já é possível encontrar, aqui e ali, sinais de que os exageros do primeiro trimestre, nas previsões econômicas para o futuro, começam a ceder. 

Mais do que palavras, no mundo financeiro, é a curva dos juros que emite as mensagens mais consistentes. E elas começaram a perder força. Mesmo com o previsível aumento do desemprego e a certeza de que a economia se encontra em retração, com a inflação bem acima do teto da meta, na casa dos 8%, analistas passaram a desenhar um quadro menos escuro para o futuro. Embora muitos não acreditem que o ministro Joaquim Levy consiga cumprir a meta de superávit fiscal primário de 1,2% do PIB, em 2015, é visível a redução na desconfiança de que o governo não daria prioridade efetiva ao ajuste econômico. 





Em meio a resultados e projeções ainda bastante preocupantes, alguns fatos começam a furar o bloco monolítico das más notícias. Embora a inflação de março tenha sido recorde, é provável que daqui em diante os índices mensais arrefeçam. O lado externo da economia, inclusive com a entrada das exportações de soja, também mostra os primeiros indicativos de descompressão. 

Ao mesmo tempo em que as agências de classificação de riscos vão, uma a uma, renovando, apesar de ressalvas, o grau de investimento da nota de crédito brasileira, a cotação do dólar se acalma e o mercado de ações, puxado por altas nos papéis da atribulada Petrobras, vive um momento de recuperação. Pode-se argumentar que estes são sinais instáveis, conjunturais demais para sustentar a ideia de uma virada. Ainda não é mesmo de virada que se está falando. 

A propósito de exageros, seria exagerado acreditar que o ciclo negativo tenha chegado ao fim da linha. Mas olha a aposta da Shell, que acaba de destinar US$ 70 bilhões para a compra da BG (ex-British Gas), de olho no pré-sal brasileiro, considerado pela companhia como “talvez a área do mundo mais excitante para a indústria [do petróleo] atualmente”. Talvez não seja exagero começar a considerar que o fundo do poço está aí.

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