Fernando Brito e os 50 reais de imposto de um grande afortunado

Muita gente tomou conhecimento da devolução do dinheiro roubado do advogado Eduardo Goldenberg no reveillon carioca e devolvido dias depois, num envelope em que tinha também um bilhete.

Fábio, o autor do roubo e do recado,diz que está arrependido, que não dormiu aquela noite e pede perdão ao "DR. Eduardo", como viu escrito, junto com o endereço do escritório, nos cartões que dormiam na carteira..

Acho, pelo que sei dos cariocas e do Edu, que não precisava pedir. Duvido que, carioquíssimo, quem não se perdoava tanto era ele, Eduardo, e a mais de um deve ter dito:

– Pô, aí, dei mole…

Mas aí volta o dinheiro, com a confissão arrependida e outra, sem arrependimento.

Havia tirado R$ 50 para comprar um champanhe de ano novo para a mãe.

Tirou, nada, Fábio. Eduardo te deu, por linhas tortas.

Porque você, Fábio, certamente não leu e nunca lerá as primeiras páginas de Os Miseráveis, de Hugo, onde o Bispo de Digne, depois de acolher um andarilho, ex-presidário, é roubado por ele em seus talheres de prata. Na fuga, preso por policiais, diz que os ganhou. E, confrontado com D. Myriel, este não só confirma como ainda insiste que leve dois castiçais.

D. Miriel comprou com aquela parca prata uma vida de honradez para Jean Valjean, para muitos o grande herói do livro. Eu não acho, mas isso é outra história.

O Edu, mais modesto – e que só é bispo no altar dos botequins  que ama com fé – há de se contentar com o sorriso de sua mãe, o seu abraço, o oásis de uma noite que seja no ano de vida bruta que vocês tiveram.

Tão modesto é que sabe que você, Fábio, é o grande personagem desta história, não ele.

Eu, Eduardo ou qualquer um poderia ter sido tungado.

Mas poucos poderiam ter dado a ele e a todos este gole a mais de confiança na qualidade do ser humano, que são poucos, mas não tão raros.

Eu também já tive, há 30 anos, um Fábio, verdade que menos espontâneo. Magno, dono da "boca" do conjunto do BNH do Lins de Vasconcelos. mandou um guri magrelo , com um carrinho de mão, devolver televisão, som e mais algumas quinquilharias, tudo junto com um pedido de desculpas, levados da casa da minha mãe. Afinal, onde é que já se viu roubar a professora?

Há outros ladrões, que não tiram 50 reais para a champanhe, mas amarram Fábios aos postes e os surram até quase (e nem sempre quase)  matar. O que roubam? A nossa capacidade de nos proclamarmos uma sociedade civilizada.

Há outros piores, que nem sujam as mãos, mas ganham um bom dinheiro e tomam muita champagne gritando "mata, esfola" na mídia,  devida e polpudamente pagos e patrocinados.

O Eduardo, que há 15 anos fez das suas  – ou das nossas -, entrando ao vivo num festival de música da Globo com um boné do Brizola, está, a esta altura, achando que pagou barato por essa taça de humanidade com que, ao longe, brindou com Fábio e  a mãe a entrada de 2016.

A essa altura ele está, talvez,  pensando que saiu a título de "imposto" de fraternidade, que não lhe tirou quase nada e devolveu  muito aos dois.

Uma espécie de "imposto aos grandes afortunados".

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