No Paraguai como no Brasil …
Em 2006, numa visita à Alemanha, fiquei impressionado com a reverência que a revista semanal Spiegel, de centro esquerda, inspira entre os alemães.
Um jornalista de outra revista me contou que esperava ansiosamente chegar o novo exemplar da Spiegel para ler os textos de seu articulista favorito. "Ficava triste quando o artigo terminava", me disse ele.
No aeroporto, ao voltar ao Brasil, quis comprar a Spiegel da semana. O vendedor ficou ofendido com a maneira errada como pronunciei o nome da revista. Só me entregou quando falei direito: "Ishipíguel".
Contei essa história porque vi a reação do seu correspondente no Brasil Jens Glüsing ao golpe. O título da reportagem no site é "Um país perde".
Escreveu Glüsing: "O drama em torno da presidente é um vexame para um país afundado na crise." (…) "O grande e orgulhoso Brasil terá que se resignar a, no futuro, ser citado por historiadores ao lado de Honduras e Paraguai – e não só por causa de apresentações bizarras de seus deputados. Também em Honduras e Paraguai, presidentes eleitos foram afastados de forma questionável do cargo."
O "espetáculo indigno" dos políticos brasileiros "prejudicou de forma duradoura as instituições e a imagem do país", escreveu Glüsing. Ele lembrou que, se maquiagens orçamentárias fossem crime, muitos governadores teriam que ser afastados do cargo, isso para não falar dos antecessores de Dilma, a começar por FHC.
Foi uma das melhores leituras que li na mídia sobre o golpe, se não a melhor.
Não perdeu Dilma, não perdeu o PT, não perdeu a democracia, não perderam apenas os 54 milhões de eleitores cujos votos foram obliterados: o grande derrotado, no impeachment, foi o Brasil.
Sonhávamos nos tornar um país avançado, menos injusto, menos primitivo. Mas acordamos para a dolorida realidade de que somos ainda uma República de Bananas, na qual uma plutocracia primitiva e canalha sempre encontra maneiras de manter seus privilégios e mamatas.
Nosso lugar no mundo, nesta era, não é ao lado de países como a Alemanha da Spiegel, ou a França, ou a Inglaterra, ou a Dinamarca das bicicletas e do igualitarismo. Estamos, como sublinhou Glüsing, alinhados com Honduras e Paraguai.
Nos anos 1980, um economista disse que o Brasil era a "Belíndia", uma pequena e rica Bélgica cerca de uma enorme e miserável Índia. Agora somos "Paraduras", a fusão de Honduras com Paraguai.
É a isto que fomos reduzidos pelo golpe da plutocracia.
Enquanto a plutocracia não for domada e derrotada, assim seguiremos, oscilantes entre a Belíndia de ontem e a Paraduras de hoje – e esmagados em nossas aspirações de sermos, enfim, uma nação civilizada.
“Se a gente reparar bem, o golpe que acaba de ser consolidado contra a democracia brasileira não é nem um
ResponderExcluirpouco estranho à nossa cultura. Pelo contrário, esdrúxula e deslocada mesmo foi
a nossa experiência de democracia ter durado algum tempo, ainda que de modo um
tanto débil e frequentemente corrompida pela força da grana. Afinal, do fim da
ditadura civil-militar em 1985 até os dias atuais já se iam 31 anos. Mas a
partir de hoje, doze de maio de dois mil e dezesseis, um dia após a ruidosa
votação no senado que levou ao afastamento da presidente Dilma, temos a
sensação de que as coisas enfim voltaram ao seu normal. Sim, porque na nossa
cultura, tão tributária de uma certa origem autocrática, truculenta e escravocrata, é normal e muito
frequente a recusa pura e simples de aceitar resultados de votações livres;
recusa essa muitas vezes sustentada por ações e discursos espúrios cujo
objetivo não é outro senão martelar os fatos incessantemente até que eles
caibam direitinho dentro dos nossos argumentos. Quem nunca presenciou algum tipo de virada de
mesa ou pelo menos ouviu falar sobre? É evidente que o instituto da virada de
mesa não é nenhuma jaboticaba, mas também não resta dúvida de que ele encontrou
terreno fértil aqui na ensolarada terra onde tem palmeiras e onde gorjeiam tantas
aves com seus tamanhos variados de bico. Os exemplos são diversos. O político coronel furibundo em algum grotão de um brasil nem tão profundo que não aceita perder as eleições municipais, o desbocado
cartola presidente do time que se recusa a ser rebaixado no campeonato, a diretora de escola pública escandalizada diante da ousadia de alunos rebeldes protestando por melhorias, o empresário preocupado com algum funcionário dado a pendores sindicalistas e até o maridão ferido no seu orgulho de macho
proprietário primeiro e único. Todo mundo vira a mesa, liga o botão do foda-se, ameaça geral e manda às favas o direito dos outros e a democracia. O resultado não foi do meu agrado? As regras dificultam minhas manobras? Eu mudo e faço de novo, agora do meu jeito, com as minhas regras. Se é assim, se sempre foi assim, por que justamente lá no palácio do planalto, na cadeira do(a) presidente da república, tinha que
ser diferente? Sem problemas, o ponto fora da curva acaba de ser apagado. Agora
que permitimos, bovinamente, a maior e mais infame virada de mesa da nossa
história, parece que finalmente as coisas voltaram à sacrossanta e pacífica normalidade
outra vez. Vamos todos ligar a tv e nos orgulhar de novo dessa nossa pátria
ordeira, linda, branquinha e feliz que andava meio barulhenta, esquisita e um
tanto pardacenta nesses últimos treze anos. Já até me sinto mais recatado, do
lar e bonito sim senhor. E vocês, como se sentem?”
O Traíra começou mostrando a que veio. Primeiro acabou com o Ministério da Cultura, em breve institui o Ministério da Tortura. Não demora
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