Golpe: filho feio não tem pai por Romulus

- Marcha dos "arrependidos"

Impressiona como a data de expiração do governo do golpe chegou em menos de 48hs. Toma posse (será "tomar" no sentido de tirar na mão grande?) na quinta-feira à tarde e nos dias que seguem já vemos deserções insinceras dos oportunistas de sempre. Mau sinal para um golpe que depende muito de oportunistas.
Ao longo dos últimos dias já se colecionam diversas manifestações que visam a distanciar seus emissores do enxofre que exala o Planalto e a Esplanada dos Ministérios nas mãos do velho PMDB.
Cristovam Buarque, Romário e até Hélio Bicudo já tentam se distanciar. Aqui suas manifestações (no twitter, facebook e em vídeo, respectivamente):
- Buarque:
"Abrimos uma porta que era necessário abrir, mesmo sem a certeza de onde ela nos deixará ir. Ficou estranho um ministério sem mulheres, sem representantes de minorias e dos movimentos sociais. 55 senadores votaram apenas pela admissibilidade do processo de impeachment, quem escolheu o Temer, duas vezes, foi a Dilma".
- Romário:
"Fiz essa breve introdução para lamentar a decisão do presidente interino Michel Temer de fundir o Ministério da Cultura ao Ministério da Educação. O ato significou um retrocesso".
- Bicudo:
"Com a mesma liberdade, e o mesmo sentimento patriótico que me levaram a pedir o impeachment, devo externar minha preocupação com as mais recentes notícias sobre a formação do novo governo. (...) O povo brasileiro foi às ruas contra a cleptocracia".

- Análises desapaixonadas e apaixonadíssimas
Sinal estranho também veio já na sexta do mercado financeiro. A bolsa caiu e o dólar subiu. No mercado das expectativas parece que a cotação do golpe também já sai machucada.
Analistas estrangeiros colocam em dúvida a capacidade de Temer de dar respostas aos problemas da economia.
E por que Temer se arriscou a esse desgaste já nas suas horas iniciais?
Mais uma vez sou obrigado a notar a inépcia da colunista Eliane Cantanhede (digitei errado e saiu "calunista"... juro! Feud...). Em coluna do dia 8 (aqui), ela – do alto do amplo poder de influência que julga ter (rs) – adverte:
"Temer não ganha nem perde um voto a mais no Congresso com esse toma lá dá cá, mas pode perder muito em expectativa e em boa vontade na opinião pública, que conhece muito pouco esse tal de Michel Temer e torce o nariz para o PMDB velho de guerra, mas está doida para que, com a saída de Dilma, deem um jeito nesse imenso caos nacional".
Não sei onde acaba o wishful thinking e onde começa a inapetência.
Será que a colunista comprou Temer pelo valor de face? O valor do "presidente de consenso do PMDB"?
Ajudaria o seu discernimento se saísse de vez em quando da bolha ideológica e partidária em que vive. Pode sair de vez em quando que a "massa cheirosa" espera a sua volta, Eliane!
Ela conseguiu sintetizar exatamente o oposto da realidade no seu diagnóstico.
Temer está nas mãos do Congresso – especialmente do Senado – nos próximos seis meses, até o fim do impeachment. Se perder apenas 2 votos na Câmara alta acabou a aventura golpista.
A "opinião pública", que certamente indicou Cantanhede como sua porta-voz, pode torcer o nariz à vontade para o "PMDB velho de guerra". Não tem um voto no colégio eleitoral.
Mas Temer tampouco!
É um político sem expressão eleitoral, rejeitado pela virtual totalidade da sociedade (conforme pesquisas de intenção de voto), enrolado com escândalos e processos (está nas mãos do PGR e do TSE, por motivos diferentes) e sem carisma pessoal.
O que sobra é oportunismo, deslealdade e ambição.
Nesse quadro, ele não tem capital político para montar o "ministério de notáveis" proposto por Cantanhede. Nem mesmo por consideração estratégica, senão por convicção. Será ela a única que não o vê?
Aquele gabinete medonho e a sua desastrosa cerimônia de posse são o recibo de debilidade política que passaram Michel Temer e seu governo ilegítimo.
Ah, mas o governo Dilma não estava acuado?
Pois digo que nunca houve um governo tão refém do Congresso e do fisiologismo como o atual.
A falta de confiança de parte a parte é tão grande que não se permitiu sequer uma encenação de "governo de notáveis" por uns 4 a 6 meses – até liquidar a fatura do impeachment.
Ninguém confia em ninguém ali e ninguém faz nada "por amor à causa".
Todos se seguram às respectivas alavancagens que têm sobre os outros para se assegurar que tudo sairá conforme o combinado atrás das cortinas.
Como poderia ser diferente no governo de um traidor que convida outros traidores para sentarem à mesa (Barbalhinho, Kassab, Picciani e Henrique Eduardo Alves, entre tantos outros)?
Em tempo: nada mais ilustrativo do mal estar dos apoiadores do golpe na mídia do que essa entrada ao vivo de Jorge Pontual (vídeo linkado) relatando o duro editorial do New York Times sobre o golpe e gabinete de Temer. A parte em que ele dá de ombros – como que dizendo que nem a imprensa amiga salva – é hilária.