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Xadrez da candidatura Lula-Haddad e os golpes possíveis
Nosso jogo de xadrez das eleições está sob a influência das seguintes variáveis:
- As expectativas em relação ao 2º turno. Quanto mais fraco Geraldo Alckmin, maior a probabilidade de uma nova etapa do golpe, com tentativas de inviabilizar não apenas a chapa Lula/Fernando Haddad como do próprio Bolsonaro.
- Por outro lado, há uma desmoralização cada vez maior das manobras jurídicos-ilegais. Hoje em dia está claro para a parte bem informada da opinião pública os arreglos entre a cúpula do Judiciário, o TRF4 e a PGR (Procuradoria Geral da República).
- O fator Bolsonaro continua sendo a ameaça maior, devido à sua influência na base do Ministério Público Federal e em parte do poder econômico.
- Vamos analisar por partes.
Peça 1 - As expectativas nas próximas eleições.
Todas as indicações até agora apontam para a baixa probabilidade da candidatura Geraldo Alckmin alçar voo.
Vamos a algumas simulações em relação às últimas pesquisas, com recorte regional, comparando com as eleições de 2014.
As eleições presidenciais no Sudeste
Em 2014 o Sudeste deu o maior contingente de votos para Aécio Neves contra Dilma Rousseff. Mantidos os mesmos percentuais de votos de 2014, o eixo Alckmin-Bolsonaro receberia do Sudeste uma vantagem de 5 milhões de votos, 6,6 milhões a mais vindos de São Paulo e compensando com folga 1,1 milhão a menos no Rio de Janeiro e 454 mil a menos de Minas Gerais. No 2º turno, Dilma recebeu do Sudeste o equivalente a 20 milhões de votos.
Só no 1º turno, Lula receberia 19,4 milhões, quase o mesmo que Dilma no 2º. Levando em conta os votos válidos, Lula tem 43% contra 24% de Bolsonaro, 16% de Geraldo Alckmin, 9% de Marina Silva e 9% de Ciro Gomes.
Supondo que todos os votos de Bolsonaro fossem para Alckmin (ou vice-versa) e a direita ainda herdasse 60% dos votos de Ciro Gomes e Marina Silva, ainda assim os dois lados sairiam empatados no Sudeste.
Nas eleições de 2014, o Sudeste deu 5 milhões de votos a mais para Aécio. Na quadra atual, haveria empate técnico.
Os votos no Nordeste
Tomando-se por base as últimas pesquisas, tomando-se por base apenas o 1º turno, Lula sairia do Nordeste com 23,5 milhões de votos contra 4,7 milhões da soma de Alckmin e Bolsonaro.
Supondo-se que 60% dos votos de Ciro e Marina sejam para Bolsonaro- Alckmin, ainda assim a vantagem de Lula-Haddad seria de 24,9 milhões de votos contra 6,8 milhões dos votos somados de ambos.
Em 2014, o Nordeste deu uma vantagem de 17 milhões a Dilma. Na quadra atual, a vantagem poderia chegar a 18 milhões.
Nesse balanço Sudeste + Nordeste, tem-se o seguinte quadro:
- Nas eleições de 2014, Dilma saiu com uma vantagem de 11,8 milhões de votos sobre Aécio.
- Pelas projeções acima, Lula-Haddad sairiam com uma vantagem de 17,8 milhões.
Incluindo o Sul
O jogo passa a se concentrar então no Sul e no Norte-Centro Oeste.
No Sul, há mudança de cenário. Lula-Alckmin acumula 5,8 milhões, contra 4,3 milhões de Bolsonaro, 2 milhões de Álvaro Dias, 1 milhão de Ciro e Marina e meros 860 mil de Alckmin.
Se todos os votos de Marina, Ciro e Álvaro fossem ou para Alckmin ou Bolsonaro, ainda assim haveria um empate técnico. Em 2014, o Sul deu uma vantagem de 3,3 milhões para Aécio Neves.
Juntando as regiões
Supondo que 60% dos votos de Marina e Ciro fossem ou para Alckmin ou Bolsonaro, o quadro nacional ficaria assim: uma vantagem de 17,8 milhões para Lula-Haddad, contra 8,3 milhões para Dilma em relação a Aécio.
A transferência de Lula para Haddad
Vamos a uma simulação realista: metade dos votos de Marina e Ciro para cada lado e Lula transferindo 80% de seus votos para Haddad. Nesse caso, a vantagem de Lula-Haddad seria de 8,1 milhões de votos no 2º turno.
Em outra simulação, supondo que 60% dos votos de Marina e Ciro migrem para a chapa anti-PT. A transferência de votos de Lula para Haddad teria que ser superior a 72% para garantir sua vitória.
Conclusão
Em condições normais de voo, Lula levaria no 1º turno e há uma boa probabilidade de Haddad levar no 2º turno.
Acontece que o golpe tem como foco quase exclusivamente o PT. Gastando a bala de prata no PT, não haveria condições políticas de cassar a candidatura de Bolsonaro. Caso o golpe avance, interditando a chapa completa do PT, há a possibilidade concreta de vitória de Bolsonaro sobre Alckmin no 2º turno.
Peça 2 – o novo tempo do golpe
O golpe chegou a uma encruzilhada. Pode ser que se atravesse o Rubicão, deixando de lado qualquer veleidade de dourar a pílula com pitadas de formalismo. Mas a perda de controle da tropa está produzindo um desgaste crescente na corporação. Principalmente quando fica clara a influência do MBL e de Bolsonaro sobre a primeira instância dos Ministérios Públicos – o federal e os estaduais.
Aqui, as últimas ofensivas de procuradores, intimando professores de universidades, em função do curso sobre o Golpe, ou, como no caso mais grave, o Procurador Marco Aurélio Dutra Aydos, de Santa Catarina, denunciando e pedindo a prisão do reitor da UFSC por não ter impedido manifestações no campus contra a Operação que levou ao suicídio do reitor Cancellier.
Esse deslumbramento irresponsável está ajudando a virar o fio, a expor o monstro que se criou, reforçando as tentativas de controle futuro do MPF e a aprovação da Lei contra Abuso de Poder, qualquer que seja o próximo presidente da República – com exceção obviamente de Bolsonaro. E não há manifestações da PGR e do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) contra atitudes que comprometem profundamente a imagem do MPF como um todo.
Esses esbirros autoritários, mais a manifestação do Comitê de Direitos Humanos da ONU, trazem um novo componente para o jogo, especialmente com o fim da gestão da inacreditável Ministra Carmen Lúcia na presidência do STF.
Próximo presidente, Dias Toffoli tem demonstrado uma iniciativa louvável de perseguir um mínimo de coesão no tribunal. Por outro lado, sua posse trará Carmen Lúcia para a 2ª Turma – que, até agora, tem sido uma voz isolada contra o arbítrio.
Por outro lado, está ficando cada vez mais nítido, para a parte mais influente da opinião pública, o oportunismo e a hipocrisia de personagens que pegaram carona nas operações policiais. É o caso de Luís Roberto Barroso.
Verborrágico em defesa do Estado mínimo, e do empreendedorismo, votou a favor do reajuste de 19% para os Ministros do Supremo, trazendo atrás de si todos os reajustes do Judiciário. Apanhado na contradição, explica que não aprovou: o Supremo não deu aumento, o Supremo não tem competência para dar aumento, e tudo o que o Supremo fez foi prever no orçamento a possibilidade de o Congresso vir a dar o aumento, se ele entender que deve dar". Entenderam?
De novo: “Meu voto foi pensando em que não se deveria impedir uma categoria de reivindicar, mas não foi um voto no sentido de que eu ache que deva dar aumento”. Continuam não entendendo?
Não ficou nisso. Semana passada jogou para a plateia, sustentado que “publicar salários de juízes é questão de transparência”. Ocorre que, valendo-se da visibilidade de Ministro do STF, Barroso vem construindo uma bem-sucedida carreira da palestrante profissional, que deve lhe render bem mais do que o salário de Ministro do STF. E mantém os ganhos como palestrante em sigilo, desobedecendo um preceito de que não pode haver sigilo bancário ou fiscal para funcionário público.
Está em suas mãos julgar a autorização para Lula se candidatar ou não. A reprovação cada vez maior dos círculos jurídicos internacionais às jogadas políticas do golpe, certamente será um fator de constrangimento para Barroso. Menos pelos princípios, mais pela vaidade.
Peça 3 – a resultante final
É impossível qualquer certeza sobre o que ocorrerá nas próximas semanas.
O fato do golpe ter se escancarado traz duas possibilidades antagônicas:
- Inibir futuras jogadas.
- Rasgar a fantasia definitivamente.
A própria ameaça Bolsonaro traz um ingrediente relevante para uma pactuação entre os setores civilizados do país.
Dias desses Steven Levitsky, professor de Harvard e autor do livro “Como as democracias morrem” dizia de sua surpresa ao conversar com grandes empresários brasileiros e sentir, neles, apoio a Bolsonaro. Graças à irresponsabilidade dos grupos de mídia, com seu antipetismo desvairado, o vírus da besta foi inoculado não apenas na classe média, mas nas corporações públicas e em parte do empresariado.
Nunca se chegou tão perto de momentos tão decisivos para a história do país. Nas próximas semanas se saberá se haverá espaço para algum pacto civilizatório ou o país mergulhará nas trevas de vez.
Jornal GGN
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