A crise brasileira será solucionada pela política. Caso seja eleito presidente, Fernando Haddad contará com uma série de fatores que permitirá uma rápida recuperação da economia, sem grandes rupturas. O desafio maior será recompor as alianças com as forças democráticas de vários campos, e selar acordos de governabilidade com o STF (Supremo Tribunal Federal),
Os trunfos são os seguintes:
- Recuperação no preço das commodities, especialmente petróleo e grãos.
- Desvalorização cambial que se seguirá à vitória de Haddad.
- Espaço para redução dos juros, liberando recursos para o mercado de renda variável, especialmente debêntures de infraestrutura.
- Uma carteira de projetos de infraestrutura já licitados e negociados com o BNDES, aguardando apenas que se espante o fantasma da Lava Jato.
Vamos por partes:
Peça 1 - recuperação das commodities
Uma das grandes manipulações da mídia nos últimos anos foi associar os problemas da Petrobras apenas à corrupção e ao congelamento de tarifas do governo Dilma Rousseff. Os problemas maiores foram decorrência da queda brutal dos preços do petróleo, de mais de 100 dólares o barril para um fundo do poço.
Os tais R$ 20 bilhões que a Petrobras abateu do seu balanço referem-se exclusivamente ao ajuste para acompanhar o novo preço dos combustíveis, e não às propinas, como falsamente foi espalhado pela Lava Jato. E nunca esteve à beira da insolvência, como fez crer uma propaganda maciça de fakenews pela mídia.
Com a recuperação das cotações internacionais, os ganhos serão imediatos. Além disso, embora não se vislumbre em Haddad a disposição de denunciar os contratos já fechados para a exploração do pré-sal, é quase certo que interromperá os leilões e irá recuperar os princípios básicos da lei da partilha: voltar os componentes de conteúdo nacional, retomar as encomendas para a indústria naval e interromper os leilões de exploração.
Peça 2 – a política cambial
Sem afrontar os dogmas do sistema de metas inflacionárias, o novo presidente poderá se valer das próprias regras do mercado para flexibilizar a política monetária e cambial.
Especialistas do mercado enxergam as seguintes possibilidades.
Câmbio - Receberá o país com o câmbio desvalorizado e com as contas externas em dia. Aliás, uma das grandes heranças do lulismo foi ter aproveitado a enchente de dólares da economia mundial para zerar o passivo externo e montar uma boa base de reservas cambiais.
Fluxo cambial - A recuperação do preço das commodities injetará uma boa quantidade de divisas na economia. Será importante não permitir uma nova apreciação do real. Isso será possível em duas pontas:
Ponta 1 - a redução do diferencial de juros entre o real e o dólar.
Espera-se uma elevação na taxa de juros americana. Estima-se que poderá chegar a 3% ao ano. A estratégia brasileira consistiria em reduzir ainda mais a Selic, eliminando o diferencial de juros com os EUA.
Será possível mesmo incorporando uma miragem criada pelo mercado: a taxa de juros de equilíbrio, ou seja, a taxa de juros que seja neutra em relação à inflação e à atividade econômica.
Essa miragem foi desenvolvida por Pérsio Arida anos atrás. Estimava, então, que o Brasil jamais conseguiria conviver com taxas reais de juros de um digito apenas. Com o tempo deu um desconto para 10%, Depois, para 8%. Hoje em dia, a taxa real oscila entre 3% e 4% e a inflação continua domada.
O mercado também desenvolveu cálculos sobre o chamado PIB potencial - isto e, o crescimento possível dadas as condições da economia. Hoje em dia, há um hiato de PIB. Ou seja, o país cresce abaixo do PIB potencial. Significa que as taxas de juros deveriam estar abaixo da tal taxa de equilíbrio.
O real está colado nas moedas dos emergentes. Mas é a moeda de maior liquidez. A cada crise, é a primeira moeda a ser vendida. Passada a crise, a primeira a ser comprada.
Mesmo assim, fechando o diferencial entre juros americanos e brasileiros, se ainda assim houvesse um fluxo de dólares, ele poderia ser esterilizado com operações de swap - que tem um custo, mas não impactam a dívida líquida nacional.
Peça 3 – a política monetária
Confirmada a vitória de Fernando Haddad, o mercado tenderia a puxar as taxas de juros longas, da NTNB.
Trata-se de um título da dívida que paga IPCA mais uma taxa de juros negociada a mercado. Com a Selic elevada, as NTN-Bs se tornaram um sorvedouro da poupança privada, especialmente dos fundos de pensão, por oferecer rentabilidade maior do que a taxa atuarial necessária, sem risco algum. O patrimônio total dos fundos chega a R$ 1 trilhão. Sua meta atuarial é de IPCA + 5,5%. As NTNBs longas pagam 6,5% mais IPCA, sem risco nenhum.
Com um diretor de política monetária habilidoso, será possível montar a seguinte estratégia:
- Se o mercado puxa a taxa de juros para cima, há uma queda no valor do título à vista - o chamado PU (Preço Unitário). É simples entender. O preço de vencimento do papel é, digamos, 100. Se ele rende 10% ao ano, e falta um ano para o vencimento, seu PU será de 90,91 (100 / 1,10 = 90,91). Se a taxa sobre para, digamos, 15% ao ano, o valor do PU cairá para 86,96 (100 / 1,15 = 86,96). O BC pode se aproveitar desse movimento para recomprar as NTNBs e substituí-las por LTNs (Letras do Tesouro Nacional), pré-fixadas. O aumento da demanda por LTNs promoverá uma elevação no seu PU – resultando em menor custo para o BC.
- Com esse movimento, e com a redução das taxas de juros, os fundos de pensão terão que buscar papéis mais rentáveis. E aí, abre-se o mercado para papéis privados, os CRAs (Certificados de Recebíveis Agrícolas) e debêntures de infraestrutura.
- O mesmo ocorrerá com os bancos que emitem CDBs e que não terão mais as facilidades dos juros da dívida pública para se remunerar.
Haverá outro ganho indireto. Com as NTNBs, o mercado sempre apostava no caos: quando mais desarrumada a economia, mais elevadas são as taxas das NTNBs. Com os pré-fixados, passarão a ser sócios da estabilidade.
Peça 4 – retomada das obras paradas
Para completar o quadro, há uma imensidão de projetos públicos já licitados, analisados pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), e suspensos devido aos receios com a irracionalidade da Lava Jato e seus filhos.
Esses projetos foram completados no governo Dilma. Para cada um deles exigiu-se a constituições de SPEs (Sociedades de Propósito Específico), com o capital blindado em relação aos acionistas principais – as grandes empreiteiras.
Mas, depois dois abusos do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro, com condução coercitiva de dezenas de técnicos do BNDES, criminalização de qualquer operação, houve o chamado apagão das canetas – nada se aprovava, nenhuma medida era tomada, porque tudo estava exposto à criminalização pelo MPF.
Um pacto entre o governo, o STF, a PGR, destravaria os investimentos que seriam rapidamente colocados em marcha. Vale o exemplo dos EUA. A Odebrecht recebeu uma multa bilionária da SEC (a CVM dos EUA). Imediatamente após a aplicação da multa, a própria SEC entrou em conta com os bancos norte-americanos solicitando que destravassem os financiamentos à Odebrecht, inclusive para que a multa pudesse ser honrada.
Além disso, com a taxa de juros em 6,5%, o governo poderia injetar recursos no BNDES sem impacto na dívida pública. O impacto ocorria devido ao diferencial entre as taxas do BNDES e a Selic de 14%. Com Selic próxima às taxas do BNDES, não há impacto na dívida pública.
Segundo a CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), cada R$ 1 milhão investido no setor gera, em média, 26 empregos.
Só a Linga 6 do Metrô de São Paulo exigirá R$ 15 bilhões de investimento. O PAC Mobilidade, outros R$ 32 bilhões espalhados por várias capitais.
A terceira etapa de concessão de rodovias, outros R$ 13 bilhões, divididos entre a BR 153, BR 101, BR 163, BR 050.
No setor ferroviários, apenas o Ferroanel de São Paulo exigirá outros R$ 3,5 bilhões; a Norte-Sul, mais R$ 4 bilhões. A modernização da CBTU (Companhia Brasileira de Trens Urbanos) outros R$ 6 bilhões. Há R$ 3,5 bilhões de projetos parados dos aeroportos.
Destravando os investimentos, só nessa retomada de obras haverá condições de gerar, por baixo, 2 milhões de empregos.
Sem contar os investimentos externos. Os chineses, por exemplo, estão aguardando os primeiros sinais de estabilidade política para voltar a investir.
Peça 5 – a PEC do gasto
A desastrada PEC do Gasto produziu um pterodátilo nas contas públicas. A alegação final era a necessidade de conter gastos para aumentar os investimentos públicos. Mas incluiu-se o investimento público na lei.
Então, se o PIB crescer, digamos, 2,5% ao ano, os investimentos públicos permanecerão congelados, sem conseguir acompanhar o PIB e, por consequência, sem conseguir melhorar a produtividade da economia.
De alguma maneira terá que ser revista.
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