A tática não-militar sobre a Rússia na cúpula do G7

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BOLETIM INTERNACIONAL
SEXTA-FEIRA, 19 DE MAIO DE 2023

Foto: Brendan Smialowski / POOL / AFP
Presidentes participam de uma reunião durante a Cúpula dos Líderes do G7 em Hiroshima.

A tática não-militar sobre a Rússia na cúpula do G7

O evento pretende ampliar mais sanções econômicas à Rússia, que vem evitando o colapso esperado no início da guerra

A cidade de Hiroshima, no Japão, sedia, neste final de semana, a reunião de cúpula do G7 – o grupo das sete "economias avançadas mais influentes e abertas do mundo": Estados Unidos, Alemanha, França, Reino Unido, Itália, Canadá e Japão.

Criado em 1975, o G7 costuma receber convidados nas suas reuniões, como será o caso do Brasil nesta edição. Será a primeira participação de um presidente brasileiro em 14 anos. No centro das negociações, está a guerra entre Rússia e crânia, além de questões relacionadas ao clima e à insegurança alimentar global.

Na sexta-feira 19, a primeira medida de expressão foi anunciada pelo grupo: um conjunto de sanções econômicas contra a Rússia, definido por um alto funcionário do governo norteamericano, em declaração ao jornal Financial Times, como sendo capaz de tornar "ainda mais difícil para a Rússia alimentar a sua máquina de guerra".

"Nós reafirmamos nosso compromisso de uma frente comum contra a guerra de agressão ilegal, injustificável e não provocada da Rússia contra a Ucrânia", disseram os líderes na sexta-feira.

Do ponto de vista da Europa, a União Europeia afirmou que vai colocar em prática uma proposta de restrição ao comércio de diamantes russos. A Rússia tem como base da sua economia o setor energético, mas as pedras preciosas, segundo dados do governo norteamericano, representaram, em 2021, 4,5 bilhões de dólares nas exportações russas.

O Reino Unido, por sua vez, anunciou que vai proibir a importação de minério russo, o que envolve, além de diamantes, "cobre, alumínio e níquel de origem russa", segundo o comunicado britânico. Para além do bloqueio, o Reino Unido vai congelar os bens de 86 pessoas e organizações ligadas aos setores financeiro, de energia, defesa, metais e transporte da Rússia.

De acordo com informações da Associated Press (AP), os Estados Unidos devem proibir exportações de 70 entidades da Rússia e aplicar 300 sanções a "indivíduos, organizações, embarcações e aeronaves".

A aplicação de sanções econômicas à Rússia vem sendo utilizada pelo Ocidente desde o início do conflito no leste europeu, em fevereiro de 2022. A expectativa inicial, logo depois que a Rússia mobilizou as suas tropas para o território ucraniano, era que as medidas fossem capazes de estrangular a economia russa, gerando fuga de capitais e desinvestimento. Com isso, esperava-se um recuo do Kremlin na ofensiva.

Desde o ano passado, países da UE, o Reino Unido e os Estados Unidos, por exemplo, vêm congelando ativos do Banco Central da Rússia. Outra medida de relevo foi o fato dos principais bancos russos terem sido removidos do sistema Swift - que é a base das transferências financeiras internacionais. O governo do Reino Unido estima que as sanções financeiras das nações ocidentais já tenham sido capazes de cortar 350 bilhões das reservas financeiras da Rússia (mais da metade da reserva total, estimada em pouco mais de 600 bilhões de dólares).

As nações ocidentais se movimentam, desde o início da guerra, no sentido de desmontar o eixo central da economia russa: o setor de energia. Resumidamente, algumas das medidas envolveram a proibição de importação de parte do petróleo russo para os EUA e o Reino Unido. A Alemanha já chegou a interromper a abertura de um importante gasoduto russo. No final do ano passado, o próprio G7 estabeleceu um preço máximo - 60 dólares - para o barril de petróleo bruto da Rússia, visando desvalorizá-lo.

Mais de um ano depois do início das sanções, porém - e embora tenham causado problemas à economia russa -, as medidas não foram capazes de levar ao colapso esperado pelo Ocidente. Tampouco a um recuo no campo de batalha. Segundo a Agência Internacional de Energia (AIE), a Rússia exporta, atualmente, mais de 8 milhões de barris de petróleo por dia – o nível mais alto desde abril de 2020. A arrecadação total de abril ficou em 15 bilhões de dólares.

Segundo dados a agência estatal russa Rosstat, o PIB do país caiu 2,1% em 2022. Um percentual expressivo e até capaz de indicar, na maioria dos países do mundo, uma crise econômica severa. Porém, bem menos alarmante do que previa a Casa Branca, quando, no início das sanções, chegou a divulgar previsões de queda beirando os 15%. Para 2023, o FMI prevê que a economia russa possa crescer 0,7%.

Há muitas e complexas razões que explicam o fato da economia não ter se deteriorado com as sanções impostas. Algumas delas, aliás, difíceis de serem mensuradas com absoluta precisão, uma vez que vários dados são da agências estatais da Rússia, o que costuma ser questionado, em termos de transparência, pelo Ocidente.

Para começar, o patamar da Rússia no mercado de petróleo e gás mundial impede que os países do mundo ignorem os ativos russos, sob risco de prejudicarem as suas próprias sobrevivências. Em fevereiro, o Banco Central russo divulgou um superávit comercial de 227 bilhões de dólares em 2022, impulsionado, justamente, pela exportação de petróleo e recursos energéticos.

A questão é que, diante do cerco da Europa, a Rússia vem buscando novos parceiros no restante do globo. Um deles é a Índia, que estará presente como convidada na reunião do G7. Em fevereiro, a Rússia foi o maior fornecedor de petróleo da Índia pelo oitavo mês consecutivo, com uma cota de quase 38%, segundo dados da Organização de Países Exportadores de Petróleo (Opep).

Nesse cenário, a Europa mantém a sua posição de dependência energética, mas com uma inversão de polos. No último mês antes do início da guerra - janeiro de 2022 -, a Rússia respondia por 31% das importações de petróleo da UE, segundo a Eurostat, o gabinete de estatísticas da UE. Era, àquela altura, o principal fornecedor do bloco, enquanto os EUA respondiam por 13%. Meses depois e com uma guerra estabelecida, a Rússia foi responsável, em dezembro de 2022, por apenas 4% das importações de petróleo do bloco europeu. No mesmo mês, os Estados Unidos responderam por 18% das importações, passando a liderar o mercado.

A inversão de polos é semelhante no caso do gás. No primeiro trimestre de 2023, a Rússia tinha uma participação de 31% nas importações de gás natural da Europa. O percentual caiu para 18% no final de 2022. Já os Estados Unidos passaram a Rússia nessa disputa, tendo uma participação de quase 20% no mercado europeu.

Como a comunidade internacional já projetava no início da guerra, a China exerce um papel crucial no respaldo financeiro à Rússia. Em um ano de guerra - entre fevereiro de 2022 e fevereiro de 2033 -, os gastos chineses com energia russa (petróleo e seus derivados) subiram de 57 para 88 bilhões de dólares, na comparação com os doze meses anteriores, segundo dados da alfândega russa. Um aumento de mais de 50%.

Segundo a AIE, a China e a Índia são diretamente responsáveis pelo aumento da demanda pelo petróleo russo, o que vem atenuando os efeitos dos bloqueios europeus. Em números atuais, segundo a agência, Índia e China absorvem cerca de 80% de todo o petróleo russo exportado. Vale projetar, nesse cenário, o fato da Rússia deter as maiores reservas de petróleo comprovadas do mundo, com cerca de 22 milhões de barris - ou cerca de 10,9% das reservas mundiais -, segundo a US Geological Survey (USGS).

A ver como a nova rodada de sanções dos países do G7 à Rússia afetará a economia comandada pelo Kremlin. Em um mundo globalizado e de interdependência econômica, a Rússia, por ora, vem driblando, com relativo êxito, as medidas


 

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