O bolsonarismo social resiste à nova ordem

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O bolsonarismo social resiste à nova ordem

A "pax" lulista está selada, ao menos entre os poderes da República. A adesão de parte do Centrão ao governo isola deputados e senadores bolsonaristas em uma espécie de cercadinho no Congresso. Como crianças em uma creche, a bancada extremista poderá gritar, espernear e sujar a fralda enquanto os adultos trabalham. Resta-lhes a tribuna das redes sociais, onde a Terra é plana e o Messias, comenta-se, está prestes a retornar.


Nenhuma imagem traduz melhor o momento político do que a presença no plenário da Assembleia-Geral da ONU de Arthur Lira, presidente da Câmara e autoproclamado primeiro-ministro.


Após conceder entrevista na qual anunciava a adesão (em parte) do PP à base governista e cobrava em público a entrega das chaves da Caixa Econômica Federal ao consórcio parlamentar sob sua liderança, Lira conferia, com ar solene, o aplaudido discurso de Lula em Nova York. Contingências da governabilidade. Bem ou mal, no campo político e eleitoral, Bolsonaro é página virada, mais perto de ocupar uma cela na Papuda, ao lado dos golpistas do 8 de Janeiro, do que regressar a um gabinete no Palácio do Planalto ou no Congresso.


A razão venceu? As forças golpistas se desmancharam no ar? O Brasil voltou, como insiste Lula? Em parte. Na sociedade, a guerra cultural prossegue e uma porção representativa dos brasileiros, mesmo órfã de liderança política, recusa-se a abandonar a escuridão. A barbárie multiplica-se, ressoa como uivo desesperado da alcateia e não nos deixa esquecer: a reconstrução do País é uma obra extensa e contínua, sem prazo para acabar. O show de horrores mantém o clima de desconforto, em pequenos e grandes delitos.


O "punhetaço" dos estudantes de Medicina;


O assassinato de Heloísa dos Santos Silva, de apenas 3 anos de idade, por policiais rodoviários, além da posterior ameaça de agentes à família da menina, pressionada a não denunciar o crime;


As cartilhas didáticas do governador Tarcísio de Freitas, com as praias paulistanas e o espírito abolicionista de Dom Pedro II;


A tentativa de deputados de proibir a união estável entre pessoas do mesmo sexo;


Na região do Cerrado, governadores e prefeitos passam a boiada e afrouxam as leis ambientais. Resultado: disparou o desmatamento no bioma;


A chacina em Pernambuco e a violência policial na Bahia;


Os recorrentes crimes de feminicídio.


O palco da brutalidade e da ignorância assenta-se sobre a indecorosa desigualdade, tema central do discurso de Lula na ONU. Segundo o mais recente levantamento, o 1% que ocupa o topo da pirâmide detém 48% da riqueza nacional.


O Brasil é o campeão de disparidades sociais na metade ocidental do planeta.


Mas Lira, o "premier", e seus associados no Congresso resistem à tributação dos ricos e bilionários e tentam empurrar uma reforma administrativa destinada a demolir de vez o Estado brasileiro.


Acharam o tom pessimista demais? Não reconheço os avanços em nove meses de mandato? Pareço aquele personagem de A Palo Seco, de Belchior (Se você vier me perguntar por onde andei/ no tempo em que você sonhava/de olhos abertos lhe direi/ amigo, eu me desesperava)? Longe disso. A cada dia, o País afasta-se mais e mais do precipício. Diante das perspectivas anteriores, é uma grande vitória. Alento e esperança.


A estrada continua, porém, repleta de percalços e perigos. O Brasil da luz ainda não derrotou o Brasil das trevas.

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