A direita no fundo do poço, por Dodô Azevedo

Um filme pegou a todos de supresa e viralizou-se em tempos de pandemia. Só se fala no espanhol "O Poço", de 2019, exclusivo da Netflix, que conta a história de uma prisão vertical, de mais de 200 andares, onde todos os dias é servido um único banquete que terá que ser dividido entre todos os prisioneiros. Só que a mesa é servida, primeiro, aos andares superiores. Depois, aos andares inferiores. Sem pensar nos que estão abaixo, quem está nos andares de cima come tudo, não deixando nada para os debaixo, obrigados, então, a roubar e matar para sobreviver.

Não há mais cristalina explicação sobre o que é o pensamento de direita e que tipo de sociedade emerge de sua hegemonia.

Quando um dos presos sugere que no banquete completo, devorado pelos andares de cima, daria para alimentar bem, em partes iguais, todos na prisão, é imediatamente chamado de comunista. Inclusive por um dos presos, um conservador senhor de idade, deste que pede Estado mínimo e volta dos militares e acha que os imigrantes de terceiro mundo estão lhe tirando o emprego.

Abismado, o preso comunista ouve o preso conservador defender o sistema que os mantém presos, comendo o resto, as sobras das refeições feitas por quem está acima deles. Na vida real, o aposentado defendendo, orgulhoso,  o governo Bolsonaro. No filme, um senhor miserável comendo, orgulhoso, restos fedendo a mijo e fezes dos ricos.

No Rio de Janeiro, o grande foco de coronavírus é na Barra da Tijuca, bairro de classe alta preferido por milicianos e pela família do presidente da república. Outro foco, uma festa no alto do Jardim Botânico, com os nomes das famílias mais famosas do país, colaborou para espalhar o vírus pela cidade. Uma empregada doméstica morreu após contrair o vírus de sua patroa moradora do alto Leblon. E assim as favelas, os andares de baixo, vivem hoje a tensão de, sem a presença do Estado, sofrer com a doença transmitida pelos ricos. O novo coronavírus é, no Brasil, as sobras contaminadas do que ricos consumiram (na Itália ou em Aspen, segundo as ocorrências).

De direita, o bolsonarismo corre para fazer o mercado voltar a funcionar. A colocar a mesa para os que estão nos andares de cima, sem se importar com as consequências de quem está embaixo. Vidas que só importam em ano de eleição.

Bolsonaro é o violinista tocando para os passageiros da primeira classe do Titanic, durante o seu naufrágio. Titanic é um filme de esquerda que, como Avatar, este uma metáfora de defesa dos índios contra ataques de direitas conservadoras, tornou-se um dos filmes mais vistos da História.
 
No filme sensação mais visto deste mês, a prisão chama-se "O Poço". E não se sabe quantos andares há para baixo. Qual é o fundo do poço. A direita, esse poço sem fundo, nos faz a cada dia descobrir novos andares inferiores. Os poderosos não querem compartilhar nada, a não ser vírus.

No final, vemos nosso protagonista comunista encontrar uma criança faminta no último andar de baixo. E resolve sacrificar-se para enviar a criança para o mais alto andar. Crendo que ela será uma mensagem definitiva para quem manda. "Nenhuma mudança é espontânea", crava o filme em sua última frase.

No Brasil, as primeiras crianças famintas por conta da pandemia foram socorridas pela sociedade civil e, majoritariamente, por ONGs de esquerda que a direita persegue. A direita, por definição egoísta, "quem quer mais, quer sempre mais", ajudou, até agora, os seus: o Banco Central vendeu reserva de dólares dólares e fez de tudo para acudir a queda das bolsas. Ontem, com a pressão dos congressistas de esquerda, liberou finalmente alguma ajuda para os trabalhadores informais que foram colocados por eles mesmos na marginalidade.

Talvez esse reboot que o novo coronavírus está impondo à humanidade faça ela entender que os caminhos à direita perpetuam a riqueza dos ricos e a pobreza dos pobres. Talvez entendamos que, por termos sido levados ao fundo do poço, desenvolvemos compaixão por todos.

Todos. Em comum.
Comunistas, talvez?

Nenhuma mudança é espontânea.

Impeachment pode ser pouco para Bolsonaro, por Bernardo Mello Franco - O Globo

Os desvarios de Jair Bolsonaro não cabem mais na esfera da política. Quando o presidente se torna uma ameaça à saúde pública, sabotando o esforço nacional contra a pandemia, seus atos devem ser submetidos aos tribunais.

Nos últimos dias, a Justiça começou a impor freios ao Capitão Corona. O Supremo derrubou duas canetadas odiosas: o corte de 158 mil benefícios do Bolsa Família e a MP que mutilou a Lei de Acesso à Informação.

Para surpresa de ninguém, Bolsonaro tentou usar a crise para garfar miseráveis e reduzir a transparência do governo. As medidas foram invalidadas pelos ministros Marco Aurélio Mello e Alexandre de Moraes. Em tempo: nenhum deles foi indicado por governos do PT.

Depois das derrotas no Supremo, o presidente passou a apanhar na primeira instância. Na sexta, o juiz Márcio Santoro Rocha suspendeu a autorização para igrejas e casas lotéricas retomarem as atividades normais. Horas depois, a juíza Laura Bastos Carvalho mandou tirar do ar a campanha publicitária que incentivava a população a voltar às ruas.

Nos dois casos, o capitão driblou a lei para agradar a clientela. Na MP do Dízimo, ele subverteu o conceito de atividades essenciais para beneficiar mercadores da fé e empresários do ramo de apostas.

Em outra frente, a Secom planejava bombardear os cidadãos com propaganda contra a quarentena. A campanha "O Brasil não pode parar" torraria R$ 4,8 milhões num momento em que falta dinheiro para ampliar a oferta de leitos e equipar os hospitais.

As quatro decisões ainda podem ser revistas, mas apontam um caminho para frear o presidente pela via judicial. Ao torpedear políticas de isolamento que podem salvar milhares de brasileiros, Bolsonaro extrapola os poderes de chefe de Estado. Age como um líder de seita que tenta conduzir o rebanho ao suicídio coletivo.

Quando a epidemia passar, a abertura de um processo de impeachment pode ser pouco para enquadrar o presidente. Se sua cruzada contra a vida prosperar, ele se candidatará a uma denúncia ao Tribunal Penal Internacional, que julga crimes contra a Humanidade.

Cuidado com outro Adélio

Bozo: O erro da ditadura foi torturar e não matar."
minion: Tem que matar agora, fora PT. Mito! Mito!!

Bozo: Vamos metralhar essa petralhada
minion: Fora petralhas. Mito! Mito!

Bozo: Que a Dilma saia hoje. Enfartada ou com câncer
minion: KKK Fora PT. Mito! Mito!

Bozo: Vão morrer alguns do vírus? sim, lamento, mas não podemos prejudicar a economia".
minion: Isso aí Mito!! O Brasil não pode parar! Mito! Mito!

Noblat: Cuidado para não aparecer outro Adelio, Bolsonaro.
minion: Jornalista comunista. Tem que ser preso!!!

Pinçado do Facebook de Serginho dos Santos 

Pandemia de imbecilidade, por Antonio Prata

Em que momento, exatamente, decidimos globalmente que ser legal não era legal? Em que ano, que mês, que dia, ficou decretado que o burro do fundão que bota tachinha na cadeira da professora tinha mais autoridade do que a professora? Que mecanismo esdrúxulo da psicologia social nos fez (e faz) crer que a busca pela paz, pelo respeito, pela tolerância, pela preservação do meio ambiente e contra a desigualdade são frescuras de gente fraca ou um complô comunista para destruir a sociedade?
Pois são estas distorções mentais que a ascensão de Trump, Bolsonaro, Orbán, Erdogan, Salvini e tantos outros ogros coroa, muito mais do que uma onda da direita. Bolsonaro foi eleito repetindo vez após outra que seu ídolo era o torturador Brilhante Ustra. Não Margaret Thatcher. Não Ronald Reagan. Não os economistas Mises ou Hayek.
Ustra. Um açougueiro que levou crianças de cinco anos para verem os pais destruídos após uma sessão de tortura. (O menino não reconheceu a própria mãe, desfigurada). Bolsonaro dedicou o voto do impeachment de Dilma ao torturador e declarou no programa Roda Viva que seu livro de cabeceira era a biografia do carrasco. Admiradores de ditaduras costumam mentir para esconder a selvageria. Bolsonaro, não: parece ter uma fixação justamente pelas sevícias. Fez da ação humana mais abjeta a sua bandeira —e foi eleito.
Como toleramos tamanha excrescência? Admitir que uma pessoa que aplaude torturadores seja nosso presidente porque fará reformas econômicas necessárias é como levar os filhos num pediatra sabidamente pedófilo porque é um médico competente. "Abusou do meu filho? Sim, abusou, é o jeitão dele, mas a febre, ó, baixou que é uma beleza!".
A maior crise que enfrentamos, globalmente, não é a pandemia de coronavírus e nem a recessão mundial que ela provavelmente trará, ambas passarão: é uma crise de valores. Valores estes que os próprios ostrogodos que nos desgovernam fingem defender. O sujeito que repete como um papagaio "Brasil acima de tudo" incentiva manifestações no meio de uma pandemia e mesmo estando em quarentena, sai do palácio e dá a mão para centenas de aduladores. Coloca em risco, assim, a vida de milhares de brasileiros. O mesmo sujeito que repete como um autômato "Deus acima de todos" rasga os evangelhos toda vez que abre a boca ou faz arminha com a mão.
Escrevi na última crônica que a quarentena, turbinada pelas redes sociais e suas fake news, iria mandar o mundo de vez para a cucuia. Depois de dez dias em casa, porém, a sensação tem sido outra. É cedo pra fazer qualquer previsão, as notícias mudam a cada hora e ninguém sabe o que nos aguarda, mas existe uma chance de ouro de que este circuit breaker global faça com que paremos de correr como ratinhos numa roda de egoísmo e imbecilidade e nos dediquemos a alguma reflexão.
Precisamos repensar profundamente a sociedade. Não falo aqui da idade mínima para aposentadoria de tal ou tal categoria ou das alíquotas de imposto de renda desta ou daquela faixa de remuneração. Tais discussões são importantes, é claro, mas antes delas temos que recriar uma linha entre o que é tolerável e o que é intolerável. Antes dos marcos regulatórios, temos que estabelecer os marcos civilizatórios.
Por tudo que nos ameaça, 2020 pode entrar para a história como o pior ano das nossas vidas. O que significa que, depois dele, as coisas devem melhorar. Não se trata de otimismo, mas de instinto de sobrevivência. Se não trocarmos o ódio e a violência pela esperança e pelo amor, já, a humanidade não chega até a esquina. Tá ok?

Rir é o melhor remédios

Há cinco pessoas no avião: Jair Bolsonaro, Boris Johnson, o Papa Francisco, a Angela Merkel e um garoto de 10 anos de idade. O avião vai bater e só há quatro paraquedas.

Bolsonaro diz: "Um é meu. O país precisa de mim e já fui paraquedista". Pega um e salta.

Johnson diz: "O Reino Unido tá uma bagunça, eu sou necessário lá". Pega um e salta.

Angela Merkel diz: "A Alemanha precisa de mim para governa-la". Pega um e salta.

O Papa diz: "Vai lá, garoto. Pega o paraquedas que sobrou. Já vivi minha vida e a tua está só começando".

E o garoto responde: "Não precisa, tem dois paraquedas aqui. O cara que já foi paraquedista saltou com minha mochila de escola".

Fernando Verissimo: como nossas elites são volúveis

Trecho da coluna de  Luis Fernando Verissimo no Globo hoje quinta-feira 26/III - (...) Até pouco tempo era fácil interpretar panelaços, ouvidos sempre em zonas de alto poder aquisitivo ou alta classe média. Não havia dúvida sobre quem estava nas janelas e nas sacadas dos edifícios, batendo em frigideiras, travessas e surdos improvisados, em apoio ao governo que tinha ajudado a eleger com seu barulho. Hoje os panelaços são feitos nos mesmos edifícios, supõe-se que pelas mesmas pessoas, mas acompanhados de gritos de "Fora Bolsonaro!", o que só prova como são volúveis nossas elites, como é difícil fazer sociologia a curto prazo no Brasil e, principalmente, a falta que faz um bom intérprete de panelas para nos orientar.

Nenhuma novidade no fato de um governo perder apoio na prática de governar. Promessas de campanha são como juras de amor, servem para seduzir, não necessariamente para durar. Mas, no caso da desilusão com Bolsonaro & Filhos, a decepção foi maior porque a expectativa dos seus 57 milhões de eleitores — espantosa, conhecendo-se a biografia e a personalidade do candidato — era maior. Digam o que disserem do Bolsonaro & Filhos, eles nunca esconderam o que eram, ou chegaram ao poder disfarçados de outra coisa. O que os 57 milhões elegeram foi isso aí mesmo.

Quanto à mudança dos panelaços de a favor do governo para contra o governo, a causa, entre outras, é o desempenho de Bolsonaro & Filhos na guerra contra a peste que nos assola, como ficou evidente na fala inacreditável da terça-feira. Não sei como estão sendo interpretados os panelaços do Leblon, mas se são sinais de insatisfação também são sinais de conscientização, e nos servem. Portanto, não pergunte por quem soam as panelas do Leblon, elas soam por você.

Bovid - 17, por Bartolomeu Nogueira

Os principais sintomas do Bovid-17 são confusão mental, paranóia, dificuldade em aceitar ideias diferentes das suas e irracionalidade. Os casos mais graves podem apresentar ainda forte desejo por militarismo e discurso hipócrita sobre moralidade religiosa. Estimativas dão conta que 57 milhões de brasileiros já foram afetados. Apesar da doença não ser contagiosa, sua cura é extremamente rara. Para indentificar o enfermo basta criticar o "mito", em poucos segundos o contaminado começará a falar sobre comunismo, socialismo, esquerda, Lula, Dilma e PT. Pessoas com hábito de leitura e bom raciocínio lógico são imunes a peste, quase sempre.

Bartolomeu Nogueira