Crônica de A. Capibaribe Neto

Coisas imutáveis
O mundo gira sem se importar com os passageiros circunstantes. E tudo no mundo muda a cada instante dentro do universo particular que existe em cada um de nós. Chega uma hora em que precisamos olhar para dentro de nós mesmos e procurar dentro do coração para ver aquelas coisas que se mantiveram imutáveis com o passar do tempo. Quando li certa vez, sobre um escritor que apregoava a arte de esquecer parei para pensar se ele não teria confundido os verbos; talvez estivesse usando o verbo esquecer como sinônimo de perdoar. Ser seletivo nas lembranças; boas ou ruins, não faz meu gênero. Lembro e pronto. Se forem lembranças de coisas ruins elas podem servir de lição, de luz de advertência que pisca avisando sobre a iminência do perigo de insistir pelo caminho que acaba em um abismo intransponível, da existência de pedras que machucam ou de areias escaldantes que esfolam os pés do viajor. As lembranças boas são os privilégios ou as merecidas pagas pela colheita das boas semeaduras. Dei-me conta depois que ele se referia à necessidade de esquecer as dores de amores vividos, de saudades sem jeito impostas por decisões sobre as quais não somos consultados. Quando alguém decide ir embora, por mais motivos que justifiquem a partida, quem fica geralmente quer ir junto ou mergulha em tristeza profunda que cola na alma fito pele colada no corpo. Tenho cá as minhas lembranças, as minhas saudades, as cicatrizes que não me largam e as feridas teimosas que não saram mesmo com os remédios modernos cuja bula garante que o tempo cura tudo. Mentira! É só desculpa para mostrar orgulho besta, machismo ou feminismo que só deixa de doer abraçado ao travesseiro que abafa os gritos roucos da dor que dói sem dar trégua ou das lembranças e saudades vingativas, insistentes e fiéis que ficam ali, sentadas, vigiando a nossa alma, incomodando a paz de espírito que se ausentou depois do primeiro minuto da primeira hora, do primeiro dia e se agigantou à proporção que o tempo foi passando e ficando mais difícil fazer o caminho de volta. Existem experiências assumidamente irresponsáveis, inconsequentes e ruins que se pudéssemos as arrancaríamos do nosso corpo mesmo à custa de um braço, um olho, mas por outro lado deixaram o bálsamo de um sorriso ingenuamente infantil, que ameniza o ódio profundo e a ira santa, mas deixa pra lá, faz parte, também são coisas imitáveis. De que adianta sentir ódio de um tolo quando sua melhor qualidade é ser inseguro? O mundo segue girando em torno do Sol e a Lua em volta da Terra. As estrelas, bem, as estrelas estão bem acima de todas as vaidades. Minhas melhores lembranças, as saudades mais profundas estão guardadas debaixo de sete chaves, do lado esquerdo do peito, são imutáveis, e mesmo que percamos a consciência por um erro de percurso, continuarão eternas porque nada no mundo se perde, tudo se transforma pois quando retornarmos ao pó voltaremos as origens de todas as origens...

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